Sem interesse

Lei de Acesso não permite obter dados bancários de concorrente estrangeiro

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3 de abril de 2017, 6h50

O direito de acesso a informações sobre a concorrência perante a Administração Pública não é absoluto nem alcança os dados cobertos por sigilo, principalmente quando não demonstrada a existência de interesse que o justifique. Assim, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve, na íntegra, sentença que livrou o Banco Central do Brasil de passar à Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil informações sobre empresas estrangeiras que operam no mercado interno de bebidas.

A associação pretendia obter dados referentes à remessa de lucros e dividendos ao exterior, nos últimos 10 anos, de empresas que exploram as atividades econômicas de fabricação de malte, cervejas, chopes, águas envasadas, refrigerantes e outras bebidas não alcoólicas. Fundamentou seu pedido no direito constitucional de acesso à informação, regulamentado pela Lei 12.527/2011.

Incentivos fiscais
Segundo a inicial, o pedido se justifica na medida em que “gigantes transnacionais” usufruem de benefícios e incentivos fiscais em território brasileiro. Ofereceu como exemplo uma fábrica estrangeira que teria conseguido isenção de ICMS quase total para se instalar no estado do Amazonas, num caso que está sendo discutido no Supremo Tribunal Federal.

“Nada mais justo do que possibilitar à sociedade brasileira uma contraprestação, com o mero disponibilizar de informações relativas à remessa de lucros auferidos no Brasil para o exterior, para que a sociedade possa ter ciência da destinação dos lucros obtidos no setor de bebidas no Brasil”, argumentou a associação.

A juíza-substituta Fernanda Bohn, da 1ª Vara Federal de Guarapuava (PR), observou que o artigo 22 da Lei 12.527/2011 não exclui as hipóteses legais de sigilo e de segredo justiça, nem de segredo industrial. Destacou, também, que a Lei Complementar 105/2001, que trata do sigilo das operações de instituições financeiras, impõe ao Banco Central sigilo sobre as informações obtidas no exercício de suas atribuições.

Além disso, acrescentou a juíza, o Código Tributário Nacional (artigo 98) diz que a Fazenda Pública não pode divulgar informações obtidas “em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades”. A exceção fica por conta de requisição por autoridade judiciária ou solicitação de autoridade administrativa, desde que no interesse da Administração Pública.

Sem interesse
No caso, a juíza não viu a existência de interesse particular ou coletivo que justifique a apresentação dos dados requeridos. A seu ver, o simples fato de receber benefícios ou incentivos fiscais do Poder Público não gera o dever indiscriminado de prestação de contas acerca dos lucros ou dividendos por parte das empresas que exploram tal atividade econômica, ante a ausência de previsão legal neste sentido.

“É fato público e notório que são poucas as companhias transnacionais de grande porte que atuam no ramo de atividade econômica referido pela requerente. Outrossim, acolhendo os argumentos trazidos em contestação pela parte ré, tenho que, em sendo deferida a apresentação dos dados requeridos, estaria se autorizando, por via transversa, a quebra individual dos sigilos bancário, fiscal e industrial de empresas regularmente constituídas”, registrou na sentença.

Na apelação ao TRF-4, desembargadora Vivian Pantaleão Caminha, relatora, destacou que o pedido da inicial é genérico, além de não demonstrar a “relação de pertinência” com os objetivos e finalidade do estatuto da associação. De outra parte, pontuou, não é imprescindível à  autora o conhecimento sobre a destinação dos lucros obtidos por estas empresas — se mantidos no país ou remetidos ao exterior.

“O dever de prestação de contas de empresas beneficiárias de incentivos fiscais deve ser cumprido em face de órgãos específicos, a quem incumbe exercer a fiscalização e adotar as medidas cabíveis na hipótese de cometimento de irregularidade ou infração à lei”, encerrou a relatora em seu voto.

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