Raio-X da reforma

Para advogadas, Justiça do Trabalho causa insegurança em acordos

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22 de abril de 2017, 14h02

Um dos temas mais polêmicos da reforma trabalhista é a possibilidade de acordos coletivos entre empregados e empregadores terem força de lei. A medida é vista como alternativa para a discussão de temas como carga horária, plano de cargos e salários, trabalho remoto e banco de horas.

Pamela Mota, do Rayes & Fagundes Advogados Associados, afirma hoje haver "enorme insegurança jurídica" em celebrar acordos coletivos por causa dos efeitos de um possível questionamento na Justiça do Trabalho. Ela conta que, em alguns casos, empresas recusam propostas de acordo coletivo por medo de futuras decisões judiciais.

Essa reforma, diz Maria Pellegrina, ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região e sócia do Pellegrina & Monteiro Advogados, é um ponto de partida para as mudanças das relações de trabalho que vão culminar na alteração de pensamento da sociedade e na maneira que as relações de trabalho são vistas.

“Se o acordado sobre o legislado não passar, não vamos mudar nada”, afirma a advogada. Ela acrescenta haver resistência de sindicatos, que temem perder arrecadação com mudanças na regra de contribuição sindical. “Estamos cansados de saber que existe sindicato de papel”, critica Maria Pellegrina. Porém, ela diz que as entidades sindicais podem se fortalecer com a aglutinação de categorias, o que fortalecerá o poder de barganha.

Sobre a alegada precarização das relações de trabalho, Gláucia Massoni diz que a flexibilização pode ser benéfica, desde que se se garantam os direitos do trabalhador. “A Justiça tem que colocar na cabeça que os empregados são tão informados que o empregador. O hipossuficiente atual não é aquele da década de 1940.”

“Temos essa cultura de que capital e força de trabalho são forças antagônicas, quando na verdade são forças que precisam caminhar juntas. Não somos inimigos”, complementa Pamela Mota.

A advogada elogia a punição prevista ao trabalhador que faltar à audiência injustificadamente. Se aprovada a mudança, a pessoa que faltar deverá pagar as custas processuais. “Hoje, raramente o empregado é condenado”, diz.

Alternativas
A Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo aproveitou o debate e apresentou propostas para amenizar o que pensam ser excessos do PL 6.787/2016. Entre as medidas estão a extinção paulatina da contribuição sindical, ao invés de ser feita de forma abrupta.

“O fruto da arrecadação deste dinheiro é muito importante para os sindicatos que desenvolvem um trabalho social e jurídico fundamental. Logo, sua extinção abrupta irá gerar muitos problemas”, justifica a entidade.

Sobre terceirização, a entidade sugere que a responsabilidade das contratantes desses serviços seja solidária, e não subsidiária, como prevê o projeto atual. Essa mudança, segundo a AATSP, evitará que sejam criadas companhias de fachada para simular terceirizações.

A entidade também propõe que a criação de novos sindicatos seja limitada por meio de um grupo de trabalho a ser criado pare rever e organizar o quadro de atividades e profissões de definidos pelo artigo 577 da CLT. Também citam que a formação de um sindicato específico de uma parcela da categoria deve oferecer “possibilidade de vida associativa regular e de ação sindical eficiente”.

Entidades trabalhistas contra
Na quarta-feira (19/4), foi aprovado o regime de urgência na tramitação da reforma trabalhista (Projeto de Lei 6.787/2016). A apresentação de emendas termina na segunda-feira (24/4) e a medida será votada no dia 26 de abril.

A mudança na tramitação irritou a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). “O substitutivo apresentado pelo deputado Rogério Marinho desnaturou totalmente o projeto original, que já era prejudicial para o Direito do Trabalho. A urgência é um verdadeiro açodamento, que compromete o processo democrático”, criticou o presidente da entidade, Germano Siqueira.

Especificamente sobre as mudanças pretendidas, a Anamatra as considera ruins, pois inverteriam “os princípios e das finalidades do Direito do Trabalho”, segundo Siqueira. “O que se pretende agora, sem autorização constitucional, é inverter essa proteção, blindando o economicamente mais forte em detrimento do trabalhador”, disse.

Ele critica a retirada de trechos que garantiam direitos dos trabalhadores, como a reformulação do artigo 468 da CLT, que trata da alteração em contratos de trabalho de quem ocupa cargos de confiança.

Para ele, a mudança interfere na jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, que assegura estabilidade econômica aos empregados que percebem função comissionada por mais de dez anos. “A nova redação simplesmente extingue esse direito", alerta.

Ele também critica dispositivo que impõe ao trabalhador o pagamento de honorários periciais, mesmo em casos de Justiça Gratuita. “Nunca se viu nada parecido. Como também é completamente descabido se falar em quitações anuais do contrato de trabalho (art.507-B) quando o trabalhador está em pleno regime de subordinação. Enfim, trata-se de uma proposta que atende apenas a um dos interessados nessa complexa relação capital versus trabalho”, critica.

Já o Ministério Público do Trabalho publicou uma moção de repúdio à reforma trabalhista. Na nota, o MPT afirma que as propostas do projeto analisada na Câmara dos Deputados “representam um vergonhoso retrocesso social no trato das relações de trabalho no Brasil”. Diz ainda que essa mudanças pretendidas violam normas de trabalho definidas pela Organização Internacional do Trabalho.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil também é contra a reforma. Seu presidente, Claudio Lamachia, disse que o PL é um erro e um retrocesso, pois seria uma “proposta de aniquilamento da legislação trabalhista protetiva, destinada a criar subclasses de trabalhadores com poucos direitos, contratos precários e remunerações indignas”.

“Aprovar uma reforma trabalhista controversa, de modo açodado, significa assumir o risco de esfacelar completamente a solidez das instituições e os direitos conquistados pela cidadania, a duras penas, nas últimas décadas”, acrescenta Lamachia, ao criticar a adoção do regime de urgência.

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