Davi e Golias

Batalhão de advogados usa "falácias" contra a "lava jato", dizem procuradores

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29 de março de 2016, 22h02

Integrantes do Ministério Público afirmaram nesta terça-feira (29/3) que advogados apresentam “falácias” para tentar prejudicar o andamento da operação “lava jato”. As declarações foram feitas em São Paulo, durante evento com o juiz federal Sergio Fernando Moro e com o juiz italiano Piercamillo Davigo.

O procurador da República Paulo Roberto de Carvalho, membro da força-tarefa do caso em Curitiba, disse que atua com 10 colegas contra 60 bancas de advocacia, “as mais relevantes do país, que dominam o discurso jurídico tanto nos tribunais quanto na academia [e] estão tentando diminuir ou atrapalhar o trabalho da operação”. Por isso, segundo ele, “é preciso ficar atento” às movimentações das defesas.

A revista Consultor Jurídico questionou se fazem sentido críticas à interceptação telefônica de um escritório de advocacia ou se são parte dessa estratégia de defesa. Carvalho respondeu que não comentaria o caso, pois a questão sobre os grampos foi enviada ao Supremo Tribunal Federal.

Carvalho negou prisões excessivas — disse que apenas 18 pessoas estão presas hoje, cerca de 10% dos denunciados — e estimou que 95% das decisões de Moro foram mantidas por tribunais superiores. Nem esses 5% demonstram erro ou abuso judiciário, para o procurador, mas apenas “diferenças de entendimento” sobre a aplicação do Direito.

Ele afirmou ainda que defensores dos réus apontam o uso de prisões como forma de forçar colaborações premiadas, como se o Ministério Público Federal torturasse investigados até obter depoimentos, quando apenas 11 dos 43 delatores já oficializados estavam presos no momento que aceitaram a negociação. Ainda segundo o procurador, alguns desses colaboradores “bateram na porta” do MPF antes mesmo de serem investigadas. Os nomes não foram divulgados.

O procurador de Justiça Rodrigo Chemim, do Ministério Público estadual do Paraná, definiu como “episódico” parecer do MPF que apontou a “importante função [da prisão preventiva] de convencer os infratores a colaborar com o desvendamento dos ilícitos penais” — em 2014, ao se manifestar contra um pedido de Habeas Corpus, o procurador da República Manoel Pastana afirmou que “o passarinho para cantar precisa estar preso”.

De acordo com Chemim, a reação de advogados contra prisões preventivas repete “técnicas de neutralização” adotadas na Itália durante a operação mãos limpas, famoso caso que apontou esquema de corrupção no país e envolveu mais de 400 parlamentares, nos anos 1990. “Os advogados dos investigados devem estar se articulando já para fazer alterações legislativas muito perigosas”, disse o procurador, ao citar a retomada da proposta de reforma do Código de Processo Penal e projeto de lei que busca proibir pessoas presas de assinarem delações premiadas.

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Para o juiz federal Sergio Fernando Moro, a corrupção não é o único problema no Brasil e na Itália, mas ao menos o país europeu conseguiu melhorar depois da operação mãos limpas, que inspirou a "lava jato". 
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Itália limpa
O juiz Sergio Moro proferiu breve palestra e pediu para ninguém gravar sua fala, em áudio ou vídeo. Disse que a corrupção não é o único problema no Brasil e na Itália, mas defendeu que o país europeu melhorou depois da operação mãos limpas.

Moro reconheceu que a saída de políticos tradicionais ocorreu junto com a ascensão de Silvio Berlusconi — milionário que acabou virando primeiro-ministro e também foi acusado de corrupção. Para o juiz, porém, a mãos limpas não pode ser responsabilizada pela situação política e econômica do país. “O problema foi que houve uma reação política, e a democracia italiana não foi forte o suficiente para reagir a essa reação. Agora, atribuir responsabilidades aos magistrados da operação mãos limpas é confundir as coisas.”

Ele relatou que a “lava jato” como conhecemos hoje surgiu de um “tropeço” — a investigação focada no mercado negro de câmbio chegou à Petrobras quando se descobriu um veículo comprado pelo doleiro Alberto Youssef como recompensa ao ex-diretor da petrolífera Paulo Roberto Costa. Também rejeitou a hipótese de que empreiteiras tenham sido obrigadas a participar de um cartel. “Empresário pode dizer não à corrupção”, declarou.

Piercamillo Davigo, que atuou na mãos limpas como uma espécie de promotor, disse que a Itália ainda sofre com partidos políticos sem regras claras nem democracia interna. Considerou, no entanto, que as investigações dos anos 1990 permitiram o surgimento de empresas mais eficientes e tecnológicas, com resultados melhores do que concorrentes que dependiam de relações escusas com a administração pública. 

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