Opinião

Novas tecnologias cada vez mais mudam contornos da cobrança do ISS

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1 de maio de 2017, 10h38

O Imposto sobre Serviços (ISS) é um tributo antigo, na Constituição e na lei, mas que a cada dia ganha novos contornos, sobretudo em virtude da necessidade dos entes tributantes de captar novas realidades econômicas subjacentes aos fatos que ensejam o imposto e que estão em constante inovação e mutação.

Atualmente, com a intangibilidade dos serviços que vêm surgindo (streaming de dados, Uber, Netflix, aplicativos para smartphones, e-commerce em sites na internet, serviços de transmissão ou de processamento de dados, distribuídos em P.O.S. – point of sales – físicos ou digitais), mais atenção há que se ter para não continuarmos situados na hermenêutica inercial de olhar a operação da empresa como algo estático.

Apesar de se tratar de serviço, observamos que o imposto incide deveras sobre a produção e circulação de riqueza. Por isso devemos olhar sob a ótica tanto do fato, estático quanto do processo produtivo em que ele (dinamicamente) ocorre. É importante verificar como o serviço é produzido e quais os atos que lhe integram e definem a feição final. A importância de cada um desses atos (ou operações) no processo ou etapa da “cadeia produtiva” é importante na interpretação do alcance dos conceitos e aspectos da hipótese de incidência do ISS.

Para a correta identificação do local da realização do fato jurídico do ISS, é impreterível analisar se há a presença e o respeito a alguns critérios materiais presentes no fato jurídico tributário. Um desses critérios é o princípio constitucional da territorialidade

O aspecto espacial do ISS é o local em que se aperfeiçoa, onde se conclui o serviço (ou onde ele é materializado de forma mais nuclear, preponderante e intensa). “Ver o quando para ver o onde” está em consonância com o que acabamos de dizer. Contudo, é de se indagar acerca do “quando” da conclusão ou da realização preponderante e essencial, intensa, que pode se dar em etapas iniciais ou centrais/intermediárias (e não apenas na conclusão da cadeia produtiva, portanto).

Em relação à atividade-fim, cabe destacar um conceito que é inerente a esse aspecto, que é o de preponderância funcional. Deve-se perquirir qual a situação descrita na norma (operação ou expressão nela contida) que mais contribui para agregar resultado e utilidade à operação em sua totalidade.

O Superior Tribunal de Justiça tem chamado isso de “núcleo do serviço”, o ponto que mais contribui para que a sua produção ocorra e que mais influencia para performar o que o cliente almejou quando realizou o contrato e tomou dado serviço do contribuinte.

Após a edição da LC 116/03, a pacificação da jurisprudência começou a ser consolidada com a decisão proferida no Ag. Rg. nos Eds. Ag. 1.272.811 (1ª Seção, de 1º de fevereiro de 2012), cuja ementa abaixo colacionada.

“Cuidando-se de fato gerador ocorrido na vigência da Lei Complementar n. 116/2003 e não se tratando de serviços de construção civil ou das exceções previstas nos incisos I a XXII do art. 3º do referido diploma, correta a decisão do acórdão ora embargado que, na linha do repetitivo mencionado, adotou o critério ‘do local do estabelecimento prestador do serviço’.”

Com intuito de dar prosseguimento na consolidação da jurisprudência, o STJ julgou o Resp 1.060.210, sob o rito de recurso repetitivo. Esse julgamento reiterou a jurisprudência que vinha se consagrando no STJ.

Entretanto, o STJ não seguiu o seu próprio entendimento em junho de 2014, quando julgou o Resp 1.439.753 (caso laboratório e análises clínicas): considerou como a materialidade do fato jurídico tributário do ISS a riqueza do tomador (consumidor).

No mesmo mês, no julgamento do REsp 1.380.710, a corte considerou como fundamentação o núcleo da prestação do serviço, desconsiderando o local do estabelecimento do prestador do serviço.

Apesar desses julgados contrários à jurisprudência que vinha se consolidando, os precedentes mais recentes do STJ vêm utilizando como fundamento principal o local onde se situa o estabelecimento prestador, a unidade produtiva responsável pela realização do serviço efetivamente, onde a relação é perfectibilizada e o contribuinte disponha de unidade econômica ou profissional organizada com o objetivo de desenvolver a atividade de prestar serviços.

A jurisprudência atualmente é dominante no seguinte sentido: a municipalidade competente para realizar a cobrança do ISS, após a entrada em vigor da LC 116/03, é a do local do estabelecimento prestador dos serviços onde são aperfeiçoados, assim considerada a localidade em que há uma unidade econômica ou profissional capaz de realizar o serviço, de modo permanente ou temporário. São irrelevantes, para caracterizá-la, as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou similares.

Essa corrente dominante prestigia o critério jurídico do “estabelecimento prestador” (podendo se dar no estabelecimento filial ou onde a matriz executa de fato o serviço). Não é necessariamente o local do estabelecimento matriz (primeiro critério jurídico, mais antigo nas decisões do STJ). No fundamento desse critério jurídico está o do núcleo do esforço, o da atividade preponderante, a chamada preponderância funcional. Por isso se fala em “efetiva prestação”, ou seja, como o serviço foi efetivamente prestado, realizado e elaborado.

Feitas essas observações acerca da jurisprudência, é possível concluir que deve ser usada como guia efetivo para a tomada de decisões, sobretudo envolvendo análise de riscos. Contudo, não se pode ignorar que algumas imprecisões, como as que foram comentadas, decorrentes das decisões que a consolidaram na corte, possibilitam que se faça uma análise mais cuidadosa de cada caso, de modo a verificar se há efetiva certeza sobre a subsunção que se pretenda fazer ou sobre a rejeição que se pretenda impor, mormente, repito, em questões envolvendo análise de cenários de riscos.

 

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