Sermão eleitoral

Trump assina decreto que permite às igrejas fazer política do púlpito

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4 de maio de 2017, 18h58

No Dia Nacional da Oração, nesta quinta-feira (4/5), o presidente Donald Trump anunciou que assinou um decreto presidencial que muda o texto de dispositivo do código tributário que proíbe as igrejas, por serem entidades sem fins lucrativos e isentas de imposto, de endossar ou se opor a candidatos a cargos públicos eletivos em seus sermões religiosos. Agora, as igrejas estão livres para fazer sermões eleitorais, bem como para fazer doações a candidatos de sua preferência.

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Presidente dos EUA, Donald Trump assinou decreto presidencial que muda o texto de dispositivo do código tributário que proíbe as igrejas de fazer política.
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A legislação, aprovada em 1954 com o nome de “Johnson Amendment”, teve o objetivo de impedir que grupos religiosos, beneficiados por isenção de impostos e por doações dedutíveis do Imposto de Renda de seus fiéis, usem o dinheiro apurado para fazer campanha eleitoral contra o mesmo governo que lhes concedeu os benefícios fiscais ou para fazer a promoção de seus interesses políticos.

Em outras palavras, a legislação teve a finalidade de impedir que o governo subsidie campanhas políticas a partir dos púlpitos das igrejas. Como explica o IRS (a Receita Federal dos EUA), “todas as organizações [sem fins lucrativos, incluindo entidades beneficentes, fundações etc.] são totalmente proibidas de participar direta ou indiretamente ou de intervir em qualquer campanha política em favor de (ou em oposição a) qualquer candidato a cargo público eletivo”.

Todas essas entidades podem fazer política, incluindo campanhas eleitorais, desde que abram mão dos benefícios fiscais concedidos pelo governo, de acordo com a “Johnson Amendment”, dizem os sites do Washington Post, Politico, ThinkProgress, Daily News e ABC News.

Trump teria dois caminhos alternativos ao decreto presidencial: ir à Justiça para questionar a constitucionalidade da lei ou esperar que o Congresso aprovasse um projeto de lei que alterasse a legislação (projeto que já teria sido apresentado ao Congresso). Ele optou pelo decreto para satisfazer uma promessa de campanha, feita principalmente à sua base de eleitores evangélicos.

No entanto, o decreto não altera a legislação vigente. Apenas ordena ao IRS que relaxe a execução das regras que barram as igrejas com isenção de impostos de participar da política, em nome das liberdades religiosas. Ao anunciar a assinatura do decreto a um grande número de pastores evangélicos na Casa Branca, Trump declarou, para o aplauso da audiência: “O governo tem usado essa legislação como uma arma contra as pessoas de fé. Ninguém deve censurar os sermões ou perseguir os pastores”.

A medida beneficia significativamente o Partido Republicano, que se alinha com os objetivos dos religiosos, como o de reverter todos os direitos que foram concedidos ultimamente à comunidade LGBT (incluindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo), de proibir o aborto e até mesmo a cobertura por fundos públicos de métodos de controle da natalidade.

Trump devia isso aos religiosos, desde que pesquisas revelaram, em plena campanha eleitoral, que ele tinha 80% dos votos dos cristãos evangélicos, enquanto sua opositora ao governo dos EUA, a democrata Hillary Clinton, tinha apenas 16% dos votos desse eleitorado.

Uma pesquisa atual da Pew Research Center, noticiada pelo Washington Post, afirma que os religiosos estão impedindo a popularidade de Trump de despencar ainda mais. O presidente tem o apoio de 67% dos evangélicos brancos e de 61% dos católicos brancos, enquanto sua popularidade entre o público em geral é de apenas 39%.

O professor de Direito Tributário da Universidade Valparaiso David Herzig disse aos jornais que a medida vai transformar as igrejas em Super PACs com privilégios extras. Super PACs (Super Political Action Committees) são comitês de ação política que podem receber doações sem limites de corporações, sindicatos e indivíduos, para financiar campanhas políticas.

Mas existem restrições e obrigações, como a de fazer divulgações públicas de seus gastos. As igrejas, tal como outras entidades sem fins lucrativos, não estão atadas às mesmas restrições e obrigações, o que, teoricamente, torna o processo muito menos transparente, disse Herzig.

Segundo o site ThinkProgress, Trump pode ter, involuntariamente, armado uma armadilha para seu eleitorado religioso ao legislar por decreto. O próximo presidente poderá reverter as regras ao que era — e, para isso, basta reverter a ordem dada ao IRS —, e todas as igrejas e seus representantes eclesiásticos poderão ser investigados por violação da lei — e perder os benefícios fiscais.

O decreto presidencial não foi comemorado por todos os religiosos. Alguns pastores declararam apoio à legislação antiga, porque ela protege o que deve ser um refúgio espiritual contra a intrusão perniciosa da política. O presidente da Interfaith Alliance, rabino Jack Moline, disse aos jornais que a "Johnson Amendment" impede que os templos de oração se convertam em instrumentos político-partidários.

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