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MPF determina abertura de inquérito contra ex-delegado e blogueiro

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19 de setembro de 2016, 22h39

O ex-deputado e ex-delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz e o blogueiro Paulo Henrique Amorim serão investigados por suspeita de ter usado meios de comunicação social para pressionar juízes a tomar decisões prejudiciais ao banqueiro Daniel Dantas durante as operações chacal e satiagraha. Por decisão unânime da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, um inquérito para apurar as denúncias feitas contra os dois pelo banqueiro deverá ser aberto. A decisão é desta segunda-feira (19/9).

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A primeira representação contra a dupla foi feita em abril de 2014 ao Supremo Tribunal Federal, porque na época Protógenes era deputado federal pelo PCdoB de São Paulo. A petição é assinada pelo advogado Nabor Bulhões, também autor da tese que embasa a petição.

De acordo com a representação, Protógenes, que conduzia as operações, combinava com o blogueiro Paulo Henrique Amorim, a quem Nabor chama de “jornalista de aluguel ou mercenário do jornalismo”, a publicação de informações, nem sempre verdadeiras, para influenciar juízes a tomar decisões desfavoráveis a Dantas. Com isso, diz a peça, os dois beneficiariam o empresário Luís Roberto Demarco, adversário de Dantas no mercado financeiro e com quem disputava o controle acionário da Brasil Telecom.

Essa disputa foi o que virou alvo da operação satiagraha. Ela nasceu da operação chacal, que supostamente descobriu práticas de espionagem industrial da empresa Kroll contra a Telecom Italia, na época da disputa pelo controle da BrT. Daí veio  a satiagraha, que passou a focar em denúncias de crimes financeiros cometidos por Dantas na disputa.

Divulgação
Luís Roberto Demarco, investigado por crimes cometidos durante as investigações da satiagraha

Hoje, Protógenes, Paulo Henrique Amorim e Demarco são investigados sob a suspeita de terem montado a operação para atender a interesses financeiros de empresas envolvidas na briga pela BrT, notadamente a Telecom Italia.

Publicidade opressiva
Nabor Bulhões chamou a prática pela qual acusa Protógenes e Paulo Henrique Amorim de “publicidade opressiva”. É o uso de meios de comunicação de massa para influenciar o exercício da jurisdição em desfavor de alguém.

A proposta do advogado é que a prática seja incluída no artigo 344 do Código Penal, que descreve o crime de “coação no curso do processo”: “Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral”.

Ele pretendia discutir a questão no Supremo, mas, como o ex-delegado não foi reeleito deputado, o caso foi enviado para a 10ª Vara Federal Criminal de Brasília. Lá, a Procuradoria da República no Distrito Federal pediu o arquivamento, por entender que a tese de Nabor não poderia ser incluída no artigo 344 do CP. O juiz que preside o inquérito, Vallisney de Souza Oliveira, discordou do pedido. Para ele, as acusações são substanciosas e a tese, sólida, que precisa ser discutida.

Com base no artigo 28 do Código de Processo Penal, Vallisney enviou o caso à Procuradoria-Geral da República, que determinou a discussão pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão. É um colegiado incumbido de rever as atividades do MPF em matéria criminal, exceto em casos de corrupção e de controle da atividade policial e do sistema prisional.

Nesta segunda, a câmara, por unanimidade, concordou com Vallisney e determinou que seja instaurado inquérito para apurar o caso. O colegiado é composto pela subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen e pelos subprocradores José Adonis de Araújo Sá e Juliano Villa-Verde de Carvalho.

Alvos
De acordo com a petição enviada ao STF em 2014, a publicação de “ataques” a magistrados, “sobretudo em véspera de julgamentos relevantes, mostra que não se trata de fenômeno isolado”. Para Nabor Bulhões, a parceria entre Protógenes e Paulo Henrique Amorim, dono do blog Conversa Afiada, é um “plano deliberado para constranger e influir na administração da Justiça nos casos em que o peticionário [Dantas] figura como parte ou interessado”.

Ueslei/SCO/STF
Gilmar Mendes, o principal alvo de Protógenes e Paulo Henrique Amorim, segundo a representação de Dantas

O principal alvo da dupla, segundo Nabor, foi o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo à época das duas operações. Em julho de 2008, o juiz federal Fausto De Sanctis condenou Dantas à prisão por causa das acusações feitas pela satiagraha. Uma semana depois, Gilmar concedeu um Habeas Corpus ao banqueiro. E no dia seguinte, De Sanctis decretou nova prisão. A atuação rendeu a De Sanctis uma condenação à pena de censura, pelo Conselho Nacional de Justiça.

No dia 9 de julho, dia da liminar do ministro Gilmar, Amorim publicou que o ministro “governa o Brasil e humilha os brasileiros”, chamando-o de Supremo Presidente e acusando-o de transformar o STF num “balcão de negócios”. Depois, passou a chamar o ministro de Gilmar Dantas, como faz até hoje.

A nova ordem de prisão expedida por De Sanctis contra Dantas foi apelidada pelo próprio Paulo Henrique Amorim de “drible da vaca” no Supremo. E no mesmo dia em que o drible foi consagrado, o blogueiro escreveu: “Os brasileiros repudiam a Justiça de Gilmar Mendes. E se orgulham do juiz De Sanctis, da Justiça Federal de São Paulo, que abriu o disco rígido e prendeu Dantas duas vezes”. Um dia depois, Amorim concluía: “Mendes É o golpe!” (sic).

O primeiro alvo da dupla, diz Nabor, foi a desembargadora Cecília Melo, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Ela era relatora dos processos relacionados à operação chacal e, em janeiro de 2008, concedeu liminar para trancar uma investigação que corria contra Dantas num desdobramento das apurações.

Dez dias depois, o Conversa Afiada publicou que “na Justiça brasileira, tem sido assim: as coincidências sempre dão uma mãozinha a Dantas”. Em novembro, disse que Cecília Melo “tem sido muito gentil com a famiglia Dantas”, em referência as estruturas mafiosas italianas, que se organizavam em famílias – ou famiglia, em italiano. Ao longo de 2009, Amorim continuou a dizer que a desembargadora era gentil com Dantas.

A dupla também atacou, segundo a petição, a ministra Ellen Gracie, ex-presidente do Supremo, e o ministro Arnaldo Esteves Lima, do Superior Tribunal de Justiça. Ellen por ter, em 2005, concedido liminar em Mandado de Segurança proibindo o envio de HDs do Banco Opportunity à CPI dos Coorreios. Arnaldo porque, quando relator dos processos ligados à satiagraha, suspendeu as investigações até que fosse julgada uma exceção de suspeição contra De Sanctis.

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