Atividade privativa

Associação paranaense que oferecia serviços jurídicos é condenada na Justiça

Autor

16 de janeiro de 2017, 17h19

Uma associação não pode oferecer serviços de advocacia, ainda mais se forem pagos. Pois, além de ferir o estatuto da advocacia, descaracteriza as funções principais da entidade. Assim entendeu o juiz Marcos Roberto Araújo dos Santos, da 4ª Vara Federal de Curitiba ao impedir a Associação Paranaense de Apoio ao Mutuário (Aspam) de prestar quaisquer atividades exercidas por advogados.

A associação foi processada pela seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil depois que denúncias contra os atos da entidade foram recebidas. Além dos serviços privativos da advocacia que eram oferecidos, a OAB-PR destacou na ação que o objeto social da Aspam não tem caráter associativo, pois o ingresso é condicionado a um contrato de prestação de serviços jurídicos e não a uma ficha cadastral.

Segundo a OAB-PR, que pediu a dissolução da Aspam, essa diferença na aproximação entre as partes gera obrigações entre “contratante" e "contratado", o que fere o artigo 53 do Código Civil. O dispositivo determina que as associações devem ter fins não econômicos.

A associação, continuou a OAB-PR, além de captar clientes, também definia as medidas judiciais a serem tomadas e dava orientação jurídica, processava documentos e pagava honorários e custas judiciais. Complementou dizendo que a associação recebia 20% dos montantes pagos.

Já a Aspam rebateu as acusações afirmando que a OAB não teria legitimidade para mover a ação. Afirmou também que os serviços prestados são gratuitos e direcionados à população carente.

Para o juiz Marcos Roberto Araújo dos Santos, a entidade prestou serviços privativos da advocacia e o fez com fins econômicos. A referida associação cobrava por serviços prestados, diz a decisão, observando que, em juízo, "advogados manifestaram que não recebiam honorários advocatícios da associação, portanto, os valores pagos a tal título convertiam em proveito da própria associação.”

Sobre esse ponto, o julgador explicou que, conforme o artigo 53 do Código Civil, as associações terão "fins não econômicos" e que essa finalidade é o que diferencia tais entidades de uma sociedade comercial ou empresarial. “Evidente que, ao se transmutar em uma associação, o real objetivo era angariar clientes para ações judiciais e, com isto, obter lucro”, ressaltou.

Segundo Marcos dos Santos, as provas documentais apresentadas confirmam a prática comercial da Aspam. No material apresentado estavam contratos onde foram determinados valores para consultoria e apresentação de ação judicial, incluídos aí montantes em caso de vitória na Justiça.

“Fica evidente que os interesses da requerida nunca tiveram natureza altruística ou desprovida de fins econômicos: as referidas pessoas tinham interesse direto na prestação de serviços remunerados, consultoria e assessoria jurídica, já que dizem respeito a um ramo específico do Direito”, detalhou o juiz federal.

“De todos os documentos encartados nos autos depreende-se claramente a oferta de serviços privativos de advogado pela pessoa jurídica da requerida. Conclui-se que as atividades desenvolvidas pelos réus efetivamente se caracterizam como exercício irregular da advocacia, ofendendo aos dispositivos do Estatuto da OAB”, complementou.

Sobre o fim da Aspam, o julgador explicou não ser possível extingui-la se ela atuasse dentro dos limites impostos por lei. “Vez que é garantia constitucional o direito de associação, todavia não com o cunho claro de recursos financeiros em atividades evidentemente típicas da advocacia, como o que se demonstra nos autos.”

Resposta da Aspam
Em e-mail à ConJur, a Aspam afirma que irá recorrer da decisão e confirma que cobrou valores pelos trabalhos, mas todos irrisórios, e justificados para manter a estrutura de uma entidade que defende “pessoas humildes, pobres, carentes, ignorantes enganadas pelos bancos e financeiras”. “O nosso trabalho é de orientação e auxilio, e não trabalho jurídico.”

Sobre os advogados que lá atuam, esclareceu que os profissionais são conveniados e atuam “gratuitamente para receber honorários de sucumbência ao final do processo ou em um acordo judicial”. “A Aspam nunca recebeu nenhuma ajuda governamental”, diz a entidade no texto.

Ressalta ainda que o atendimento oferecido, na verdade, “acabou incomodando a OAB”. “Ao longo desse período [12 anos de existência] inúmeras pessoas vieram até a Aspam com problemas financeiros e procurando algum tipo de orientação e ajuda, e, na sua grande maioria, pessoas humildes da periferia de Curitiba e Região Metropolitana, o que a OAB nunca o fez.”

“A OAB, entidade de classe que deveria criar mecanismos para facilitar o acesso das pessoas simples e humildes à Justiça, que são quem mais sofrem com o canibalismo dos bancos e das financeiras, faz totalmente o contrario e tenta acabar com as instituições que buscam auxiliar e ajudar essa população que é enganada e roubada pelos bancos e financeiras”, critica a Aspam.

Clique aqui para ler a decisão.

*Título alterado às 15h56 do dia 17 de janeiro de 2017 para correção.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!