Princípio democrático

Para PDT, teto de gastos exclui política das discussões orçamentárias do país

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14 de fevereiro de 2017, 15h14

Para o PDT, o novo regime fiscal, que impõe um teto para gastos públicos durante 20 anos, é inconstitucional. Em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada no Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira (14/2), a sigla afirma que impõe-se “o entrincheiramento de um mecanismo de controle de gastos públicos, que retira do campo da política ordinária a decisão sobre os meios necessários ao atingimento do equilíbrio fiscal”, o que viola o princípio democrático.

A ADI ainda não foi distribuída. Não tem número nem relator, portanto. O pedido é assinado pelos advogados Cláudio Pereira de Souza Neto, Beatriz Veríssimo de Sena e Guilherme Chamum Aguiar, do Souza Neto e Sena Advogados.

O questionamento é contra a Emenda Constitucional 95/2016, promulgada em dezembro pelo Congresso para estabelecer que os gastos primários do governo não podem exceder a inflação registrada no ano anterior. A proposta de emenda é de autoria do governo e foi anunciada como a salvação para a economia nacional, em crise. A ponto de o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, dizer que o país vai voltar a crescer assim que a PEC for aprovada.

Para o PDT, no entanto, o que o governo fez com a PEC foi excluir a política — e consequentemente a sociedade — das discussões sobre o orçamento. E isso foi feito em detrimento de investimentos na área social pelo Estado, algo garantido pela Constituição Federal.

“Ainda que o país recupere sua capacidade de crescimento e eleve substancialmente suas receitas, nenhum governo, nos próximos vinte anos, independentemente do programa apresentado e aprovado nas eleições, poderá incrementar o nível de investimento de recursos públicos para além da inflação”, diz a petição.

Tempo demais
O principal problema apontado pelo partido é o fato de uma medida adotada para problemas atuais durar 20 anos. Isso significa que ela atingirá os próximos cinco mandatos presidenciais e as próximas cinco legislaturas. “É legítimo que os atuais deputados e senadores imponham às próximas cinco legislaturas o ônus de aprovar novas emendas à Constituição para alterar o método de correção do crescimento dos gastos públicos? Pode uma maioria conjuntural estabelecer limites tão contundentes às decisões populares que ocorram no futuro?”

Por isso, um dos pedidos é que o Supremo exclua do artigo 108 do ADCT, incluído lá pelo novo regime, a possibilidade de revisão do teto só depois de 20 anos. Diz o dispositivo: “O Presidente da República poderá propor, a partir do décimo exercício da vigência do novo regime fiscal, projeto de lei complementar para alteração do método de correção dos limites”.

O pedido da legenda é para que o Supremo retire a expressão “a partir do décimo exercício da vigência do novo regime fiscal” do artigo. Com isso, alega o PDT, o tribunal permitiria que os presidentes possam, a cada mandato, propor uma lei complementar para rever o regime de teto de gastos.

Tamanho do Estado
Um dos pedidos de medida cautelar do partido é para que o Supremo exclua do teto os gastos do Executivo com saúde e educação. De acordo com a argumentação do partido, o principal efeito do novo regime fiscal será reduzir o investimento público per capita em saúde e educação. Como a EC 96 diz que os gastos serão limitados pela inflação, mas não há limites para a arredação, e a população do Brasil tende ao crescimento, o bolo total dos gastos públicos vai ser sempre limitado, mas a quantidade de “clientes”, não.

Ao mesmo tempo, continua o PDT, a EC 96 se refere a “gastos primários”, e não a gastos nominais. Ou seja, ela exclui do limite do gasto público o chamado “serviço da dívida”, ou o pagamento dos juros da dívida pública — apontado por economistas como um dos principais entraves ao desenvolvimento da economia brasileira.

Limites pros outros
Um dos principais pedidos do PDT é para que o Supremo dê interpretação conforme à Constituição ao artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), incluído lá pela emenda do novo regime fiscal. O dispositivo diz que a proposição legislativa que crie ou altere despesa deve vir acompanhada de estimativa de impacto financeiro.

Para o PDT, o texto desobriga o Executivo a apresentar essas estimativas quando adotar medidas tributárias chamadas de extrafiscais. São impostos como o IPI ou o IOF, usados pela União para incentivar ou redistribuir a atividade econômica no território nacional, e cujas alíquotas podem ser alteradas por decreto, nos termos do parágrafo 1º do artigo 153 da Constituição. São também chamadas de “normas tributárias indutoras”.

Com o novo artigo 113 do ADCT, o governo está liberado para adotar medidas extrafiscais sem fazer estimativas de impacto orçamentário, o que não permite o controle social dessas medidas. “A alteração da alíquota não pode ter em vista a simples e aleatória desoneração de setores produtivos, sob o risco de contribuir com o desequilíbrio dos cofres públicos”, diz a petição.

Medidas impopulares
Na ação, o PDT também argumenta que o limite de gastos criado no Brasil é único no mundo em radicalidade. Por isso, economistas e especialistas em orçamento e política fiscal divergem sobre o tema de maneira “inconciliável”.

O resultado é a pesquisa do instituto Datafolha de dezembro, segundo a qual 60% dos brasileiros são contra a então PEC 55, em trâmite no Senado. O levantamento ainda mostrou que 68% dos entrevistados viam mais efeitos negativos que positivos no novo regime fiscal.

A pesquisa ainda ouviu servidores públicos, ligados às áreas de saúde, educação, saneamento, segurança e transporte. Metade deles previu piora na prestação de serviços públicos. E 80% acreditam que vá faltar dinheiro para suas respectivas áreas.

Na ADI, o partido afirma que, como emendas constitucionais exigem quórum qualificado para aprovação, além de dois turnos, têm “presunção de constitucionalidade”. Mas a EC 96 promove “séria afetação de direitos dotados de alta carga de fundamentalidade”, o que “recomenda a adoção de uma postura de maior desconfiança em relação à constitucionalidade da Emenda Constitucional”.

“Compõe o conhecimento convencional no direito constitucional contemporâneo a ideia de que as normas que restringem processos políticos acabam por se sujeitar a um controle judicial mais exigente.”

Clique aqui para ler a petição inicial.

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