Contos do inesperado

PL quer proibir Suprema Corte dos EUA de citar seus próprios precedentes

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8 de janeiro de 2017, 6h27

O deputado republicano Steve King apresentou um projeto de lei que pretende proibir a Suprema Corte dos EUA de citar, em futuras decisões, os precedentes de autoria da própria corte em relação ao Obamacare (Affordable Care Act) — a lei que instituiu no país o seguro-saúde subsidiado para os pobres.

De todas as promessas de campanha de Donald Trump, a que mais empolgou os congressistas republicanos foi a da revogação do Obamacare. Trump e os congressistas repetem o slogan de campanha: “Repeal and Replace Obamacare” (revogar e substituir a lei conhecida como Obamacare).

Com seu projeto de lei, o deputado não só quer “revogar e substituir” a lei, como quer “erradicá-la pelas raízes”. Isto é, o deputado quer impedir que a desejada revogação do Obamacare e subsequente substituição por uma nova lei, seja questionada na Justiça pelos democratas. Tal questionamento terá sucesso se a Suprema Corte se basear em seus precedentes para tomar uma decisão.

A justificativa do projeto de lei não foi bem compreendida pela comunidade jurídica dos EUA. Ela se sustenta, segundo o PL, no “artigo 3, Seção 2, que permite ao Congresso fornecer exceções e regulações para a consideração da Suprema Corte de casos e controvérsias (…)”. Tal dispositivo estabelece:

“Em todos os casos afetando embaixadores, outros ministros públicos e cônsules e aqueles em que o estado é uma parte, a Suprema Corte deve ter competência originária. Em todos os outros casos antes mencionados, a Suprema Corte deve ter competência recursal, tanto quanto à lei quanto ao fato, com tais exceções e sob tais regulamentações que o Congresso deve fazer".

A verdade, segundo o site Above The Law, é que seria necessária uma emenda constitucional para impedir a Suprema Corte de recorrer a seus próprios precedentes para tomar qualquer decisão – ainda mais de uma forma seletiva como a proposta. Para isso, seria necessário a aprovação de “dois terços das duas casas legislativas” ou o requerimento de dois terços das assembleias legislativas dos estados.

Revogar a lei do Obamacare é mais fácil que substituí-la por uma nova lei, porque os republicanos ainda não têm nada para colocar em seu lugar, segundo a CNN e a MSNBC têm repetido em seus programas noticiosos.

Uma razão é que a atual lei do Obamacare foi aprovada porque o presidente Obama decidiu aceitar a versão republicana do então projeto de lei, uma vez que a proposta democrata não tinha chance de passar no Congresso. À época, o presidente Obama teria dito aos democratas que era melhor aprovar a proposta republicana do que nada.

A revogação da lei Obamacare, sem algo melhor para substitui-la (conforme prometido em campanha) também não é uma medida popular. Uma pesquisa da Kaiser Family Foundation, divulgada nesta sexta-feira (6/1), revelou que apenas 20% dos americanos apoiam a revogação pura e simples do Obamacare, sem a implementação concomitante de um plano substitutivo.

Quanto aos demais entrevistados, 28% preferem esperar a implementação do novo seguro-saúde para os pobres, 47% simplesmente não querem a revogação da lei e 5% não sabem responder. Atualmente, 20 milhões de americanos se beneficiam do Obamacare. Mais de 13 milhões de americanos não têm seguro-saúde algum, ou porque seus estados se recusaram a participar do programa ou porque desaprovam, politicamente, a existência de tal lei.

O editor do Above the Law, Elie Mystal, diz que o projeto de lei do deputado Steve King é inconsequente. Para ele, é fruto da empolgação dos republicanos com a inesperada vitória de Donald Trump na eleição presidencial de novembro, acompanhadas das vitórias do Partido no Senado e na Câmara dos Deputados, que asseguraram maioria simples.

“Os republicanos estão agindo como filhos cuja madrasta de 28 anos morre inesperadamente antes de seu pai milionário de 80 anos, garantindo acesso irrestrito à herança”.

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