Opinião

Reforma eleitoral deve ser feita por lei ordinária, e não emenda constitucional

Autor

  • Clever Vasconcelos

    é promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo professor de Direito Constitucional e Eleitoral (Damásio Educacional) e doutor em Direito do Estado pela PUC-SP.

14 de novembro de 2016, 6h41

Muito se discute hoje em dia sobre a necessidade de alterações pontuais na legislação eleitoral, especialmente a introdução de uma nova cláusula de barreira ou desempenho partidário, e a modificação do sistema proporcional, adotado de forma simples, para um novo modelo de proporcional distrital ou misto. No campo legislativo, percebe-se que os parlamentares inserem a matéria obrigatoriamente na qualidade de projetos de emenda constitucional (PEC), esquecendo que tanto a cláusula de barreira ou desempenho como a eventual modificação do sistema proporcional não são assuntos típicos constitucionais, mas puramente legais, ou seja, podem ser alterados por lei ordinária, dispensando mudança na Constituição, tornando a tarefa muito mais simples e rápida, entretanto sem jamais esquecer a importância dos temas, que requerem profunda reflexão e debate.

De fato, o processo legislativo da emenda constitucional é rígido, ou super-rígido como alguns o denominam, e necessita de aprovação por dois turnos em cada Casa do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado), em votação de maioria qualificada (3/5 dos parlamentaras de cada Casa, separadamente). Portanto, a solenidade é grande e exige um esforço hercúleo para a alteração de algumas matérias típicas constitucionais. Por outro lado, o projeto de lei ordinária requer apenas uma votação em cada Casa, cujo quórum de aprovação é de maioria relativa em cada qual, finalizando com a sanção presidencial, muito mais fácil de aprovar e introduzir nova legislação no campo interno.

A reforma eleitoral para o ano de 2018 pode ser feita apenas por lei ordinária, dispensando emenda constitucional.

A cláusula de barreira, ou desempenho partidário, que já integrou a legislação eleitoral no artigo 13 da Lei 9.095/96 (Lei dos Partidos Políticos), foi considerada inconstitucional pelo STF nos julgamentos das ADI (ações diretas de inconstitucionalidade) 1.351 e 1.354, ajuizadas pelo PCdoB e PSC, e dizia que todo partido político deveria obter em cada eleição para a Câmara dos Deputados pelo menos 5% dos votos válidos, distribuídos em 1/3 dos estados, recebendo em cada qual 2% dos votos para o partido, sem o que a agremiação não poderia ter funcionamento parlamentar. Mas, em razão do pluralismo político previsto no artigo 1, inciso V, da Constituição, a corte suprema reconheceu a incompatibilidade do instituto, afastando ela do cenário político. Contudo, nada impede que agora um novo projeto de lei ordinária, e não de emenda constitucional, rediscuta o tema e seja apreciado com um cálculo mais ameno, menos exigente do que aquele que foi julgado, propiciando a introdução de uma nova cláusula de desempenho, a fim de que tenhamos partidos mais comprometidos com o desenvolvimento da sociedade, e não como bancadas de negociação de tempo de televisão e rádio, como é notório do conhecimento dos eleitores.

Se a antiga cláusula de desempenho era tratada como lei ordinária, o método mais efetivo é reintroduzi-la de outro modo (com outro cálculo), mas mantendo-a como lei ordinária. A emenda constitucional é dispensável nesse caso.

Já a alteração do sistema proporcional simples para o distrital ou misto, que preservam a eletividade de parlamentares cada região, beneficiaria todas as partes do país, pois nenhuma região ou distrito ficaria sem representação de deputados, e porque não de vereadores, deputados estaduais e distritais, também não é exigência constitucional. Hoje a Lei Complementar 78/1993 fixa o número de parlamentares por estados e Distrito Federal, mas é o Código Eleitoral, lei ordinária, que em seus artigos 105 e seguintes é que disciplina como se dá uma eleição proporcional, não havendo nem sequer uma linha constitucional regulando a matéria. A Constituição apenas menciona que a eleição parlamentar para a Câmara será proporcional, mas os modelos, puro, distrital ou misto é papel de regulação pela lei ordinária, diga-se Código Eleitoral. Pois bem, a adoção de um novo sistema proporcional, distrital ou misto, não exige discussão via emenda constitucional.

Assim, como se avizinham as Eleições de 2018 para os cargos parlamentares, requisitando que a legislação deve ser modificada pelo menos um ano antes da eleição, conforme artigo 16 da Constituição, fica a recomendação para o Congresso Nacional discutir efetivamente a matéria com a importância que tem, com reflexão e debate, como já disse, pela nossa importante e recomendada lei ordinária, como sempre foi durante todos esses anos, sendo plenamente dispensável a alteração via modificação da Constituição, já densamente analítica.

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    é promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo e doutor em Direito do Estado pela PUC-SP. Professor de Direito Constitucional, Administrativo, Eleitoral e Legislação do Ministério Público. Membro do IBDC - Instituto Brasileiro de Direito Constitucional.

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