Reformatio in pejus

Juiz não pode rever decisão só porque Supremo permitiu prisão antecipada

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14 de fevereiro de 2017, 6h05

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, classificou como “teratológica” uma decisão da 3ª Vara Criminal de Brasília que mudou entendimento para determinar a prisão de um réu antes do fim da ação. A condenação era clara ao dizer que o cumprimento da pena seria somente após o trânsito em julgado do processo. 

Carlos Humberto/SCO/STF
"Para prender, é preciso mais do que o simples acatamento de petição ministerial em primeiro grau", diz Lewandowski.
Carlos Humberto/SCO/STF

Acontece que, quando o Supremo permitiu a prisão após condenação em segunda instância, esse caso dependia apenas da análise de um agravo em recurso especial, no Superior Tribunal de Justiça, movido pela defesa do réu. Mas o MP fez novo pedido ao juízo de primeiro grau, que determinou o imediato cumprimento da pena.

A defesa recorreu, mas os recursos foram negados pelo TJ-DF e pelo Superior Tribunal de Justiça. O advogado Alberto Zacharias Toron foi então ao Supremo, onde, em Habeas Corpus, argumentou ter havido violação da coisa julgada.

Toron disse que a sentença assegurou o direito de recorrer em liberdade e, como essa determinação não havia sido questionada pelo Ministério Publico em recurso ao segundo grau no momento da condenação, o réu teria direito de responder às acusações fora da cadeia.

O único recurso do MP para o TJ-DF, à época da condenação, foi para que fosse decretada a perda de cargo público de um dos envolvidos, o que foi provido. Os réus também conseguiram provimento parcial de recurso, para que fosse afastada a pena de multa.

Para o ministro Ricardo Lewandowski, “o juízo utilizou-se de uma forma imprópria para modificar a fundamentação do acórdão”. O magistrado explicou que esse ato configuraria uma espécie de reformatio in pejus, ou seja, a pena do réu estaria sendo agravada sem que o MP houvesse apelado da sentença, o que é proibidos pelo artigo 617 do Código de Processo Penal. 

Lewandowski destacou na liminar que a possibilidade de o réu recorrer em liberdade não foi alterada pela segunda instância. Disse ainda que o juízo de primeiro grau não pode mudar sua decisão simplesmente porque o STF alterou sua jurisprudência, ainda mais em um caso que aguarda julgamento de mérito e sequer é vinculante.

“Para prender um cidadão é preciso mais do que o simples acatamento de uma petição ministerial protocolada em primeiro grau, sobretudo quando estão em jogo valores essenciais a própria existência do Estado Democrático de Direito como a liberdade e o devido processo legal […] Trânsito em julgado difere substancialmente — como e obvio — de julgamento em segundo grau”, finalizou.

O réu da ação é Sami Kuperchmit, condenado por ser membro de um grupo que praticava crimes tributários na capital federal. Segundo o Tribunal de Justiça do DF, empresas de auditoria fraudavam penalidades aplicadas pelo Fisco em troca de valores equivalentes a 20% das multas tributárias aplicadas.

Clique aqui para ler o HC concedido por Ricardo Lewandowski.

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