Entrave para arbitragens

Ex-ministro do STJ critica falta de definição sobre "ordem pública nacional"

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3 de setembro de 2017, 14h02

O Superior Tribunal de Justiça só pode se recusar a homologar sentença arbitral estrangeira se o conflito não puder ser resolvido por essa via no Brasil ou se a decisão ofender a ordem pública nacional, conforme estabelece o artigo 39 da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996). Porém, por sua imprecisão, ordem pública acaba sendo “tudo o que a imaginação do advogado possa demonstrar que seja”, afirmou o ministro aposentado do STJ Massami Uyeda.

U.Dettmar
Massami Uyeda acredita que relatores devem começar a homologar sentenças arbitrais estrangeiras nos próximos anos.
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Por ser um princípio de natureza filosófico-moral, a principal característica da ordem pública é sua indefinição, disse, no evento Tendências atuais da arbitragem nacional e internacional – a perspectiva brasileira, que foi promovido pelos escritórios Wald Advogados, Leite, Tosto e Barros Advogados e Allen & Overy na última semana na capital paulista.

“Antes da Lei do Divórcio (Lei 6.515/1977), entre as causas que comportavam desquite, uma delas era ‘conduta que cause injúria grave’. O que é injuria grave? É tudo o que a imaginação do advogado possa demonstrar. Da mesma forma, o que é o conceito de ‘ordem pública’? É tudo aquilo que um advogado possa demonstrar que seja”, destacou Uyeda, citando que a verificação da ameaça à paz social deve ser feita casuisticamente, e não teoricamente.

Ele mencionou dois julgamentos do STJ que esclareceram o conceito de ordem pública. Em um deles (SEC 9.412), de abril, os ministros concluíram que podem ser negadas as sentenças arbitrais que sejam “absolutamente incompatíveis com o Direito brasileiro”. Como o árbitro que condenou o empresário Rubens Ometto a pagar US$ 100 milhões à companhia de energia Abengoa era sócio de escritório nos EUA que recebeu US$ 6,5 milhões da empresa durante o processo, os magistrados avaliaram que ele não era imparcial para julgar o caso, e não homologaram a decisão.

O outro (SEC 2.410), de 2014, tratava de sentença arbitral proferida no Uruguai que condenou a concessionária de trens do Rio de Janeiro Supervia a atualizar valores que devia à espanhola Construcciones y Auxiliar de Ferrocarriles por variação cambial e correção monetária. Mas os ministros do STJ consideraram que a cumulação de critérios corresponderia a bis in idem e violaria a ordem pública. Portanto, eles só aceitaram a atualização conforme a inflação.

Natureza mista
Massami Uyeda também avaliou que o fato de o processo de homologação de sentença arbitral estrangeira ter natureza voluntária com litigiosidade contida mostra “a dificuldade de o intérprete do Direito plasmar seu conhecimento em conceitos estanques”.

Além disso, o ministro aposentado lembrou que é possível que o relator do caso homologue uma decisão arbitral monocraticamente. Isso ainda não ocorreu porque o STJ ainda está consolidando sua jurisprudência sobre o assunto, mas deve aumentar nos próximos anos, previu.

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