Aposentadoria tranquila

Donos de falida e Santander lutam por indenização que pode chegar a R$ 582 mi

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27 de novembro de 2016, 15h23

Há mais de 34 anos na Justiça, a briga pelo valor da indenização de uma indústria de escapamentos que faliu por um erro bancário está caminhando para o seu desfecho. Ainda assim, a família dos antigos donos da empresa e o Banco Santander estão longe de chegar a um acordo para a reparação: enquanto os primeiros pedem R$ 582 milhões (valor que o juiz de primeira instância considera adequado), o segundo propõe não mais do que R$ 30 milhões. 

O caso envolve a Indústria de Silencioso do Nordeste (Insilene) e o banco Santander, sucessor do Banco do Estado de Pernambuco (Bandepe), considerado responsável pela bancarrota da empresa. A indústria foi representada pelos advogados Ivo Medeiros, Jorge Marques, Maria Lucia Soares de Albuquerque Marques e Jayme Menezes, os três últimos do escritório pernambucano JL Advogados Associados. Eles receberão honorários de sucumbência de 20% do valor total da indenização que vier a ser pago;

O caso começou na década de 1980, momento em que o então crescente grupo empresarial chegou a incorporar outras empresas e formou um conglomerado que empregava diretamente 700 pessoas. Foi com o objetivo de comprar novos equipamentos e treinar seus funcionários que a Insilene buscou — e conseguiu —um empréstimo junto ao Bandepe em 1982. Como garantia, a companhia hipotecou diversos imóveis à instituição financeira.  

Acontece que o banco estatal, em vez de depositar o valor em uma das contas da empresa, o colocou em uma conta da própria instituição financeira — e começou a usá-lo para outros fins. Percebendo o erro, a Insilene pediu que o empréstimo fosse transferido à sua conta ou que a operação fosse liquidada. Mas o banco não atendeu a esse pedido e pediu os recursos de volta. Como a companhia não o fez, a instituição financeira executou as garantias e apropriou-se dos imóveis hipotecados.

Sem o capital de giro com o qual contava, a operação da Insilene foi desacelerando. O Bandepe ainda avisou os demais bancos da região da situação da companhia, o que os apressou a cobrar as dívidas que a Insilene tinha com eles. Asfixiado, o grupo empresarial acabou falindo.

“O governo de Pernambuco na época não geriu bem o dinheiro do banco e precisava resolver a situação. Foi aí que ele pegou o grupo Insilene como 'bode expiatório', que naquela altura era o terceiro maior arrecadador de ICMS do país”, afirma o advogado Ivo Medeiros.

Longa batalha
A família proprietária da companhia levou a briga à Justiça, num processo que dura 34 anos e já passou pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco e pelo Superior Tribunal de Justiça. Nesse período, o Bandepe foi adquirido pelo Banco Real, que foi comprado pelo ABN Amro Bank, o qual, por fim, foi incorporado pelo Santander em 2009, por R$ 180 milhões— 26% do que a instituição pode ter que pagar pela falência da Insilene (contando os honorários).

Muito da culpa pela demora judicial se deve, entretanto, à Insilene. O processo de conhecimento acabou em meados dos anos 1990, e o juiz decidiu que a liquidação da sentença seria por artigos. Ou seja, a empresa teria que provar seu prejuízo — algo que ela não conseguiu fazer.

Anos depois, mudou o juiz responsável pelo caso, e a Insilene entrou com novo pedido de execução. O julgador, então, decidiu que a liquidação, desta vez, seria por arbitramento, via laudo de um perito.

Indignado, o Santander foi ao Tribunal de Justiça de Pernambuco alegar a preclusão da sentença que determinou a liquidação por artigos, mas a corte negou o recurso. O banco moveu Recurso Especial ao Superior Tribunal de Justiça, que foi indeferido monocraticamente pelo ministro Antônio Carlos Ferreira. Porém, a instituição financeira agravou dessa decisão, e o caso ainda não foi analisado novamente pelo STJ.

Como o recurso não tem efeito suspensivo, a execução vai tramitando na primeira instância. O juiz aceitou o laudo de um perito que, em valores atualizados, dá R$ 582 milhões. O Santander protestou, sustentando que as outras empresas do grupo econômico da Insilene foram incluídas indevidamente no cálculo, já que despacho anterior havia determinado a exclusão delas para esse fim. Contando apenas a companhia principal, o valor daria algo entre R$ 25 milhões e R$ 30 milhões, segundo o banco. Essa questão também está pendente de julgamento, desta vez no TJ-PE.

Em 31 de outubro, o juízo da 2ª Vara Cível de Recife determinou que a Insilene apresente o valor atualizado do crédito. Depois disso, o Santander será intimado a pagar. Porém, a instituição financeira declarou à ConJur que imediatamente moverá Ação Cautelar junto ao Supremo Tribunal Federal se tiver que desembolsar os cerca de R$ 700 milhões — contando honorários advocatícios — antes do julgamento de seus recursos.

“O processo contém diversas impropriedades, pois as decisões proferidas até o momento desrespeitaram a legislação e precedentes judiciais anteriores. Legalmente, a autora (Insilene) só poderia ser indenizada pelos danos comprovados por ela sofridos.  Contudo, as decisões mais recentes neste caso modificaram uma decisão anterior, já consagrada pelo juiz de primeira instância, e ampliaram, equivocadamente, a base de cálculo dos prejuízos alegados, pois utilizaram o “grupo econômico” da empresa, em vez de se limitar à contabilidade da própria autora.  Por essa razão, o Santander submeterá essas decisões aos tribunais superiores (STJ e STF), para garantir a aplicação correta da legislação e jurisprudência em vigor”, afirmou o banco.  

De acordo com o advogado Jorge Marques, a quantia é justa, pois inclui a restituição do empréstimo e indenizações por danos materiais e morais, devidamente corrigidos. Segundo suas contas, os honorários poderão chegar a R$ 117 milhões a serem divididos igualmente entre os quatro profissionais que representaram a empresa — isso se um eventual acordo não reduzir essa quantia, ressalvou Marques.

“Faço meu trabalho direcionado para a Justiça. O resultado financeiro é uma mera consequência dos meus serviços”, afirmou, ansioso.

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