Bate-boca presidencial

Ameaça de Donald Trump de impor lei marcial em Chicago é inconsistente

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26 de janeiro de 2017, 13h14

Ninguém na comunidade jurídica dos EUA levou a sério a ameaça do presidente Donald Trump de impor a lei marcial em Chicago para conter a violência, embora a notícia tenha repercutido nos jornais pelo mundo. Basicamente, a ameaça de Trump foi uma retaliação à crítica que o prefeito de Chicago, Rahm Emanuel, fez à insistência do presidente em afirmar que a multidão que compareceu a sua posse foi maior do que as televisões mostraram.

“Você não é eleito para debater o tamanho da multidão em sua posse”, declarou o prefeito de Chicago. “Você é eleito para se certificar de que as pessoas tenham um emprego, de que a economia continue a crescer, que as pessoas tenham segurança em relação à educação de seus filhos. Não tem nada a ver com o tamanho da multidão.”

Logo depois, Trump escreveu no Twitter: “Se Chicago não acabar com a carnificina terrível que está ocorrendo, 228 tiroteios em 2017 com 42 mortes (aumento de 24% em relação a 2016), vou enviar os federais!”.

[If Chicago doesn’t fix the horrible “carnage” going on, 228 shootings in 2017 with 42 killings (up 24% from 2016), I will send in the Feds!

— Donald J. Trump (@realDonaldTrump) January 25, 2017]

“Enviar os federais”, na linguagem política americana, significa impor a lei marcial, com envio de todas as forças federais necessárias para assumir o controle da cidade. Uma coisa que não vai acontecer e, por isso, a ameaça é entendida como mais um episódio do estilo “bateu-levou” que Trump adotou desde a campanha eleitoral.

Na verdade, Chicago está longe de ser a cidade mais violenta do país, segundo os sites Salon e Infowars. No último levantamento de taxa de homicídio per capita nas metrópoles americanas, de 2015, Chicago está em 18º lugar, com uma taxa de 16,4 por 100 mil habitantes.

Nova Orleans, na Louisiana, ocupa a primeira posição com uma taxa de homicídio de 46,9 por 100 mil habitantes, seguida por Detroit, em Michigan (45,0 por 100 mil habitantes), e St. Louis, no Missouri (43,8 por 100 mil habitantes).

Em ocorrências de tiroteios não fatais, Chicago ficou em 12º lugar, com uma taxa de 88,9 por 100 mil habitantes. Os primeiros lugares foram ocupados por St. Louis (659,7 por 100 mil habitantes), Memphis, no Tennessee (247,1 por 100 mil habitantes), e Oakland, na Califórnia (232,4 por 100 mil habitantes).

Implicações jurídicas
A primeira coisa que se faz, quando a lei marcial é imposta no país, é “rasgar” a Constituição — isto é, ela deixa de ser aplicável no que se refere aos direitos do cidadão, diz o site Infowars.

Não há liberdade de expressão, liberdade de imprensa, liberdade de assembleia, e as forças federais podem prender pessoas a qualquer tempo, sem nenhuma razão para justificar sua ação — e sem se preocupar com o direito ao devido processo etc.

Cria-se um “estado de emergência, no qual as autoridades federais podem ir de casa em casa para confiscar armas, munições, suprimentos alimentares e o que mais acharem necessário.

O mais comum é que as autoridades comecem a prender dissidentes, que passam a ser classificados como “subversivos”, aos quais podem ser negados os direitos constitucionais. Muito parecido com tudo o que os cidadãos que conheceram ditaduras e atos institucionais estão familiarizados.

A ameaça de impor lei marcial em Chicago é vista, portanto, como uma fala inconsequente — ou uma balela. Sabe-se que, para comer, coçar e eliminar todos os direitos constitucionais dos cidadãos, basta começar.

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