Troca justa

Justiça Federal extingue ação contra réus que repatriaram recursos

Autor

22 de novembro de 2016, 17h43

Quem é acusado de evasão de divisas de origem não comprovadamente ilícita pode aderir ao regime de repatriação de recursos previsto na Lei 13.254/2016 e deixar de responder por esse delito. Com base no artigo 5º, parágrafo 5º, dessa norma, a 2ª Vara Federal Criminal Especializada em Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e Crimes de Lavagem ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores de São Paulo absolveu três pessoas que decidiram legalizar valores junto à Receita Federal.

Após os réus aderirem ao programa de repatriação, a defesa deles, comandada por Augusto de Arruda Botelho, sócio do Cavalcanti & Arruda Botelho Advogados, pediu que fosse declarada a extinção da punibilidade, conforme prevê a Lei 13.254/2016. O Ministério Público Federal apoiou o pedido dos advogados.

A juíza federal Silvia Maria Rocha concordou. Segundo ela, estão presentes no caso os requisitos da norma para anistiar quem decidir regularizar recursos mantidos no exterior. Isso porque não há indícios de que o dinheiro evadido — via doleiros para pagar fornecedores estrangeiros — tenha origem ilícita.

E mesmo se os recursos fossem irregulares, “poder-se-ia entender que o objetivo da ação criminosa era encobrir o subfaturamento nas importações de produtos, incidindo, desta forma, em questões tributárias”, apontou a juíza, citando que o Superior Tribunal de Justiça entende não ser possível denunciar alguém por descaminhado sem que antes tenha havido processo administrativo fiscal.

Como não há condenação transitada em julgado contra os acusados, e como eles pagaram os impostos devidos para a repatriação, a juíza declarou extinta a punibilidade.

Reforço no caixa
Encerrado em 21 de outubro, o programa de regularização de ativos não declarados no exterior arrecadou R$ 48,8 bilhões de Imposto de Renda e multa. Inicialmente, a Receita Federal informou que esse montante era de R$ 50,9 bilhões, mas o dado foi retificado posteriormente.

O regime, instituído pela Lei 13.254/2016, proporcionou a regularização de R$ 169,9 bilhões, sendo R$ 163,9 bilhões de pessoas físicas e R$ 6,06 bilhões de pessoas jurídicas. Com alíquota de IR de 15% e multa de 100% desse valor — totalizando uma taxação de 30% sobre os valores mantidos ilegalmente em outros países —, o Fisco obteve uma adesão maior do que à do programa semelhante aplicado nos EUA, de acordo com o secretário da Receita, Jorge Rachid.

Empolgado com o sucesso do programa, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou que vai apresentar um projeto de lei para reabrir o prazo para que pessoas que têm recursos não declarados no exterior possam repatriar o dinheiro pagando imposto e multa.

A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, concedeu liminares favoráveis aos estados do Piauí e Pernambuco, que estão pedindo para ficar com parte do que o governo federal ganhou com a multa paga pelos contribuintes para regularizar os recursos não declarados fora do país. Posteriormente, o entendimento foi estendido a mais 16 estados.

Programa polêmico
O programa de regularização de ativos no exterior gerou polêmica no mundo jurídico. Alguns consideraram que a medida anistiava quem desrespeitou a lei. O desembargador federal Fausto De Sanctis disse que a norma “merece censura porquanto subverte valores democráticos de uma sociedade que, sem perceber, permite o reingresso de valores ilícitos outrora sonegados”. Nessa mesma linha, o juiz responsável pelo braço da operação “lava jato” no Rio de Janeiro, Marcelo Bretas, afirmou que a medida “é um insulto para quem paga imposto”. Além disso, houve quem considerasse que a alíquota do IR e da multa coibiriam a adesão ao programa.

O advogado Luiz Gustavo Bichara, por sua vez, destacou que outro ponto que deveria ser reajustado é a necessidade de comprovação da licitude da origem dos recursos, algo que em muitos casos ele classifica como “impossível”.

Além disso, criminalistas avaliaram que, ao sancionar a Lei 13.254/2016, a então presidente Dilma Rousseff foi contra um dos pilares do direito de defesa: a presunção da inocência. A presidente vetou o dispositivo que exigia o trânsito em julgado para impedir que pessoas condenadas em ações penais fossem beneficiadas pela lei.

Esse veto vai contra a Constituição, a lei e todos os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, segundo o criminalista Augusto de Arruda Botelho, conselheiro do presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD). “Uma condenação criminal só pode ser considerada para fins legais com trânsito em julgado. O veto causa espanto, pois qualquer estudante de Direito saberia que o que está sendo feito é inconstitucional”, critica Botelho.

O tributarista Marcelo Knopfelmacher concorda que o veto é claramente inconstitucional e aponta que a supressão do trecho vai agitar os tribunais, “pois abre espaço para que a questão seja levada para discussão em juízo”.

Clique aqui para ler a íntegra da decisão.
Processo 0003159-95.2009.403.6181  

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!