Interferência judicial

Folha de S.Paulo publica condenação por dano moral a banca de advocacia

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4 de março de 2017, 13h16

Entre as principais chamadas deste sábado (4/3) na Primeira Página do jornal Folha de S.Paulo, uma destoa do que os leitores geralmente encontram.  O veículo destaca já na capa que está cumprindo uma ordem judicial e, internamente, em sua principal página do noticiário político, publica trecho de acórdão que o condenou a indenizar um escritório de advocacia em R$ 60 mil por notícia veiculada no distante ano de 2000.

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Edição deste sábado (4/3) da Folha de S.Paulo destaca condenação no TJ-DF, mantida pelo STJ.
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Quase 17 anos depois, após perder recursos no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal, a Folha estampou a condenação no mesmo espaço dedicado à reportagem que foi às bancas em julho de 2000: destaque na capa e no alto da página A4.

O jornal publicou na época que a banca Caldas Pereira Advogados & Consultores Associados – que pertence a dois irmãos e uma sobrinha do ex-secretário-geral da Presidência Eduardo Jorge Caldas Pereira –, pediu R$ 5,045 milhões à Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) para tentar beneficiá-la na Receita Federal com mudanças na tributação sobre aplicações financeiras.

Para os autores da ação, ficou subentendido que seria uma tentativa de lobby, que é ilegal, reforçado pela influência de Eduardo Jorge junto ao governo – naquele momento ele era o segundo homem mais influente no Palácio do Planalto comandado por Fernando Henrique Cardoso. A reportagem conta que a tentativa de mudanças tributárias falhou e o contrato entre escritório e organização foi encerrado, tendo sido pagos R$ 645 mil pela tentativa. 

Direito de informar
Em primeira instância, o jornal saiu vitorioso. Para o juiz Germano Crisóstomo Frazão, da  19ª Vara Cível de Brasília, não havia nada no texto que fugisse do exercício do direito de informar.  

“Efetivamente, a reportagem não reproduz nada além do que fora ajustado entre os contratantes, bem como seu desenlace, e sequer chega a insinuar que tenham os autores sido contemplados pelo feixe de influência do Sr. Eduardo Jorge Caldas Pereira, então Secretário-Geral da Presidência da República, não constituindo a indigitada menção a esta pessoa pública, ato capaz de gerar as ilações construídas pelos demandantes, caso contrário, retornaríamos ao estado de exceção”, escreveu Frazão em 2008.

Fatos distorcidos
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal, porém, reformou a decisão, concluindo que o jornal “extrapolou o direito de informar”. Por unanimidade, a 2ª Turma Cível avaliou que a reportagem “distorcera os fatos, transmudando contrato de prestação de serviços advocatícios na prática de lobby e insinuando que a contratação teria derivado do vínculo de parentesco existente entre o contratado e ministro de Estado”.

“O advogado que patrocina os interesses do seu constituinte obviamente que o faz na defesa dos interesses e direitos do patrocinado, e não para beneficiá-lo na conotação que fora utilizada na matéria”, escreveu o desembargador Teófilio Caetano, relator do caso, em 2010.

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Detalhe da capa da edição de 18 de julho de 2000, que motivou condenação à Folha de S.Paulo.
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Ele entendeu que os profissionais do Direito “foram maculados em sua honorabilidade, conceito e reputação profissionais”, principalmente porque foram citados em um dos maiores jornais do país em credibilidade e alcance.

Ao recorrer ao STJ, a Folha apostou em argumentos processuais, afirmando que o Código de Processo Civil teria sido desrespeitado no curso da ação. Alegou que exigir publicação de sentença na capa é uma medida prevista na Lei de Imprensa, que não foi recepcionada pela Constituição Federal.

A defesa disse também que, no caso de pessoas jurídicas, como o escritório, o dano moral só pode ser reconhecido com medidas práticas, como a comprovação de que a clientela diminuiu. Quanto ao mérito, afirmou que exerceu o direito de informar.

O ministro Marco Aurélio Bellizze, da 3ª Turma do STJ, rejeitou os argumentos e não entrou no mérito, pois isso demandaria reavaliar provas apresentadas ao TJ-DF, o que é vedado à corte. “Não há falar em negativa de prestação jurisdicional, pois o tribunal de origem decidiu a matéria controvertida de forma fundamentada, ainda que contrariamente aos interesses da parte”, disse o relator, em voto seguido por unanimidade no ano passado.

O caso chegou ainda ao Supremo, mas a 1ª Turma entendeu, também em 2016, que Recurso Extraordinário não é meio próprio ao revolvimento da prova. Assinou o acórdão o ministro Marco Aurélio.

Clique aqui para ler a reportagem que originou a ação. 
Clique aqui para ler a sentença que absolveu a Folha.
Clique aqui para ler o acórdão do TJ-DF.
Clique aqui para ler o acórdão do STJ.
Clique aqui para ler o acórdão do STF.

* Texto atualizado às 14h55 do dia 4/3/2017 para acréscimo de informações.

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