Audiência pública

Para PF e Ministério Público, Justiça pode bloquear aplicativo WhatsApp

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2 de junho de 2017, 16h37

O Supremo Tribunal Federal começou a reunir informações para subsidiar o julgamento de duas ações que discutem dispositivos do Marco Civil da Internet e a possibilidade de decisões judiciais impedirem o funcionamento do aplicativo WhatsApp.

Em audiência pública nesta sexta-feira (2/6), apresentaram seus pontos sobre o assunto a Polícia Federal e o Ministério Público, além do próprio WhatApp e o Facebook, que comprou o aplicativo em 2014.

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Bloqueios do WhatsApp determinados pela Justiça são tema de audiência pública organizada pelo Supremo.

As ações, relatadas pelos ministros Edson Fachin e Rosa Weber, alegam que a suspensão dos serviços viola o preceito fundamental da liberdade de expressão e comunicação, previsto na Constituição, e também na Lei 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet.

A Polícia Federal foi a primeira a se manifestar na audiência. Na opinião do delegado Felipe Leal, os aplicativos de troca de informações devem respeitar o que diz o Marco Civil da Internet em seus artigos 11 e 13 e registrar e armazenar os dados que são compartilhados pelo sistema. Ele chamou a atenção para o uso frequente do aplicativo por criminosos para cometimento de delitos. Segundo Leal, diversas investigações da PF provam que ações criminosas são preparadas por meio de aplicativos como o WhatsApp. “A persecução penal no Brasil não pode se pautar por empresas de informática”, afirmou.

O perito criminal da PF, Ivo de Carvalho Peixinho, afirmou que o pedido de bloqueio de um aplicativo só é feito em último caso, como medida extrema para fins de investigação policial. “A polícia age a partir de notícia-crime, não temos interesse em vigilância em massa ou algo dessa natureza”, afirmou.

Para a Polícia Federal, a criptografia não pode servir para encobrir o cometimento de crimes. Membros da entidade afirmaram que nenhum tráfego de mídias, como imagens e vídeos entre os usuários do serviço, acontece sem passar pelo servidor do WhatsApp. Por isso, acreditam ser possível saber se várias pessoas estão compartilhando o mesmo conteúdo de forma viralizada, por exemplo. Isso, segundo os representantes da PF, permitiria a colaboração da empresa com a polícia para combater crimes como pornografia infantil, caso haja suspeita de que o material que se tornou viral envolva cometimento do crime.

A PF defende também que o aplicativo faz uma coleta grande de dados relacionados ao modelo do aparelho celular usado pelos usuários, endereço de IP, navegador e localização de acesso que podem ser fornecidos em caso de investigações, sem violar o sigilo das comunicações.

Conteúdo desconhecido
O fundador do WhatsApp, Brian Acton, afirmou na sua exposição que a empresa sabe quantas imagens e vídeos passam pelos servidores, mas não o conteúdo, porque a criptografia não permite. “Não podemos fazer juízo de valor desse material pelo simples motivo que não podemos acessá-lo”, afirmou em sua exposição na audiência.

Ele falou que o Brasil é importante para a empresa e que os bloqueios são preocupantes. Os bloqueios estão sendo determinados porque, segundo o juízes, o aplicativo não fornece informações e dados de usuários que estão sendo investigados. 

Segundo ele, são mais de 100 milhões de usuários no país. Ele defendeu o uso da criptografia, porque impede o conhecimento do conteúdo das conversas por terceiros. E deu um exemplo de como isso é importante ao falar que muitos crimes são denunciados por meio do aplicativo. “A criptografia permite que elas [pessoas] façam isso sem medo de serem descobertas”, afirmou.

Segundo Acton, as mensagens não são acessadas pela empresa. Falou também que o sistema funciona como um cadeado e chave em cada ponta da comunicação que são trocados de forma constante. Segundo ele, as trocas de informações saem do emissário e chegam ao destinatário por meio de um “túnel seguro” que não pode ser acessado. “Não existe a possibilidade de fazer interceptação de conteúdo legível da mensagem porque a empresa não tem acesso à chave dos usuários.” 

Acton afirmou que o WhatsApp não tem como desativar a criptografia para só uma pessoa ou um grupo de usuários, o que deixaria todo o sistema vulnerável. “A única maneira de desativar para um seria desativar para todos.”

Apesar disso, ele afirmou que a empresa continuará a trabalhar com os órgãos de Justiça para colaborar com as investigações criminais. O fundador do aplicativo informou que a empresa criou uma equipe específica para dialogar com o sistema de Justiça e gerar dados específicos que possam subsidiar investigações a partir de pedidos feitos ao aplicativo. “Nossa equipe está preparada para lidar com solicitações das polícias do mundo todo, inclusive com pessoal que fala português.”

Pelo Facebook, empresa que comprou o WhastApp em 2014, falou Bruno Magrani, responsável pela área de relações governamentais no Brasil. Ele defendeu a criptografia utilizada pelo aplicativo e acrescentou que procuradores e juízes também são beneficiados pelo sistema, permitindo conversas entre membros do Ministério Público e Judiciário de forma segura e sem interceptações.

Magrani lembrou também que o Marco Civil da Internet prevê a criptografia como ferramenta de segurança para comunicação na web. Para ele, o desenvolvimento da internet sem criptografia estaria comprometido.

Sanções
O Ministério Público Federal defendeu durante participação no evento que o WhatsApp deve sofrer sanções previstas no Marco Civil da Internet caso descumpra a legislação brasileira. Para o órgão, a suspensão temporária de um aplicativo, que de forma contumaz descumpre a legislação brasileira, em caso de não fornecimento de informações pedidas pela Justiça, não viola os direitos à comunicação e à liberdade de expressão.

O órgão defende que as duas ações devem ser julgadas improcedentes. E lembra que os pedidos de quebra de sigilo de mensagens envolvem crimes graves como tráfico de drogas, de armas, de pessoas e troca de pornografia infantil, além de preparação de sequestros, homicídios e atentados terroristas.

Na opinião da procuradora Neide Cardoso de Oliveira, os direitos à comunicação e à liberdade de expressão não são absolutos e podem ser modulados para a proteção de outros direitos igualmente importantes. Ela cita o direito à vida, à dignidade, à proteção integral da criança e à privacidade, que são protegidos em investigações de crimes graves.

Já para o secretário de Cooperação Internacional da Procuradoria-Geral da República, Vladimir Aras, o resultado do julgamento das ações pelo STF não pode criar no Brasil “um paraíso digital que, segundo ele, criminosos possam cometer infrações penais e violar direitos fundamentais tão importantes quanto o direito à privacidade.

ADI 5.527
ADPF 403

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