"Obra ilícita"

Editora é proibida de vender autobiografia com pseudônimo de Eduardo Cunha

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24 de março de 2017, 19h52

A Justiça do Rio de Janeiro citou a proibição constitucional ao anonimato e até a tese de propaganda enganosa ao impedir a Editora Record de distribuir e vender exemplares do livro Diário da Cadeia – Com Trechos da Obra Inédita Impeachment, no qual o autor assina com o pseudônimo do ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A obra, que seria lançada na próxima segunda-feira (27/3), não pode chegar às livrarias, sob pena de multa diária de R$ 400 mil em caso de descumprimento.

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Capa de livro da Editora Record, que seria lançado na segunda (27/3).
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O processo foi movido pelo próprio ex-parlamentar contra a editora, o editor-executivo Carlos Andreazza e o “escritor desconhecido”. Segundo Cunha, a “nefasta estratégia comercial dos réus” busca divulgar “as mais variadas suposições e opiniões sobre a política nacional” e viola “projetos, pensamentos e ideias” que ele pensa em publicar no futuro sobre o impeachment.

A juíza Ledir Dias de Araújo, da 13ª Vara Cível do Rio de Janeiro, negou que a liminar seja censura à obra. Segundo ela, o objetivo é “tutelar os direitos individuais do autor, os quais, em tese, estão sendo violados”, pois usar o nome de Eduardo Cunha como se fosse pseudônimo do escritor seria uma tentativa de anonimato, violando a Constituição Federal.

Embora o Código Civil permita o pseudônimo, a juíza afirma que o artigo 19 só vale para atividades lícitas: como “a obra foi escrita como se tivesse sido pela pessoa do autor da ação, o que ele nega […], não se pode ter a presente obra como lícita”, diz a decisão. Ledir Dias entendeu ainda que, mesmo se não houvesse abuso na conduta, os réus vão contra o Código Defesa do Consumidor, que veda a publicidade enganosa.

A juíza diz que há perigo de dano a Cunha, enquanto a proibição de venda do livro não geraria efeitos “irreversíveis, uma vez que, na hipótese de improcedência do pedido [no mérito], poderá a parte ré buscar o seu suposto prejuízo”. Ainda cabe recurso.

Em nome de Cunha, atuaram os advogados Ticiano Figueiredo, Pedro Ivo Velloso, Alberto Malta e Rodrigo Santos Valle.

O anúncio do livro já deixou de aparecer no site da editora. Dias atrás, a página divulgava a sinopse da obra com os seguintes dizeres: “Ficção ou realidade? Um livro ousado e enigmático com trechos da obra inédita Impeachment”.

Obra secreta
O caso mais famoso de livro proibido acaba de completar dez anos: em 2007, um juiz também do Rio de Janeiro mandou recolher os mais de 10 mil exemplares de Roberto Carlos em Detalhes, escrito pelo jornalista Paulo Cesar de Araújo, porque o cantor alegou invasão de privacidade. A decisão, mantida pelo Tribunal de Justiça, acendeu o debate sobre a necessidade ou não de autorização prévia do biografado.

Embora o Supremo Tribunal Federal tenha declarado inconstitucional censurar obras pela falta de permissão das pessoas citadas, pois no Brasil é livre o direito à informação e a liberdade de expressão, o livro sobre Roberto Carlos nunca voltou às livrarias porque a Editora Planeta e o autor fecharam acordo se comprometendo a não mais publicar a biografia Roberto Carlos em Detalhes.

No ano passado, ainda no Rio, foi proibida a venda do livro Minha Luta (Mein Kampf, em alemão), escrito por Adolf Hitler, em 1925. Para o juiz Alberto Salomão Junior, a obra incita práticas de intolerância contra grupos sociais, étnicos e religiosos.

Clique aqui para ler a decisão.
0063612-11.2017.8.19.0001

*Texto atualizado às 20h05 do dia 24/3/2017 para acréscimo de informações.

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