Opinião

Promessa de benefício e aceitação por servidor configura corrupção passiva

Autor

  • Ricardo Sayeg

    é titular do Conselho Superior da Capes professor livre-docente em Direito Econômico da PUC-SP e diretor e professor titular do doutorado da UNINOVE.

11 de setembro de 2017, 11h40

*Artigo publicado originalmente na Folha de S.Paulo desta segunda-feira (11/9).

Há crime de corrupção passiva quando um agente público (um procurador da República, um promotor de Justiça, um magistrado ou um delegado de polícia, por exemplo) aceita, no exercício de seu cargo, uma oferta de emprego, com elevados ganhos, para prestar serviços de advocacia a um investigado pela jurisdição da instituição a que pertence?

Segundo o artigo 317, do Código Penal, corrupção passiva é "solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem". Pena: "reclusão, de 2 a 12 anos, e multa".

Será que as circunstâncias citadas também configuram improbidade administrativa?

O artigo 11, da lei 8.429/92, dispõe configurar ato de improbidade administrativa aquele que atenta contra os princípios da administração pública, por qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições.

Com efeito, não há dúvida de que os investigados sentem uma enorme atração pelos membros das instituições detentoras da jurisdição sob a qual estão sofrendo a persecução. Debatendo-se na sua defesa, o investigado tenta de tudo. Não raro, busca trazer para seu lado integrantes das equipes que o investigam.

O fato de estabelecer relacionamento pessoal com os agentes pode implicar vantagens concretas na fuga e no resultado punitivo da persecução institucional. A potencialidade de interferência na punição por parte do próprio agente público cooptado é inexorável e real.

A questão é como e de que modo abordar esses agentes públicos. O assediador não pode ser grosseiro, aproximando-se do membro da instituição de uma forma indecorosa e até obscena. Deve ser sutil, colocar as coisas indiretamente, de forma subliminar, travar contato sem pressa e com cuidado, fazendo a abordagem aparentar ser a mais legal e legítima possível.

Exemplo: oferecer uma proposta de emprego ou de colocação profissional de ponta, com altos salários. Talvez um cargo de diretor de uma grande empresa ou uma posição em um dos maiores escritórios de advocacia do mundo.

Essas são maneiras sutis e aparentemente regulares de convencimento. Afinal, ninguém é obrigado a se manter nas instituições do Estado, caso prefira ganhar a vida, com trabalho honesto, na iniciativa privada. Isso caracteriza exercício regular de direito, o que jamais poderia ser considerado ato ilícito.

É desse modo, contudo, que se tenta dissimular os crimes contra a administração. Faz-se um teatro, cria-se uma cena fantasiosa, com a qual se tenta enganar as pessoas a respeito da real natureza do ato praticado.

Sucede que tanto o ilícito criminal de corrupção passiva quanto o de improbidade administrativa ficam caracterizados com a "promessa de vantagem em razão do cargo", mediante a contrapartida de interferir concretamente na investigação —especialmente na punição, o objetivo da persecução.

Pouco importa que a interferência se dê após a exoneração do cargo, pois isso não pode servir de salvo conduto para a impunidade. Não se pode admitir esse tipo de blindagem premeditada e conscientemente dolosa.

Determinante para configurar o ilícito é que a promessa de vantagem e a sua aceitação tenham ocorrido em razão do cargo e no exercício dele. O crime de corrupção passiva e a respectiva improbidade administrativa são delitos formais, consumam-se naquele momento. Basta a conduta delituosa, sendo indiferente o momento posterior do resultado material delitivo.

Havendo promessa de benefícios e aceitação em razão do cargo e no exercício dele, há corrupção passiva e improbidade administrativa por deslealdade à instituição respectiva. Assim sendo, para o criminoso e ímprobo, as penas da lei.

Autores

  • Brave

    é advogado, professor livre-docente de Direito Economico da PUC-SP, presidente da Comissão de Direitos Humanos do IASP e imortal da APD.

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