Além da fronteira

Eleitos em Corumbá são investigados por compra de votos e campanha na Bolívia

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26 de novembro de 2016, 7h28

A disputa pela prefeitura da cidade histórica de Corumbá (MS) ainda não chegou ao fim, apesar de já ter um eleito. Contrariando as pesquisas eleitorais, Ruiter Cunha (PSDB) venceu a eleição, com cerca de 2,5 mil votos a mais que o segundo colocado, o atual prefeito Paulo Duarte (PDT). No entanto, uma investigação coloca em risco a diplomação de Cunha.

O político é acusado pelo Ministério Público Eleitoral de abuso de poder por fazer campanha em rádio e TV boliviana, além de fornecer transporte gratuito para eleitores brasileiros que moram em duas cidades da Bolívia no dia da votação. O MPE-MS pede na Justiça Eleitoral a cassação da candidatura ou diploma de Ruiter Cunha e seu vice, Marcelo Aguilar Iunes, e também a aplicação de multa. Em outra ação, baseada nos mesmos fatos, também pede a condenação do vereador eleito Irailton Oliveira Santana, o Baianinho.

O caso teve início ainda durante a campanha eleitoral. Poucos dias antes do primeiro turno das eleições deste ano, Ruiter Cunha e o candidato a vereador Baianinho, divulgaram propaganda eleitoral nas cidades bolivianas de Puerto Suárez e Puerto Quijarro. Nela, comunicavam àqueles que votam em Corumbá que haveria uma reunião de orientação e apresentação dos candidatos. Também informaram que no dia da eleição haveria transporte gratuito para quem fosse votar, para isso deveriam votar em Ruiter e Baianinho — veja o vídeo ao final da notícia.

Com a presença dos dois candidatos, a reunião aconteceu na rádio em que foi divulgada a propaganda eleitoral, mesmo local de onde partiriam cerca de 30 táxis no dia 2 de outubro. O cunho político da reunião, segundo o MPE-MS, ficou evidente no vídeo transmitido em rede de televisão boliviana e em trecho de áudio gravado no local do encontro. Em um determinado trecho do áudio, uma voz atribuída a Baianinho esclarece a um eleitor que ele terá táxi gratuito para fazer o leva e traz. Em outro trecho, é possível identificar um acerto de aposentadoria no Brasil.

O esquema, no entanto, estava sendo vigiado pela Polícia Federal que no dia da eleição montou uma barreira e abordou dois carros que transportavam eleitores brasileiros irregularmente. Na PF, os eleitores afirmaram em depoimentos que o transporte gratuito foi disponibilizado pela dona da rádio onde aconteceu a reunião e que, ao entrarem nos carros, recebiam santinhos dos candidatos.

Além desses veículos, a Polícia Federal também identificou diversas pessoas que estava ingressando a pé no Brasil, mas que também participavam do esquema. Segundo os depoimentos colhidos pela PF, os taxistas foram avisados da barreira policial e por isso deixavam os eleitores na fronteira, dando a eles dinheiro para que no Brasil pegassem outro táxi até o local de votação.

Ao todo, 13 eleitores foram ouvidos como testemunha e liberados. Os dois motoristas abordados foram presos por crime eleitoral, mas soltos no dia seguinte por determinação da Justiça. A Polícia Federal também fez buscas e apreensões na casa e no comitê de Baianinho.

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Conforme a denúncia, passageiros confirmaram o transporte e o recebimento de santinhos. Foto: Reprodução

Abuso de poder
Na ação apresentada à Justiça, o Ministério Público Eleitoral a utilização indevida de transportes nas eleições está entre as formas mais habituais de abuso de poder econômico. Aponta ainda que a legislação eleitoral veda a veiculação em TV e rádio fora do horário estabelecido em lei. No caso, segundo o Ministério Público, o abuso de poder ficou configurado no uso indevido de meio de comunicação social nas duas cidades bolivianas para veicular propaganda eleitoral irregular.

“As provas que instruem a inicial demonstram a prática de conduta ilegal e reiterada de utilizar, indevidamente e de forma falaciosa, importantes meios de comunicação social, de grande influência e largo alcance, em cidades fronteiriças ao Brasil, onde reside grande número de eleitores brasileiros, com o propósito de alavancar a candidatura dos candidatos representados, configurando o abuso dos meios de comunicação, previsto no artigo 22, caput, da Lei Complementar 64/1990”, diz a inicial.

O Ministério Público aponta ainda a existência de abuso de poder econômico devido ao transporte oferecido gratuitamente aos eleitores, quebrando a isonomia do pleito e configurando a compra de votos. Nesses casos, diz o MPE-MS, o pedido de voto é presumido, pois são raros os casos de filantropia. A ConJur tentou entrar em contato com os advogados dos acusados, mas não obteve nenhum retorno até a publicação desta notícia.

Pelo Facebook, Ruiter Cunha comentou que "eleição que se recusa a terminar". No texto, publicado no dia 26 de outubro, ele não comenta a ação do Ministério Público porque na época não havia sido aberta ao contraditório. "E mais ainda, porque confio na lisura da nossa campanha e no trabalho desassombrado da Justiça", diz Cunha.

No entanto, ele critica as atitudes de seu adversário político que, segundo Cunha, apresentou inverdades desde o início da campanha. "Política democrática não se faz pela desconstrução do adversário, mas pelo debate franco de ideias; e não se analisa se um governo é bom, reduzindo a estatura do adversário para que caiba no tamanho do próprio fracasso", afirmou o prefeito eleito.

Veja a propaganda veiculada na TV boliviana:

AIJE 0000325-53.2016.6.12.0007
AIJE 0000324-68.2016.6.12.0007

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