Reprimenda penal

Homem que cultivava 76 pés de maconha é condenado só com advertência

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13 de janeiro de 2018, 8h14

Mesmo que impressione a quantidade de plantas de maconha encontrada em uma casa, o morador deve ser considerado usuário se a polícia não encontra sinais de que vende a produção. Assim entendeu o juiz Edison Tetsuzo Namba, da 31ª Vara Criminal de São Paulo, ao aplicar pena de advertência a um homem flagrado quando mantinha 76 pés de cannabis no quintal.

Namba considerou válida a entrada de policiais militares sem mandado, reconheceu o relato dos agentes envolvidos e inclusive afastou a aplicação do princípio da insignificância. Ainda assim, finalizou a sentença apenas com a reprimenda: “não mais consuma drogas (…), pois elas causam graves malefícios à saúde”.

Caso descumpra a decisão, o réu será repreendido verbalmente pelas autoridades e, se mesmo assim continuar com a prática, deverá pagar multa. Para a pena-base, o juiz afirma ter levado em consideração “a primariedade, bons antecedentes, o resultado e consequências do delito, normais se comparados com casos semelhantes”.

O homem foi flagrado pela PM em abril de 2017, por acaso. Policiais entraram na casa após a denúncia de que um idoso estava sofrendo maus-tratos — o acusado mora com a avó. Eles não constataram nenhum problema, mas, ao deixarem o imóvel, devido a um declive no terreno da casa, viram uma plantação que “parecia ser tomate”. 

Analisando melhor, encontraram maconha seca — ou seja, pronta para consumo — e sementes. O Ministério Público pediu a condenação do réu por tráfico. Já o acusado, representado pelos advogados Fernando Tavares Araújo da Silva e Júlia Romanello Cordeiro de Campos, defendeu a inépcia da inicial e a nulidade das provas e dos depoimentos.

Ele também pediu laudo sobre as plantas, instauração de incidente de dependência, aplicação do princípio da insignificância e sua absolvição por falta de provas. 

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76 pés de maconha eram para consumo próprio, segundo o acusado.
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O juiz rejeitou a maioria dos pedidos. Apesar disso, não viu indícios de que o acusado seja traficante. A cuidadora da avó do réu afirmou em seu depoimento que ele recebe poucas visitas e que nunca viu nenhum sinal de comércio de drogas na casa.

“O réu, de pronto, disse ser usuário, fato confirmado por alguém que lá estava, posto que próximo a ele. Não vislumbraram ato de mercancia”, disse Namba. 

Silêncio incriminador
Apesar da pena leve, o julgador afirmou que o réu, ao se manter calado na delegacia, mesmo sendo seu “direito inviolável”, se portou de uma maneira que “não condiz com a atitude de quem é inocente”. “Se essa fosse a situação do acusado, aproveitaria a primeira oportunidade, no ‘calor dos acontecimentos’, para, pelo menos, dizer que nenhum envolvimento tinha com o crime”, afirmou.

Esse mesmo entendimento já foi usado por outros magistrados. A juíza Renata Heloisa Da Silva Salles, da Comarca de Leme (SP), por exemplo, ao condenar um homem por tráfico de drogas, afirmou que ficar em silêncio ao ser acusado de um crime é similar a assumir a culpa do ato, pois a "reação normal de um inocente" é afirmar sua inocência.

Edison Tetsuzo Namba reconheceu ainda a validade dos depoimentos dos PMs. “Tem-se reiteradamente proclamado que a circunstância de ser policial a testemunha não afeta — positiva ou negativamente — o valor probante de sua palavra. Aprioristicamente, aquela condição funcional nem confere ao testemunho maior força persuasória nem o inquina de suspeição; afere-se o mérito e mede-se-lhe o grau de confiabilidade segundo critérios ordinariamente aplicados”, explicou.

A validade dos depoimentos de policiais como prova gera controvérsias, conforme mostrou reportagem da ConJur. O juiz Carlos Eduardo Oliveira de Alencar, da 31ª Vara Criminal de São Paulo, já desclassificou acusação de tráfico qualificado por entender que a presunção de veracidade da palavra policial não é absoluta.

Clique aqui para ler a decisão.
0031412-03.2017.8.26.0050

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