"Lava jato"

MP já demonstrou que denúncia contra Lula é inviável, afirma Roberto Batochio

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21 de setembro de 2016, 13h13

A própria autodenominada "força tarefa" da operação "lava jato", mais do que a defesa, já se incumbiu de demonstrar a improcedência da acusação e inviabilidade da denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A afirmação é do advogado José Roberto Batochio, um dos responsáveis pela defesa de Lula.

O ex-presidente foi denunciado na última quarta-feira (14/9) pelo Ministério Público Federal, sob acusação de ter chefiado todo o esquema investigado pela operação “lava jato”, supostamente praticando os crimes de corrupção passiva qualificada e lavagem de dinheiro.

Durante a coletiva de imprensa para anunciar a denúncia, os promotores afirmaram também que Lula seria o verdadeiro dono de um tríplex do Guarujá (SP) e também teria se beneficiado de um contrato ideologicamente falso de armazenagem, firmado pela OAS com a empresa Granero, que teria o objetivo de guardar bens do seu acervo pessoal. 

Além de Lula, foram acusados nesta denúncia sua mulher, Marisa Letícia; José Adelmário Pinheiro Filho, ex-presidente da construtora OAS, e Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. A denúncia foi aceita pelo juiz Sergio Moro nesta terça-feira (20/9)

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o advogado de Lula rebateu as acusações e indicou os argumentos que a defesa deve apresentar ao juiz Sergio Moro, ressaltando, contudo, que não se trata de antecipação da defesa técnica. Para Batochio, os próprios promotores, ao apresentarem à imprensa os argumentos da denúncia, demonstraram sua inviabilidade processual. 

"Declarando-se 'sem provas' mas tocados por muita 'convicção' (como se convicção de partes no processo fosse elemento probatório ou servisse de fundamento de decisão judicial), os impertérritos Acusadores imputam ao ex-Presidente Lula dois fatos que configurariam um rosário de crimes e, também, o promoveriam à condição de 'comandante máximo', 'general', 'maestro' de um suposto esquema de corrupção que envolveria a Petrobras e o Governo", diz Batochio.

Esses foi fatos seriam: 1) vantagem ilícita consubstanciada na diferença de valor do preço de um apartamento “tríplex” no Guarujá, bem como nas benfeitorias incorporadas a esse imóvel; 2) patrocínio financeiro ao Instituto Lula para custeio das despesas de transporte e armazenamento do acervo pessoal do ex-presidente da República.

Para o advogado, contudo, essas afirmações são se sustentam. Batochio volta a negar que Lula seria o proprietário do imóvel. Para confrontar a convicção dos acusadores, Batochio cita o registro no Cartório de Imóveis, que tem fé-pública, e mostra que o imóvel é de propriedade da Construtora OAS, por transferência de domínio que lhe fez a Bancoop, titular original do domínio e incorporadora do edifício.

Batochio volta a afirmar que o que ocorreu no caso do tríplex foi que a mulher de Lula, Marisa Letícia, subscreveu uma quota para futura aquisição do imóvel em 2005. Porém, quando o edifício ficou pronto, Marisa não se interessou mais pelo tríplex e solicitou o resgate em dinheiro. Como não recebeu à vista como deveria, ingressou com uma ação judicial, ainda em trâmite, para ser ressarcida.

"Simples assim e comprovado através de documentos oficiais de cartório de registro imobiliário e de autos judiciais. Como, então, se denunciar não por fatos e indícios idôneos, mas simplesmente pela “convicção” de que o apartamento que nunca lhe pertenceu, lhe pertence?", questiona o advogado.

Sobre o custeio do transporte e armazenamento do acervo presidencial, Batochio alega que o beneficiado não seria o ex-presidente Lula, mas o patrimônio cultural brasileiro. Batochio cita o artigo 3º da Lei 8.394/1991 e o artigo 3º do Decreto 4.344/2002, que afirmam os acervos privados dos presidentes da República integram o patrimônio cultural brasileiro, sendo declarados de interesse público.

"Trata-se, pois, de acervo que constitui o 'patrimônio cultural brasileiro', seu proprietário não é o ex-presidente Lula — mero guardião — mas o povo, pelo que cabe ao poder público a sua conservação e preservação, conforme manda o artigo 216, § 1º, da Constituição da República", afirma Batochio.

Comandante máximo
Sobre a acusação de que Lula seria o "comandante máximo do esquema de corrupção" na Petrobras e em outros órgãos públicos, Batochio diz que o fato de o presidente comandar o Poder Executivo não o torna "onisciente e sabedor" do que ocorre nos escalões inferiores da administração. "Assim como o comandante máximo do Judiciário, do Ministério Público ou da Advocacia não têm permanente e completo conhecimento funcional de absolutamente tudo que se passa na base da pirâmide estrutural das respectivas instituições", explica.

O advogado também rebate o argumento de que Lula escolhia os ocupantes de cargos elevados na Petrobras para viabilizar o que chamam de "governabilidade corrompida". O advogado destaca que a Constituição determina que compete ao presidente da República preencher aqueles cargos que a própria lei prevê como de sua exclusiva atribuição.

Apesar de ser um ato próprio do presidente, Batochio explica que essas escolhas não acontecem de forma solitária, sendo precedidas de audiências com áreas técnicas e outros setores afetos à vaga. "Só não conhecem tais mecanismos os que nunca tiveram experiência no trato com a Administração, é claro. Daí, porém, à responsabilização penal por eventuais desvios futuros que venham a praticar os nomeados nos postos de média ou baixa hierarquia vai uma distância oceânica!"

Sobre uma possível amizade entre Lula e Léo Pinheiro, da OAS, Batochio afirma que faz parte do cargo de presidente receber o diretor de uma das maiores empresas brasileiras. "Estranho seria um governo que não tivesse interlocução com a iniciativa privada, com os setores da produção e com estes não discutisse políticas públicas de desenvolvimento, crescimento, abastecimento e quejandos".

Espetáculo midiático
Na entrevista, Batochio criticou que considerou um "espetáculo midiático" do Ministério Público Federal que convocou a imprensa para apresentar a denúncia. Para o advogado, o objetivo era tentar cooptar a opinião pública e formar base às pretensões punitivas.

Porém, no dia chamou a atenção o fato de os acusadores afirmarem em alguns casos que não teriam provas cabais e utilizarem, por diversas vezes, o termo "convicção" para fazer a denúncia. Muitos passaram a afirmar que a "lava jato" não tem provas contra, mas tem convicção. Diante da repercussão negativa, os promotores afirmaram que suas afirmações foram deturpadas e que havia provas contra o ex-presidente.

Para Batochio, "se não tivessem denunciado pela televisão, mas se limitado a fazê-lo no ambiente sereno e austero do foro, não correriam o risco de terem suas assertivas afirmações, plasmadas em ardente convicção, deturpadas pela opinião pública que, precisamente, desejavam atrair". 

O advogado falou ainda sobre o peso de uma delação premiada no conjunto de provas. "A confiabilidade da delação premiada, já se disse, é a expressão máxima da credibilidade mínima", afirmou. Segundo ele, é quase irresistível a proposta, quando se está preso ou em vias de, e quando surgem ameaças que a situação pode atingir sua família.

"Mas a delação mendaz se confronta com a implacabilidade da realidade empírica, fricção esta de que é exemplo o desmentido que Paulo Roberto Costa faz da “delação” de Pedro Correa: este, afirma que Lula falava com Paulo Roberto sobre assuntos da Petrobras, ao passo que aquele já depôs, várias vezes, e nega peremptoriamente, esse diálogo com o ex-Presidente. O mesmo se passa com Delcídio. Podem duas assertivas contrárias serem verdadeiras a um só tempo? Não. Uma será falsa, fatalmente".

*Título alterado às 13h40 do dia 21 de setembro de 2016.

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