Suporte a Litígios

Tecnologia serve como aliada na prevenção e no combate à corrupção

Autor

  • Marcelo Stopanovski

    é diretor de produção da i-luminas – suporte a litígios especializada em análise de quebras judiciais de sigilos. Doutor em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília mestre em Inteligência Aplicada na Engenharia de Produção e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.

14 de setembro de 2016, 14h15

Spacca
Na coluna desta quinzena o assunto é a prevenção e o combate à corrupção. Assunto sem dúvida muito comentado, muito destacado na mídia em geral, para o qual a abordagem nesta coluna será sobre a aplicação do paradigma tecnológico como estratégia anticorrupção, basicamente levando a uma maior capacidade de processamento da informação disponível com o viés da transparência e do controle social ou estatal.

Indico que o texto que segue é uma versão adaptada e resumida do publicado nos Cadernos FGV sobre a Lei Anticorrupção [1].

A primeira premissa das considerações é que auditar, fiscalizar, controlar ou investigar são tarefas essencialmente ligadas à capacidade de acesso e processamento da informação. Uma equipe de investigação procurando provas da malversação de recursos públicos somente as encontrará se for capaz de coletar e processar informações.

Da mesma forma, depende do acesso à informação o cidadão que pretende acompanhar a legislatura do deputado eleito ou verificar os gastos com hospedagem do prefeito de sua cidade em viagem a Brasília. Tampouco é diferente da situação de uma empresa eticamente engajada que precisa garantir que os contatos de seus funcionários com autoridades sejam transparentes e auditáveis.

A informação possível de ser coletada, analisada e difundida é, em suma, o fator determinante de qualquer estratégia anticorrupção.

Como já abordamos em colunas anteriores, como as disponíveis aqui e aqui, a produção da informação estratégica, aquela destinada a possibilitar que alguém tome uma decisão, deverá passar por três fases:

i) Coleta: momento inicial em que as informações são reunidas, colocadas em repositórios, armazenadas. Discussões sobre acesso à informação e formato de dados estão intimamente ligadas a esse momento. Não é possível conferir nenhum fato se não for possível acessar informações sobre ele. Lembre-se de uma coluna anterior dobre o assunto ligado à coleta de interceptações telefônicas;

ii) Análise: sobre a informação coletada, parte-se para sua descrição, ligam-se os pontos, produz-se sentido para o contexto específico. A capacidade de se processar volumes de informação será crucial nesta fase, assim como o conhecimento de especialistas. Como exemplo complemento com a coluna anterior sobre análise de documentos e fatos jurídicos disponível aqui; e

iii) Difusão: uma boa análise acaba em uma boa síntese. Trata-se de transformar volumes de dados em visualizações simples, como converter uma planilha em um gráfico, por exemplo. A linguagem compreensível e a facilidade de localização da informação são requisitos para uma boa difusão, além da manutenção da oportunidade pelo atendimento aos prazos temporais. Sobre este assunto veja a tabela do valor da informação nesta coluna.

A segunda premissa do artigo publicado é que uma estratégia anticorrupção abrangente precisa abarcar três aspectos:

i) Combate: a esfera da repressão ao crime propriamente dito. O que já ocorreu deve ser punido como exemplo para dissuasão de condutas. As instituições devem ser capazes de processar e provar os desvios;

ii) Controle social: um dos mais eficazes paradigmas anticorrupção é a transparência. A facilidade de acesso à informação pública permite à sociedade organizada exercer o escrutínio das atividades dos três poderes. O monitoramento social contribui para a prevenção e descoberta de condutas reprováveis e/ou ilícitas; e

iii) Prevenção: engloba a busca por um sistema íntegro de relações sociais, privadas e públicas. Atuação na redução de oportunidades delitivas – a atualização do marco legal, o monitoramento social e o aumento das reflexões éticas são caminhos preventivos por excelência.

O cruzamento dessas duas premissas levou a uma reflexão de aspectos tecnológicos dessa iteração, delimitando cada frente anticorrupção em um aspecto exemplificativo da esfera de atuação da sociedade e da tecnologia da informação utilizada para a construção da solução apresentadas. A tabela abaixo resume estas iterações:

Estratégia anticorrupção

Coleta

Análise

Difusão

Frente

Esfera

Questão tecnológica

Combate

Pública

Interoperabilidade

Grafos

OLAP

Controle Social

Sociedade organizada

Legibilidade por máquina

DataViz

Mashup

Prevenção

Privada

Memória

Ontologia

Groupware

Tabela – Possibilidades de interação entre tecnologia da informação e estratégias anticorrupção.

Como adiantado, esta coluna trata de uma adaptação resumida de algumas questões úteis para nossa reflexão de suporte a litígios. Para este intuito destacarei a questão da interoperabilidade dos dados e da legibilidade por máquina como itens básicos de coleta que possibilitam a construção efetiva dos passos seguintes de análise e difusão dentro da sociedade organizada.

Um desafio tecnológico para a fase de coleta do combate à corrupção é integrar bases de dados. A discussão para avançar nessa integração, na melhoria da facilidade de consultas rápidas sobre o máximo de bases possíveis, está no campo da interoperabilidade dos sistemas. Protocolos de comunicação entre as bases e os sistemas devem ser negociados para fechar o entendimento sobre a informação disponível.

Como exemplo de boa prática no campo da interoperabilidade está o padrão mundial XML – do inglês eXtensible Markup Language – e seus esquemas de definição de dados. Um exemplo no Brasil é o Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias (Simba) da Procuradoria Geral da República, um padrão negociado no âmbito da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA) para troca de dados entre os bancos e as equipes de investigações, assunto abordado aqui na coluna.

A capacidade de integração de bases de dados pode ajudar na construção de sistemas de análise, como o Sistema de Controle de Atividades Financeiras (Siscoaf), que permite a analistas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, analisarem centenas de transações suspeitas por dia, com alta produtividade em um conjunto menor de analistas. A produtividade é impactada positivamente pela integração de diversas bases com informações patrimoniais, que permitem uma visão geral e instantânea para que o analista inicie seu trabalho. Em um exemplo simplificado, a partir de um alarme de informe relativo a um depósito de 200 mil reais feito em uma conta corrente em um banco qualquer, a tela desse sistema apresentará um relatório que integra, dentre outras bases, a Declaração de Informações sobre Atividades Imobiliárias (Dimob), banco de dados da Receita Federal que contém informações sobre as vendas de imóveis no país. Assim, o analista já pode saber que existe um lastro para o depósito efetuado, correspondente à venda de um apartamento, por exemplo.

Outro aspecto do campo da tecnologia aplicada à coleta aparece na Lei de Acesso à Informação, que destaca a importância da disponibilização dos dados públicos em formatos “legíveis por máquina” (Artigo 3º, parágrafo 3º, III). Esse termo indica que a informação só estará realmente disponível para a sociedade se for possível o acesso ao dado bruto em formato de arquivo digital que possibilite a importação por outras ferramentas.

Pensando na interoperabilidade dos dados e no cumprimento de compromissos internacionais da iniciativa Open Government Partnership (OGP), o chamado “Governo Aberto”, o Executivo federal mantém o Portal Brasileiro de Dados Abertos (http://dados.gov.br). Neste local, é possível acessar conjuntos de dados das mais variadas fontes em formatos que podem servir para a construção de visões diferentes das já produzidas pelo próprio governo.

Essas visualizações de dados já estão dentro da fase de análise proporcionada pela capacidade de coleta de informações em formatos legíveis por máquina.

O termo “Visualização de Dados” (Data Viz) agrupa a necessidade de que os volumes de dados sejam mostrados de forma gráfica para facilitar seu entendimento e análise. Os dados brutos passam por um processo de análise que identifica quais visões podem ser utilizadas, sejam simples gráficos de barras ou linhas até infográficos dinâmicos que apresentam estruturas inovadoras acopladas aos dados.

O valor agregado aos dados brutos processáveis pela análise e visualização pela sociedade organizada pode ser percebido nas chamadas Maratonas Hacker (Hackathons). Nestes eventos, desenvolvedores de software se reúnem em torno dos dados, visando à construção de soluções inovadoras.

Estas soluções são, geralmente, construídas por meio de mashup, significando o uso de conteúdo de mais de uma fonte colocado em uma aplicação única; a união de “pedaços” de dados com “pedaços” de aplicações já desenvolvidas. O exemplo clássico, visto que surgiu em uma dessas maratonas, são os cadastros de buracos nas ruas de uma cidade, que são avisados por celular e integrados a um mapa na Internet. Atualmente, esses “mapas de buracos” estão disponíveis em várias cidades.

Partindo da coleta de dados legíveis por máquina, passando por visualizações analíticas e chegando à construção de aplicações integradas para difusão de informações, a sociedade organizada é parte destacada e essencial no uso de tecnologias para o esforço anticorrupção. Convido os leitores que tiverem interesse a acessarem o artigo completo na referência abaixo.

Referências:

[1] A tecnologia como catalisadora da informação na prevenção e no combate à corrupção. in: "Lei Anticorrupção: Transparência e Boas Práticas". Cadernos FGV Projetos.  Ano 11, nº 27. Abril 2016. Páginas: 54-65. Disponível aqui.

Autores

  • é bacharel em Direito, especialista em Gestão de Sistemas de Informações e, atualmente, mestrando em Mídia e Conhecimento pela Engenharia de Produção da UFSC. Orientado pelo Professor Hugo Hoeschl, Dr..

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