Ecos do passado

Nenhuma das 26 denúncias do MPF sobre
a ditadura militar teve sucesso na Justiça

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25 de abril de 2017, 8h23

Cinco anos depois que procuradores da República começaram a tentar responsabilizar agentes da ditadura militar ainda vivos por supostas violações de direitos humanos, 24 denúncias ajuizadas pelo país foram rejeitadas, trancadas ou suspensas e 2 aguardam decisão do juízo de primeiro grau. A maioria não teve sucesso porque a Justiça brasileira considerou os crimes prescritos ou cobertos pela Lei da Anistia, de 1979.

É o que aponta relatório divulgado nesta segunda-feira (24/4) pelo Ministério Público Federal, com resumo das atividades desde 2012. As denúncias, segundo o documento, envolvem 47 agentes do Estado (como militares, delegados de polícia e peritos) acusados de tortura, sequestro, homicídio, ocultação de cadáver e falsificação de laudos envolvendo 37 vítimas.

Entre os nomes envolvidos estão Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como major Curió — que atuou no combate à Guerrilha do Araguaia — e do coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou o DOI-Codi do II Exército — mas morreu em 2015, depois das denúncias, tendo a punibilidade extinta.

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MPF afirma que crimes praticados por agentes do Estado durante regime militar são permanentes ou imprescritíveis.

Os processos tramitaram originalmente em varas federais do Pará, de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Goiás. Dezoito foram rejeitados logo em primeiro grau.

Outras seis ações penais chegaram a ser abertas em primeira instância, mas sofreram revés em Tribunal Regional Federal ou no Supremo Tribunal Federal — a ministra Rosa Weber e o ministro Teori Zavascki suspenderam o andamento de três casos, porque a corte já definiu que a Lei da Anistia vale para todos os crimes políticos e conexos entre 1961 e 1979 (ADPF 153). Há pelo menos quatro recursos aguardando resposta no Superior Tribunal de Justiça.

O MPF tentava emplacar a tese de que as condutas imputadas são crimes contra a humanidade, que o Direito Internacional considera imprescritíveis. No caso de desaparecidos, como o deputado federal Rubens Paiva, o argumento é que o crime de sequestro é permanente, pois os corpos nunca foram encontrados.

A terceira justificativa usada é que, em 2010, o Brasil foi condenado pela Corte Americana de Direitos Humanos a apurar e denunciar atos ilícitos durante o regime militar (caso Gomes Lund, sobre a Guerrilha do Araguaia). Para o MPF, o Judiciário brasileiro “tem se revelado, em geral, refratário em reconhecer o caráter vinculante da decisão da Corte internacional”.

Trabalho voluntário
Pelo menos desde 2011, com a criação do Grupo de Trabalho Justiça de Transição, procuradores da República passaram a remexer documentos, ouvir testemunhas, analisar jornais, consultar relatórios da Comissão Nacional da Verdade e até solicitar interceptações telefônicas. Foram grampos que fizeram o MPF constatar ter identificado o caseiro da chamada Casa da Morte, que teria sediado torturas em Petrópolis (RJ).

Segundo a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF — que acompanha casos criminais—, “todas as investigações dos casos são feitas pelos procuradores, sem prejuízo de suas atribuições regulares, isto é, concomitantemente ao trabalho regularmente desenvolvido nas respectivas Procuradorias”.

O relatório cita 27 denúncias, porque inclui na conta uma ação penal que foi enviada à Justiça comum de Goiás, mas retornou depois à Justiça Federal em Rio Verde (GO), com outro número.

O documento afirma ainda que o Superior Tribunal Militar e o Exército colocaram obstáculos às apurações, principalmente nas investigações sobre o caso Riocentro, em 1981, numa tentativa de atentado a bomba durante show em comemoração ao Dia do Trabalho.

Apesar da falta de sucesso nos tribunais, o MPF diz ter sido vitorioso “no reconhecimento público" das denúncias e promete que “essa história ainda não acabou”.

Clique aqui para ler o relatório Crimes da Ditadura Militar.

 

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