Direito à mentira

Advogado de possível acusado não pode ser condenado por induzir falso testemunho

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11 de janeiro de 2018, 7h40

O advogado do réu jamais pode ser condenado por induzir seu cliente a prestar falso testemunho, já que isso só pode ser feito por testemunhas, não por acusados. Assim entendeu, por unanimidade, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

A corte absolveu um advogado da acusação de incentivo a falso testemunho, em um processo sobre fraude à licitação na Prefeitura de Brusque (SC). No caso, os donos de uma mecânica de autopeças eram acusados de forjar orçamentos para direcionar as compras de peças pela administração municipal.

O advogado Ianderson Anacleto representou o dono de uma fornecedora de peças citada pelo Ministério Público catarinense na denúncia. Convidado a prestar esclarecimentos, o empresário se apresentou às autoridades e respondeu às perguntas. Mas o MP-SC viu contradições em suas falas e pediu sua condenação por falso testemunho.

O pedido foi concedido em primeiro grau e estendido ao defensor, por supostamente ter influenciado o falso testemunho. No recurso, o advogado afirmou que a pena só poderia ter sido aplicada se ele seu cliente fosse considerado testemunha, o que não ocorreu, pois seu papel na investigação não foi detalhado pela acusação.

O argumento foi aceito pela 2ª Câmara Criminal. O relator do caso, desembargador Getúlio Corrêa, destacou em seu voto que, durante as conversas entre o dono da fornecedora de autopeças e o MP-SC, não foi detalhado qual a situação do homem naquele momento.

Antes de iniciar as perguntas, o promotor afirmou ao empresário que o processo seria usado na esfera penal e que ele poderia ficar em silêncio. Porém, o advertiu de que poderia ser processado se mentisse desde que fosse "só testemunha". No caso de ser investigado, continuou o membro do MP-SC, o citado até poderia "mentir, mas aí fatalmente" seria processado "por outras coisas", detalhou.

A incerteza sobre o que o empresário enfrentava levou à desclassificação do crime. Corrêa ressaltou que as advertências feitas pelo MP-SC permite dizer que o empresário "foi acuado” e que esse contexto, somado ao fato de ter se apresentado às autoridades acompanhado de advogados, o torna, em tese, denunciado.

“Ressalta-se que essa dúbia advertência feita ao depoente, em que ele supostamente teria sido compromissado, não é capaz de afastar a situação fática em que se encontrava, que era a de suspeito. Muito menos de sobrepor-se ao direito constitucional de não produzir prova contra si mesmo”, explicou o desembargador. “Nessa condição […] era-lhe facultado, inclusive, mentir, se assim entendesse ser a melhor estratégia, como expressão do direito de defesa”, complementou.

Documento retido
Outro advogado, Dantes Krieger Filho, que representou os donos da mecânica de autopeças acusados de forjar orçamentos, também foi denunciado neste processo, mas por reter indevidamente um documento. A acusação foi feita depois que ele, após ter recebido uma notificação do MP-SC relativa a outros dois citados na denúncia, não ter devolvido o papel, segundo Ministério Público.

Ele foi inocentado, porque o MP não comprovou ter pedido a devolução do documento. Ao inocentar o advogado, o relator do caso destacou que os responsáveis pela acusação afirmaram apenas que tentaram reaver o documento com os empresários acusados do crime.

A entrega voluntária de correspondência e a ausência de provas quanto à tentativa de reavê-la levam à absolvição do crime, "pois o tipo exige o apossamento indevido do documento", detalhou o desembargador.

Clique aqui para ler a decisão.

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