Opinião

Réquiem para cultura do encarceramento praticada no Brasil

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12 de janeiro de 2017, 6h36

Para acabar com o déficit prisional atual de 250 mil vagas — coincidentemente o número de presos provisórios no sistema penitenciário — são necessários, segundo levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça, cerca de R$ 10 bilhões.

Entre os principais problemas do sistema prisional apontados pelo CNJ, estão a superlotação carcerária, falta de gestão, falta de política de reintegração social e a mortalidade dentro dos presídios causada por surtos de tuberculose, sífilis, HIV e hepatite.

As autoridades não entendem ou não querem entender que enquanto perdurar a mentalidade punitivista e a cultura do encarceramento, não vamos avançar em nada, absolutamente em nada. 

Lamenta-se, ainda, a título de exemplo, o vergonhoso decreto de indulto assinado pelo atual ocupante do Palácio do Planalto que representou um retrocesso em qualquer tentativa de desencarceramento.

Somente com a descriminalizando do uso e do tráfico de drogas, responsável por grande parte das pessoas encarceradas ao lado dos crimes contra o patrimônio, com adoção efetiva de medidas de substituição da pena privativa de liberdade e com a bruta redução da prisão preventiva — decretada geralmente fora das hipóteses legais e dos casos de extrema necessidade — é que poderemos desacelerar o crescimento da população prisional. 

Enquanto os mais vulneráveis forem criminalizados, enquanto a política de "guerra as drogas" prevalecer, enquanto a prisão preventiva constituir-se em antecipação da tutela penal, vamos ter que conviver com rebeliões e mortes nas prisões brasileiras.

Não é necessário, como sustentam alguns, que seja feito um censo penitenciário para saber que a população carcerária cresce muito mais rápido do que a capacidade do estado de construir novos presídios.

“Mais cárcere, mais confinamento, mais repressão”, afirma com precisão e toda sua experiência, a criminóloga venezuelana Lola Aniyar de Castro. Segundo ela, a realidade na América Latina nos séculos XX e XXI caracteriza-se por apresentar os mais elevados índices históricos de violência carcerária, trata-se de “um barril de pólvora sempre preste a explodir”. A construção de novas prisões, sempre proposta como solução para o problema da superpopulação carcerária, constata Aniyar de Castro, levará a mais encarceramento, posto que “mais espaço disponível tem como resultado mais confinamento”. Afirma, ainda, com toda lucidez criminológica, que “a luta contra as prisões é uma luta social e política. É, pela seletividade da prisão, é também uma luta contra a pobreza”.

Definitivamente, o problema carcerário somente será amenizado com políticas criminais voltadas para a descriminalização de condutas que não afetam bens jurídicos, condutas que se situam apenas no campo do "perigo", condutas que não lesam bens de terceiros, condutas que se situam no campo estrito da moral, condutas insignificantes ou de bagatela etc. Além de uma política de desencarceramento. 

Por fim, como já proclamou Hassemer, não é demais lembrar que a melhor política criminal é sua substituição pela política social.

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