Disputa entre facções

Rebelião em presídio de Manaus termina com ao menos 56 presos mortos

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2 de janeiro de 2017, 14h48

Pelo menos 56 presos foram mortos durante rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, que começou na tarde deste domingo (1º/1) e terminou na manhã desta segunda-feira (2/11). A informação foi divulgada pelo secretário de Segurança Pública do Amazonas, Sérgio Fontes.

Fontes também confirmou que a chacina é resultado da rivalidade entre duas organizações criminosas que disputam o controle de atividades ilícitas na região amazônica: a Família do Norte (FDN) e o Primeiro Comando da Capital (PCC). Aliada ao Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, a FDN domina o tráfico de drogas e o interior das unidades prisionais do Amazonas. Desde o segundo semestre de 2015, líderes da facção criminosa amazonense vêm sendo apontados como os principais suspeitos pela morte de integrantes do PCC, grupo que surgiu em São Paulo, mas já está presente em quase todas as unidades da federação.

Segundo o secretário de Segurança Pública, o estado, sozinho, não tem condições de controlar uma situação como essa. Agentes penitenciários da empresa terceirizada Umanizzare e 74 presos foram feitos reféns. Parte desses detentos foram assassinados, e ao menos seis apenados foram decapitados. Corpos foram arremessados por sobre os muros do complexo.

As autoridades estaduais ainda não sabem ao certo quantos presos conseguiram fugir. Poucas horas antes do início da rebelião no Compaj, dezenas de detentos tinham conseguido escapar de outra unidade prisional de Manaus, o Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat). O próprio secretário chegou a afirmar a jornalistas que a fuga do Ipat pode ter servido como “cortina de fumaça” para acobertar a ação no Compaj.

Segundo Fontes, as forças de segurança optaram por não entrar no Compaj por considerar que as consequências seriam imprevisíveis. “[A rebelião] Foi gerida com negociação e com respeito aos direitos humanos”, disse Fontes, garantindo que os líderes da rebelião serão identificados e responderão pelas mortes e outros crimes.

Transferência de presos
Em nota, o Ministério da Justiça informou que o ministro Alexandre de Moraes se colocou à disposição do governo de Amazonas para tudo o que fosse preciso, inclusive para eventuais transferências para presídios federais e envio da Força Nacional.

Ainda segundo o ministério, o governo estadual deve utilizar parte dos R$ 44,7 milhões de repasse que o Fundo Penitenciário do Amazonas recebeu do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) na última quinta-feira (29/12) para reparar os estragos na unidade.

Esta não é a primeira vez que o Ministério da Justiça sugere a transferência de presos como solução para rebeliões após conflitos entre integrantes do PCC e do Comando Vermelho. Em outubro, pelo menos 25 detentos morreram em conflitos entre essas duas facções em um presídio de Roraima.

Na ocasião, Alexandre de Moraes anunciou uma série de medidas do governo federal para ajudar a reprimir a onda de violência, entre elas a transferência de 16 líderes de facções para outras unidades federais e o envio de equipamentos para as equipes táticas.

O ministro também anunciou uma revisão na população carcerária do estado, com o objetivo de reduzir a superlotação por meio da retirada de presos provisórios. A ideia é mapear quais presos são provisórios e incluí-los em um mutirão de audiências de custódia.

“Alguma coisa precisa ser feita para que deixemos mais tempo fora do convívio social o homicida, o latrocida, o crime organizado. E que a gente possa realmente recuperar aquele que cometeu crimes leves”, disse o ministro. Segundo ele, aqueles que não cometeram delitos graves, como é o caso do narcotráfico ou da grave ameaça, podem ter sua situação prisional revista pelo juiz.

“Não é que não precise ser punido, mas aquele que não precisa estar provisoriamente na penitenciária pode ficar fora dela, com alguma restrição, como tornozeleira eletrônica, para que fique na penitenciária quem precisa ficar”, completou Moraes. 

Mapa de ocupação
O Departamento Penitenciário Nacional (Depen), ligado ao Ministério da Justiça, fez um levantamento da ocupação por facção criminosa nos quatro presídios federais e concluiu que há 25 diferentes grupos organizados presos nesses estabelecimentos. Os dados foram divulgados pelo jornal O Globo, em outubro de 2016.

De acordo com o Mapa de ocupação por facção criminosa, as duas facções envolvidas nas rebeliões do Amazonas e de Roraima respondem por 41% dos encarcerados. O relatório oficial aponta que os grupos, não mais restritos ao eixo Rio-São Paulo, espalham-se nas cadeias do país.

A estratégia da transferências de presos do Ministério da Justiça colabora para esse panorama. Ao jornal O Globo, Marco Antônio Severo Silva, diretor-geral do Depen, explicou que o objetivo do mapeamento, em linhas gerais, é distanciar o grupo criminoso do local de origem ou de domínio, conforme a disponibilidade de vagas. São 208 em cada presídio, totalizando 832 celas individuais.

"Se o grupo do preso tem origem em São Paulo, procuramos deixá-lo o mais longe possível de lá. Se são facções do Nordeste, não dá para colocar em Mossoró. E assim por diante", explicou Severo. "Não vou deixar numa mesma ala, em que pese serem celas individuais, presos de facções rivais. Isso tudo tem que ser levado em conta", concluiu.

Modernização de presídios
No último dia 19 de dezembro, o presidente Michel Temer autorizou, com a edição da Medida Provisória 755, investimento para modernizar o sistema penitenciário. A regulamentação da MP foi feita pela Portaria 1.414, publicada no dia 27 de dezembro no Diário Oficial da União, possibilitando o repasse de R$ 1,2 bilhão do Funpen aos estados.

Como destacado pelo ministro da Justiça, "a nova legislação permite a transferência obrigatória do Funpen diretamente para os fundos penitenciários dos estados, permitindo ao Ministério da Justiça e Cidadania acelerar os investimentos na racionalização e modernização do sistema prisional brasileiro".

A portaria estabelece critérios objetivos para os repasses e cria mecanismos que os agilizam, ao permitir que as transferências — obedecidos os critérios — sejam feitas diretamente de maneira automática, sem a necessidade de assinatura de convênios, para os fundos penitenciários de cada estado, Distrito Federal ou municípios. 

Nessa primeira liberação do Funpen, R$ 799 milhões serão destinados à construção de uma penitenciária por estado, garantindo a abertura das vagas necessárias para a diminuição da superlotação, com o aprimoramento da infraestrutura e modernização do sistema penal. Cada estado receberá um valor de R$ 44,7 milhões.

Também foram liberados R$ 321 milhões que se destinam à promoção da cidadania, alternativas penais, controle social e qualificação em serviços penais. Nessa categoria, ficam previstas a aquisição de novos equipamentos, como por exemplo os scanners, que substituirão as revistas pessoais das pessoas que visitam os presos. Além disso, será possível a aquisição de veículos, equipamentos de segurança para os agentes penitenciários e aperfeiçoamento do sistema de rádio comunicação.

*Texto alterado às 13h do dia 18/12/2017 para correção de informação. O número inicial indicava 60 vítimas, mas depois foi corrigido. 

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