Igualdade de gêneros

Mulheres ainda precisam de ações afirmativas na política, diz Luciana Lóssio

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23 de setembro de 2016, 17h26

Apesar de a Constituição da República afirmar que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, o Brasil ainda não conseguiu transpor do plano teórico para o prático a igualdade representativa de gêneros. "Por tal razão, debater igualdade de gênero, no Tribunal da Democracia — como é conhecido o Tribunal Superior Eleitoral — é de vital importância para o nosso jovem regime democrático", afirma a ministra Luciana Lóssio, do TSE.

Nelson Jr./ASICS/TSE
Ministra lembrou que Brasil ocupa a 155ª colocação no ranking mundial de representação feminina no Parlamento.
Nelson Jr./ASICS/TSE

Ela aproveitou o julgamento de uma ação para defender que o tribunal avance nessa questão. O caso analisado foi um recurso do Partido Progressista, que foi condenado a perder 10 minutos das inserções estaduais de propaganda partidária em rádio e TV, por desrespeitar o percentual mínimo de 10% destinado à promoção da atuação das mulheres, conforme estabelece o artigo 45, IV, da Lei 9.096/95.

Antes de entrar no mérito da questão, a ministra abordou a realidade brasileira e a evolução da legislação brasileira. De acordo com ela, de 1995 até minirreforma eleitoral, em 2015, houve uma evolução na legislação brasileira, a fim de assegurar e estimular a participação feminina. Para Luciana Lóssio, agora é "de a Justiça Eleitoral também contribuir e interpretar tais normas, de modo a garantir a sua máxima eficácia".

Como proposta para dar esta eficácia, a ministra votou para que o tempo cassado do partido seja utilizado pela Justiça Eleitoral para promover propaganda institucional destinada a incentivar a participação feminina na política.

"Infelizmente, as mulheres ainda necessitam de políticas afirmativas para alcançar a igualdade de gênero, objetivando eliminar as desigualdades historicamente acumuladas", afirmou a ministra. De acordo com ela, foi exatamente esse o objetivo do artigo 45, inciso IV, da Lei 9.096/95, ao obrigar o partido a destinar, na propaganda partidária gratuita, um tempo mínimo para incentivar e encorajar a participação política das mulheres.

"A igualdade de gênero é um tema caro para a Justiça Eleitoral, devendo ser obrigatoriamente cumprido pelos partidos políticos, porquanto fundamental para o fortalecimento da democracia, que tem a igualdade como um dos pilares do Estado Democrático de Direito", complementou a ministra.

Cálculo da sanção
Em seu voto Luciana Lóssio entendeu, ainda, que não importa se o partido cumpriu parcialmente a norma na veiculação das inserções. De acordo com a ministra, o cálculo da penalidade deve incidir sobre a integralidade do tempo deveria ter sido destinado à propaganda afirmativa em favor da participação feminina na política.

"Se o partido tem direito a veicular propaganda partidária gratuita, devendo reservar pelo menos 10%, repita-se, pelo menos 10%, para promover e difundir a participação da mulher no cenário político, e não o faz, a referida propaganda é ilícita! Ou seja, o ilícito corresponde ao tempo total que deveria ter sido observado pela legenda para o cumprimento da regra", afirmou.

Na visão da ministra, na atual conjuntura, em que se busca uma maior participação das mulheres na política, a relativização da sanção significaria um esvaziamento da essência da lei. Luciana Lóssio explica que a Lei 12.034/2009, ao incluir que os partidos devem observar o mínimo de 10% da propaganda partidária no rádio e na televisão para promover e difundir a participação política feminina, buscou certamente corrigir, ou pelo menos atenuar um déficit histórico e secular de sub-representação feminina que existe na política brasileira.

"Daí a importância de conferirmos uma interpretação sistemática ao inciso IV do artigo 45 da Lei dos Partidos Políticos e, por conseguinte, sermos rigorosos na aplicação da sanção prevista no artigo 45, § 2º, II", concluiu.

Panorama geral
Ao apresentar um panorama da participação feminina na política brasileira, a ministra classificou como inadmissível o fato de o Brasil, apesar de ser uma das 10 maiores economias do mundo, ocupar a 155ª colocação no ranking mundial de representação feminina no Parlamento, com apenas 9,9% de mulheres na Câmara dos Deputados, estando atrás de países que tradicionalmente renegam direitos à mulher, como Arábia Saudita, Iraque e Índia.

A ministra ressaltou ainda que as mulheres representam 52,13% do eleitorado, e que pela primeira vez na história elas são maioria em todos os estados da federação. Luciana Lóssio afastou ainda o argumento de que a falta de participação das mulheres na política é por falta de filiadas. Segundo dados do TSE apresentados por ela, a média de mulheres filiadas aos 35 partidos políticos hoje existentes é de 44,21%.

Ela lembrou, ainda, que o Poder Legislativo, dos três poderes da república, foi o único a nunca ser presidido por uma mulher, que dos 26 Estados e o Distrito Federal, apenas um deles é chefiado por mulher, e que, de todas as capitais de estado, apenas uma delas é liderada por uma prefeita.

Por fim, a ministra apresentou estudos realizados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) que demonstram que os países nórdicos (Islândia, Finlândia, Noruega, Suécia e Dinamarca) ocupam justamente as cinco primeiras colocações no que toca ao índice global de desigualdade entre gêneros, e que os países com maior índice de desenvolvimento humano (IDH) são aqueles que possuem considerável representação feminina, por ser uma sociedade mais igualitária.

Clique aqui para ler o voto.
REspe 126-37.2015.6.21.0000

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