Princípio da confiança

Ex-presidente do Hopi Hari deixa de ser réu por morte de garota em brinquedo

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19 de maio de 2017, 16h31

A mera condição de sócio ou de dirigente de uma empresa é insuficiente para reconhecer responsabilidade penal de seu administrador por crime culposo, pois cabe ao Ministério Público apresentar fatos concretos de participação. Assim entendeu o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, ao arquivar ação penal contra o executivo que comandava o Hopi Hari em fevereiro de 2012, quando uma adolescente morreu no parque.

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Gabriela Nichimura, de 14 anos, caiu do brinquedo La Tour Eiffel em 2012.
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Gabriela Nichimura, de 14 anos, caiu do brinquedo La Tour Eiffel. A trava da cadeira em que ela estava abriu, e a estudante despencou de uma altura de 25 metros. Onze pessoas foram denunciadas pelo MP-SP, desde funcionários até o então presidente do parque, Armando Pereira Filho. De todos os réus, três foram condenados em janeiro a dois anos de prisão, pena substituída por restritiva de direitos.

O ex-presidente já havia conseguido trancar a ação penal no Tribunal de Justiça de São Paulo, mas o Superior Tribunal de Justiça determinou o prosseguimento do caso.

O advogado Alberto Toron, defensor de Pereira Filho, afirmou que o cliente não poderia responder pela conduta irregular de empregados que deixaram a jovem ficar num banco inoperante, pois o ex-presidente não teria condições de fiscalizar a centena de funcionários do parque em cada operação. Entendimento contrário, segundo ele, seria reconhecer o dever de onisciência e onipresença e ainda abrir espaço para “regresso ao infinito” na responsabilização penal.

Celso de Mello afirmou que, de acordo com a sentença proferida em janeiro pelo juízo de primeiro grau, provas demonstram que o assento da Torre Eiffel estava inoperante havia vários anos. O problema é que, na data do acidente, um técnico deixou de acionar a trava da cadeira. Assim, esse funcionário, o operador do brinquedo e o supervisor de operação foram considerados responsáveis pela morte de Gabriela.

Para o ministro, portanto, “o princípio da confiança, tratando-se de atividade em que haja divisão de encargos ou de atribuições, atua como fator de limitação do dever concreto de cuidado nos crimes culposos”. O presidente, segundo o relator, tinha a justa expectativa de que os empregados cumpririam regras técnicas e normas de cautela.

Ele disse ainda que “não se revela constitucionalmente possível impor condenação criminal por exclusão, mera suspeita ou simples presunção”. Nem sequer seria possível, de acordo com o decano da corte, invocar a chamada teoria do domínio do fato sem efetiva demonstração da autoria e do nexo causal.

“Acusação imperfeita”
A denúncia dizia que Pereira Filho “poderia ter evitado o resultado morte se ordenasse a eficaz interdição da cadeira”, pois “sabia das trágicas consequências se um visitante viajasse no citado assento”.

Fellipe Sampaio /SCO/STF
Tese do domínio do fato só vale quando há relação comprovada entre chefia e delito, de acordo com Celso de Mello.

Celso de Mello afirmou que “o Ministério Público, ao formular acusação imperfeita, não só deixou de cumprir a obrigação processual de promover descrição precisa do comportamento do paciente, como se absteve de indicar fatos concretos que o vinculassem ao resultado narrado na denúncia”. 

Em 2013, a família da adolescente firmou acordo com o Hopi Hari no processo de indenização que buscava reparação por causa do acidente. O valor da indenização não foi divulgado, uma vez que foi decretado segredo de Justiça e um Termo de Confidencialidade, a pedido da família e do parque. À época do acidente, os pais pediram R$ 5 milhões. 

Portas fechadas
O Hopi Hari entrou em recuperação judicial em outubro, após a Justiça de São Paulo aceitar o pedido da empresa. O parque aguardava a medida desde agosto, com o objetivo de evitar a falência do empreendimento e tentar conseguir investidores para pagar uma dívida de R$ 330 milhões com credores. 

Na semana passada, porém, o empreendimento anunciou uma “pausa” nas atividades alegando ter sido vítima de “ataques na mídia” que “requentaram informações antigas” para afastar investidores.

Clique aqui para ler a decisão.
HC 138.637

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