Precipitação na corte

Gilmar Mendes ordena que STJ julgue Habeas Corpus de Adriana Ancelmo

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28 de abril de 2017, 16h08

Como o Habeas Corpus impetrado pela defesa da advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB), não pedia apenas que ela ficasse em casa, mas também a revogação da detenção provisória, e levando em conta que o caso ainda está sob discussão, o Superior Tribunal de Justiça errou ao determinar a perda de objeto da ação constitucional da ex-primeira dama.

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Gilmar decidiu que STJ se precipitou ao extinguir HC contra a mulher de Cabral.
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Esse foi o entendimento do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes ao conceder, nesta quinta-feira (27/4), a ordem em HC impetrado pelo criminalista Luís Guilherme Vieira e sua equipe, do escritório Luís Guilherme Vieira Advogados Associados, e pelo time do Evaristo de Moraes Advogados. A decisão cassa o acórdão da 6ª Turma do STJ e determina que a seção retome o julgamento do recurso de Adriana.

Após a mulher de Cabral ser presa preventivamente no dia 6 de dezembro, Vieira impetrou HC no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES). Na ação, o advogado pediu que ela respondesse em liberdade. Subsidiariamente, ele requereu que a ela fossem aplicadas medidas cautelares alternativas, que Adriana fosse recolhida a sala de Estado Maior, por ser advogada, ou que cumprisse prisão domiciliar, por ter filho menor de 12 anos.

No entanto, a 1ª Turma do TRF-2 negou o pedido. De acordo com a corte, há indícios de que a mulher de Cabral continuou praticando crimes e atrapalhando as investigações após seu marido ser preso.

A defesa, então, foi ao STJ. Luís Guilherme Vieira pediu que, liminarmente, ela cumprisse a prisão preventiva em regime domiciliar. No mérito, ele requereu a revogação da detenção provisória.

“Além de os argumentos utilizados para tentar justificar a prisão preventiva serem absolutamente vagos, percebe-se que a decisão vem carregada de questões ideológicas, lastreadas em íntima convicção, permeada de situações estranhas à Lei Processual Penal, enfim, traduzindo-se absolutamente inconstitucional/ilegal”, sustentou na peça. Mas a ministra Maria Thereza de Assis Moura, relatora do caso no STJ, negou a liminar.

Enquanto o mérito do HC não era avaliado, o juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, Marcelo Bretas, aceitou pedido da defesa e permitiu que ela aguardasse o julgamento em sua casa.

Por isso, Maria Thereza julgou o HC prejudicado, alegando que ele havia perdido seu objeto. Vieira, então, interpôs Agravo Regimental, sem sucesso. A 6ª Turma do STJ seguiu o entendimento da relatora.

Porém, o advogado de Adriana Ancelmo contestou esse acórdão no STF. A seu ver, os ministros erraram ao extinguir o HC, pois o pedido principal dele – a revogação da prisão preventiva – não havia sido analisado. E, como Vieira ressaltou à ConJur, a ex-primeira dama do Rio permanece presa – e com condições mais rigorosas do que as dos demais acusados da operação “lava jato” que estão em detenção domiciliar.

“Não conheço, na ‘lava jato’, alguém que vá para a prisão domiciliar com medidas restritivas tão graves quanto as dela. Essa medida cautelar [impedindo internet e telefone no apartamento de Adriana] impõe pena a terceiros que não são réus – como as crianças e os empregados da casa. Se quiserem mandar uma mensagem para um amigo, os filhos dela têm que descer até a portaria. Já outros que estão em prisão domiciliar não têm essas restrições. O Flávio Godinho (ex-executivo da EBX), por exemplo, está detido em casa e tem o direito de se comunicar, só que o telefone dele fica grampeado”, criticou o criminalista.

Erro do STJ
Gilmar Mendes concordou com a defesa de Adriana Ancelmo. “Com a devida vênia, houve erro de avaliação na decisão da Corte Superior”, apontou o ministro. Segundo ele, o despacho de Marcelo Bretas que autorizou a prisão domiciliar não contém novos argumentos para fundamentar a detenção preventiva. Assim, para Gilmar, o STJ não estaria “saltando sobre a competência” do TRF-2 ao continuar a analisar o HC.

Até porque a ação constitucional não pedia apenas que a mulher de Sérgio Cabral respondesse ao processo em casa, destacou o ministro, citando os pedidos de revogação da prisão provisória ou substituição dela por medidas cautelares alternativas.

O magistrado também lembrou que a decisão que autorizou a prisão domiciliar não está preclusa. Isso porque o Ministério Público Federal recorreu dela, e a 1ª Turma do TRF-2 aceitou o pedido do órgão nesta quarta-feira (26/4). Logo, a matéria segue em discussão.

Dessa maneira, Gilmar Mendes pulou o pedido de liminar e concedeu direto a ordem do HC, para cassar o acórdão da 6ª Turma do STJ e determinar que os ministros dessa seção voltem a avaliar o Habeas Corpus.

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Para Vieira, STJ irá verificar ilegalidade na prisão de Adriana Ancelmo.

Na visão de Luís Guilherme Vieira, a seção do STJ agora poderá ver que “nunca houve nenhum fundamento para a decretação da prisão preventiva” de Adriana Ancelmo. “Não houve, por parte dela, nenhum movimento para atrapalhar as investigações, constranger testemunhas. Não houve nada que pusesse em risco a ordem pública. Prisão preventiva não pode ser aplicação antecipada da pena”, opinou o criminalista à ConJur.

Virada de última hora
Após o desembargador do TRF-2 Abel Gomes recuar de sua decisão de mandar Adriana Ancelmo imediatamente de volta para a penitenciária em Bangu, ela aguardará em liberdade o julgamento dos Embargos Infringentes que sua defesa apresentará contra o acórdão da 1ª Turma da corte.

O julgamento teve dois votos para aceitar o recurso do Ministério Público e revogar a prisão domiciliar de Adriana, dos desembargadores federais Abel Gomes e Paulo Espírito Santo, e um contra, do desembargador federal Ivan Athié. Como o placar não foi unânime, cabem Embargos Infringentes, como disposto no artigo 609 do Código de Processo Penal. Até que esse recurso seja julgado, a decisão não pode ser executada.

Mas o relator do caso, Abel Gomes, determinou no fim da audiência desta quarta que Adriana voltasse imediatamente para a prisão. Contudo, Luís Guilherme Vieira, ao término da sessão, apontou para o desembargador federal que tal recurso possui efeito suspensivo.

Horas depois, o magistrado voltou atrás e determinou que a advogada só poderá voltar para a penitenciária após o julgamento do recurso.

Desvio de dinheiro
Sérgio Cabral foi preso preventivamente em 17 de novembro. O político foi alvo de dois mandados de prisão preventiva, um expedido pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, e outro pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba.

A ação em conjunto no Rio e em Curitiba tinha como objetivo aprofundar investigações sobre um esquema que envolvia o pagamento de propinas para a execução de obras públicas no estado, como a reforma do Maracanã e a construção do Arco Metropolitano, e posterior ocultação desses valores. Segundo o MPF, a organização criminosa envolve dirigentes de empreiteiras e políticos de alto escalação do governo do Rio de Janeiro. Cabral seria o líder do esquema. O prejuízo estimado é superior a R$ 220 milhões.

Duas semanas depois, Adriana Ancelmo também foi encarcerada. Sua prisão preventiva se baseou na suspeita de que ela tenha usado seu escritório de advocacia para lavar dinheiro repassado por empresas que conseguiram isenção fiscal junto ao Executivo fluminense durante a gestão do peemedebista. Isso fez com que a seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil suspendesse por 90 dias o registro profissional dela.

Cabral já é réu em sete ações penais.

Clique aqui para ler a decisão de Gilmar Mendes.

Clique aqui para ler o pedido de HC.

HC 142.993

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