Opinião

Com propósito arrecadatório, novas taxas da Suframa são inconstitucionais

Autor

  • Luã Nogueira Jung

    é doutor e mestre em Filosofia pela PUC-RS pós-doutorando em Direito Público (Unisinos) professor do PPGD Unedsa-RJ e membro do Dasein — Núcleo de Estudos Hermenêuticos.

24 de março de 2017, 6h29

A Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) é uma Autarquia vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior que administra a Zona Franca de Manaus. Nesse sentido, a ela cumpre o papel de fiscalizar as mercadorias que ingressam na Zona Franca e que gozam dos seus benefícios fiscais. Para o suposto custeio desta atividade, a Suframa exigia o pagamento da Taxa de Serviços Administrativos (TSA).

Esta taxa, todavia, foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE 957.650/AM, sob o argumento principal de que o artigo 1ª da Lei 9.960/00 não definia de forma específica o fato gerador da exação em questão. A decisão, proferida na sistemática de repercussão geral, transitou em julgado no dia 7/2/2017. Atenta-se primeiramente para o fato de que, no referido julgamento, o STF reconheceu expressamente o direito de as empresas reaverem na esfera judicial os valores indevidamente pagos a título de TSA, tendo-se em vista que não houve a modulação dos efeitos da decisão que julgou inconstitucional a referida taxa.

Em que pese a inconstitucionalidade da TSA reconhecida pelo Supremo, a União publicou, no dia 20/12/2016, a Medida Provisória 757, que recria, grosso modo, a taxa considerada inconstitucional, a qual foi cindida em duas novas taxas, denominadas Taxa de Controle de Incentivos Fiscais (TCIF) e Taxa de Serviços (TS), cuja cobrança passará a ser efetuada ainda em março de 2017.

Apesar de algumas mudanças, tais como a delimitação do fato gerador da taxa, bem como em relação ao método de apuração do valor devido por operação fiscalizada, a Medida Provisória e as novas taxas por ela criadas apresentam elementos inconstitucionais que podem e devem ser levados ao Poder Judiciário. Isso porque, entre outros vícios, as taxas instituídas pela Medida Provisória têm propósitos arrecadatórios alheios àqueles previstos pela Constituição Federal no que tange à possibilidade de instituição de taxas pelo Poder Público.

Conforme a exposição de motivos da Medida Provisória, "a estimativa de arrecadação, segundo tais parâmetros, é da ordem de R$ 475 milhões, já compreendidas as hipóteses de isenções e reduções." Veja-se que o valor a ser arrecadado previsto supera em muito as despesas da própria Suframa, uma vez que, segundo o que consta no Portal da Transparência, em 2015, o gasto total da autarquia girou em torno dos R$ 150 milhões [1]. Não obstante, como declarou a própria superintendente da Suframa, Rebeca Garcia, as novas taxas “viabilizam as ações desenvolvidas pela Suframa, inclusive a missão de promover o desenvolvimento sustentável da região” [2].

Como se sabe, a instituição de taxa visa ao ressarcimento pelo exercício do poder de polícia ou pelo efetivo ou potencial uso de serviços públicos específicos e divisíveis. Segundo precedente do STF, nesse sentido, “A taxa, enquanto contraprestação a uma atividade do Poder Público, não pode superar a relação de razoável equivalência que deve existir entre o custo real da atuação estatal referida ao contribuinte e o valor que o Estado pode exigir de cada contribuinte”[3].

Conclui-se, portanto, que os valores que serão exigidos a título de taxa transcendem o conceito constitucional desta espécie tributária, conferindo-lhe finalidade político-econômica alheia a sua correta aplicação. Ressalta-se, não obstante, que esta é apenas uma entre outras ofensas à constituição perpetuadas pela Medida Provisória 757/2016 que poderão ser levadas à apreciação do Poder Judiciário.

[1]http://www.portaldatransparencia.gov.br/PortalComprasDiretasOEUnidadeGestora.asp?Ano=2015&CodigoOS=28000&CodigoOrgao=28233

[2] http://www.portalflagrante.com.br/site/noticia/suframa-esclarece-duvidas-sobre-a-cobranca-das-novas-taxas-tcif-e-ts/

[3] (ADI 2551 MC-QO, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 02/04/2003, DJ 20-04-2006 PP-00005 EMENT VOL-02229-01 PP-00025)

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