Luta de egos

Só haverá segurança jurídica quando juízes largarem o individualismo, diz Moraes

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23 de junho de 2017, 17h13

O Brasil só terá segurança jurídica de fato quando os magistrados, tanto de primeira instância quanto de tribunais superiores, abandonarem o individualismo e se comprometerem a confiar uns nos outros. Isso é o que pensa o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
Alexandre de Moraes afirmou que insegurança jurídica gera prejuízos à economia e à sociedade brasileiras.
Fellipe Sampaio/SCO/STF

Em palestra no evento Benefícios Fiscais e Segurança Jurídica em Matéria Tributária, promovido pelo Fórum Permanente de Direito Tributário da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro nesta sexta-feira (23/6), o mais novo integrante do STF afirmou que há uma desconfiança recíproca entre juízes no país. Os de primeiro grau desrespeitam os precedentes de cortes superiores, enquanto os ministros destas extrapolam suas funções e reformam as decisões de mérito daqueles magistrados.

Enquanto essa “guerra fria” não tiver um armistício, os precedentes judiciais terão impacto limitado, avaliou Alexandre de Moraes. Tanto que os mecanismos de common law introduzidos no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Emenda Constitucional 45/2004 — súmula vinculante e repercussão geral — ainda não produziram os efeitos esperados, como redução da morosidade judicial e aumento da segurança jurídica.

“Não há um advogado sério, um consultor jurídico sério, que possa chegar para um investidor e falar o seguinte: ‘Pode investir no Brasil, você não vai ter problemas com a Justiça’. Quem falar isso não estará sendo sério”, disse o ministro.

Problema interno
Segundo Alexandre de Moraes, o destino de uma ação precisa deixar de ser decidido por quem a distribui no tribunal. E mais: os magistrados, inclusive de cortes superiores, devem ser mais coerentes em seus posicionamentos, sem ficar mudando de opinião em períodos relativamente curtos. Também não é possível que uma mudança de governo altere os rumos de um tribunal como o Supremo, apontou.

Um exemplo de como as instituições deveriam se sobrepor às individualidades, de acordo com Alexandre de Moraes, está na postura do ex-ministro da Suprema Corte dos EUA Antonin Scalia, morto em 2016, em julgamento recente sobre a manutenção ou não da decisão do tribunal que liberou o aborto no país. Mesmo sendo conservador e totalmente contra a interrupção da gravidez, Scalia afirmou que era muito cedo para reverter o posicionamento da corte no caso Roe vs Wade — que é de 1973.

“Vejam a consciência de segurança jurídica dele. Não sou americanófilo, mas tenho uma admiração extrema pela forma como eles tratam as instituições. Isso é um exemplo de respeito à segurança jurídica do país”, opinou.

Se o país não mitigar essa insegurança, continuará perdendo investimentos para vizinhos, ressaltou Moraes, citando a recente decisão da fabricante de roupas e calçados Riachuelo de instalar uma nova fábrica no Paraguai, em vez de no Brasil.

Importação ineficaz
No mesmo evento, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, afirmou que de nada adianta importar institutos jurídicos sem adaptá-los ao ordenamento jurídico brasileiro. Como exemplo de mecanismo desvirtuado no país, o integrante do governo Michel Temer citou a delação premiada nacional, “que não tem nada a ver com o plea bargain”, dos EUA.

Sem mudar a cultura jurídica do Brasil, continuaremos sofrendo com insegurança, declarou Jardim, reforçando o coro de que o Judiciário deve ser encarado como uma instituição, e não como um aglomerado de indivíduos.

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