Jurisprudência contrariada

Advogados viram alvo do MP-SP por elaborarem pareceres jurídicos

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30 de março de 2017, 7h30

Por elaborarem pareceres jurídicos, a pedido de uma prefeitura no interior de São Paulo, para embasar licitações para a contratação de escritórios de advocacia pela Câmara legislativa da cidade, três advogados tornaram-se alvo do Ministério Público do estado. Eles foram denunciados por fraude à licitação.

Estão sendo questionados os pareceres dados para dois certames para contratar uma banca que prestasse serviços jurídicos à Câmara Legislativa da cidade de Buritama, em São Paulo. Em ambas, com dois anos de diferença, o vencedor foi o mesmo: um escritório que tem como sócio o filho do secretário-geral da Câmara de Vereadores da cidade. O advogado foi também o vencedor de um concurso público para assistente jurídico da Câmara de Vereadores de Buritama.

No primeiro contrato com o escritório, firmado em 2011, o preço para a prestação de serviços era de R$ 30,6 mil (em 12 vezes), mas o valor foi reajustado em 2012 para R$ 36,2 mil. Já o segundo contrato cobrava R$ 36 mil, também em 12 parcelas.

O secretário-geral e seu filho foram denunciados pelo promotor Felipe Gonçalves Ventura de Paula, bem como os advogados Carlos Alberto Goulart Guerbach, Galber Pereira e Wesley Rosseto, responsáveis pelos pareceres que embasaram as licitações.

Desagravo da OAB
Os três advogados aparecem no documento do MP-SP uma única vez. Segundo o promotor de Justiça, devem ser denunciados porque os pareceres apresentavam erros.

Os advogados foram denunciados pelo crime definido no artigo 90 da Lei 8.666/1993: “Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação”

Segundo a defesa de Galber Pereira e Wesley Rosseto, feita por Jacob Graton, o parecer foi emitido apenas por determinação das minutas do edital e do contrato firmado com o poder público.

A jurisprudência é pacífica no sentido de que advogados não podem ser denunciados apenas por fazerem seu trabalho, ou seja, elaborarem pareceres jurídicos opinativos em processos administrativos. A Ordem dos Advogados do Brasil, inclusive, aceitou pedido de desagravo em favor dos dois.

“A conduta do membro do Ministério Público demonstra uma verdadeira tentativa de intimidar e desmoralizar a atividade da advocacia, merecendo pronto e certeiro repúdio”, critica Jacob Graton.

Precedentes sem fim
São muitos os precedentes sobre a impossibilidade de responsabilizar advogados e procuradores por pareceres considerados errados ou que embasaram licitações posteriormente investigadas por fraude. Um exemplo é a decisão da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que concedeu Habeas Corpus para trancar a ação penal movida contra uma procuradora de Campos dos Goytacazes (RJ).

Ela foi denunciada por causa de um parecer que amparou uma dispensa de licitação para a construção de apartamentos populares. Além disso, o procurador-geral do município teria aprovado o documento. A ministra Laurita Vaz, relatora do caso, destacou que a denúncia ocorreu “apenas pela simples emissão e aprovação de parecer jurídico, sem demonstração da presença de nexo de causalidade entre a conduta a eles imputada e a realização do fato típico”.

Ainda no STJ, dessa vez em ação julgada pela 1ª Turma, ficou definido que a existência de indícios de irregularidades em parecer sobre licitação não pode justificar o recebimento de ação contra o autor do documento. Nesse processo, uma procuradora municipal foi acusada de improbidade administrativa pelo Ministério Público do Espírito Santo.

Para o relator dessa ação, ministro Benedito Gonçalves: “a existência de indícios de irregularidades no procedimento licitatório não pode, por si só, justificar o recebimento da petição inicial contra o parecerista, mesmo nos casos em que houve a emissão de parecer opinativo equivocado”.

Em outro caso, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região absolveu um advogado que havia sido condenado na primeira instância por ter aprovado uma licitação que, posteriormente, se revelou irregular. Para o TRF-5, ele não pode ser responsabilizado por opiniões jurídicas emitidas em parecer.

Ao trancar uma Ação Penal contra um advogado acusado de participar de um conluio para dispensar indevidamente uma licitação, a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Pernambuco explicou que o crime previsto no artigo 89 da Lei 8.666/93 exige dolo dos envolvidos. E destacou que, o parecerista, não pode ser acusado de ter cometido o delito se não sabia do esquema ilegal feito no certame.

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