Responsabilidade objetiva

União pagará R$ 30 mil a delegado da PF perseguido por chefes em Foz do Iguaçu

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2 de maio de 2017, 13h08

A perseguição de dois delegados da Polícia Federal a um colega vai custar no mínimo R$ 30 mil aos cofres da União. No dia 17 de abril, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região condenou a União a indenizar o delegado pelo assédio moral cometido por seus superiores na Delegacia da PF em Foz do Iguaçu (PR). A decisão foi unânime.

O desembargador Luiz Alberto D’Azevedo Aurvalle, relator, foi o vencedor. Segundo ele, ficou comprovado que o autor da ação sofreu danos morais por parte de seus superiores, cujo comportamento “tinha o intuito de constrangê-lo psíquica e profissionalmente”.

De acordo com delegados ouvidos no processo como testemunhas, a perseguição começou em 2011. Em setembro daquele ano, diversos deles, lotados na DPF de Foz do Iguaçu, escreveram um memorando pedindo o “fim destas condutas persecutórias”, e os enviou aos seus superiores.

Por causa do recado, os delegados responsáveis pela delegacia convocaram uma reunião para explicar que não havia perseguição, mas que apenas se estava apurando a conduta de um dos colegas.

A conduta desse colega, o delegado autor da ação, não chamou atenção de ninguém, só dos chefes. Conforme as testemunhas contaram, o “clima de animosidade” começou porque o autor da ação não quis fazer um favor ilegal aos superiores. Delegado de plantão, ele se recusou a assinar a transferência de um preso em flagrante para a Corregedoria da Polícia Rodoviária Federal sem autorização judicial.

Depois disso, ele foi alvo de quatro procedimentos administrativos disciplinares, todos arquivados por falta de justa causa. O delegado foi defendido pela advogada Lívia de Moura Faria, do escritório Nelson Wilians Advogados. Para ela, a decisão “surtirá o efeito pedagógico para desestimular e coibir a prática do assédio moral dentro das instituições públicas, especialmente a Polícia Federal”.

Aluno nota 10
O primeiro foi instaurado porque o delegado questionou o resultado de sua avaliação depois do estágio probatório. Saiu com nota 94, de 100, mas quis explicações. Foi instaurada uma correição extraordinária em todos os processos do delegado, que concluiu haver atraso em vários processos. Essas conclusões se tornaram o primeiro PAD.

Logo depois, foi instaurado um procedimento administrativo para investigar se o delegado tinha autorização para dar aulas na Academia da PF, em Brasília, e na Universidade Federal do Paraná, em Curitiba.

Ambos foram arquivados depois de curta apuração. O segundo PAD porque ficou comprovado que o delegado tinha, sim, autorização para dar aula. O outro porque não ficou comprovada a desídia dele na demora pela conclusão dos processos.

Por lei, inquéritos policiais devem ser concluídos em 90 dias. Mas, conforme diversos delegados disseram, a enorme demanda de trabalho da delegacia de Foz, região em que o Brasil faz fronteira com Argentina e Paraguai, impossibilita o respeito aos prazos. Um deles contou que cada delegado cuida em média de 480 processos naquela DPF. Ele também informou que nunca tinha visto alguém sair do estágio probatório com nota menor que 100 sem que houvesse nenhum desabono. Também era inédita a correição extraordinária nos inquéritos de um único delegado, sem prévia investigação ou denúncia.

Crime de recurso
Os outros dois processos administrativos foram instaurados na mesma época em que foi enviado o memorando. O delegado autor da ação julgada pelo TRF-4 pediu dispensa para tratar de um problema de saúde, e os chefes da DPF decidiram instaurar um PAD para apurar a licença médica “conseguida” pelo delegado.

Ele recorreu da instauração do PAD, pedindo o arquivamento, e foi à Corregedoria da PF reclamar da perseguição. E foi instaurado novo procedimento administrativo.

Novamente, as testemunhas disseram se tratar de fatos inéditos. Nunca tinham visto as estruturas da Polícia Federal se movimentar com tanta veemência para inviabilizar a licença médica de um profissional. Os demais delegados também contaram que todos os documentos de todos os processos administrativos foram disponibilizados no sistema interno da PF, acessível a todos os que trabalhavam naquela delegacia.

“Da prova dos autos depreende-se que os então chefes exigiram que o autor assinasse um ofício autorizando a transferência de preso sem autorização judicial; submeteram o autor a uma correição extraordinária em face de suposto atraso nos processos sob sua responsabilidade; submeteram seus médicos a interrogatório a fim de comprovar que o autor não estava doente”, diz o acórdão.

“Trata-se de conduta perversa, reprovável, antiética, que deve revestir-se de considerável grau de intensidade e gravidade”, escreveu, em seu voto.

Clique aqui para ler o acórdão.

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