Opinião

Nenhum dos poderes pode se exceder sob o pretexto de combater a corrupção

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26 de março de 2016, 9h00

Desde março passado de 2014, quando a Polícia Federal fez uma série de prisões para desmontar esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas, a Operação Lava Jato tornou-se um dos casos mais discutidos do Brasil. Não é para menos, afinal, segundo as autoridades que investigam os desmandos, o esquema movimentou bilhões em propina.

No esquema de movimentação ilegal de dinheiro estão: tráfico internacional de drogas, desvios de recursos públicos, sonegação fiscal, evasão de divisas, extração, contrabando de pedras preciosas e corrupção de agentes públicos e tentativas de desmoralização das instituições.

As investigações desmascararam diretores da Petrobras e de outras empresas, as gigantes do país que fraudavam contratos e superfaturavam com fornecedoras, para pagamentos de propina, que era encaminhada a executivos e, também, dirigentes partidários.

Após dois anos do início da operação muitos foram presos, sendo a maioria de executivos de empreiteiras que possuem contratos firmados com a Petrobras e políticos. Ressalte-se, pela primeira vez, na história do nosso país um senador da República no exercício do mandato foi preso em flagrante (obstrução da justiça) e sua prisão permitida pelo Plenário do Senado da República.

O que, sem dúvidas, demonstra que os tempos estão mudando e a impunidade precisa ser afastada de vez. E para sair da cadeia teve que fazer delação premiada, sob o nome atual de colaboração espontânea, esta após 83 dias no cárcere. Não fica por ai, são senadores, deputados, ex-deputados e até governadores envolvidos, alguns presos e condenados e, já, na fase da delação, em busca de redução de pena.

Não se discute, é o maior caso de corrupção na história do país e quiçá do planeta, que está sendo conduzido pelo juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal no Paraná. Trata-se de um profissional altamente capacitado, que reúne conhecimento acadêmico e habilidade técnica para conduzir um processo judicial tão vultoso. Por isso, louva-se a determinação e coragem do eminente magistrado, mas não aceitamos que extrapole os limites da Constituição, e da legislação infraconstitucional.

Alertamos porque não concordamos, todavia, com os meios utilizados pelo Ministério Público Federal e pelo juiz Sérgio Moro na obtenção de provas mediante delação. As práticas são motivo de grande preocupação dos cidadãos e dos advogados comprometidos com o Estado Democrático de Direito, pois, com todas as vênias, as prisões sem culpa formada não passam de tortura psicológica dos investigados, que na esperança de se livrarem da prisão confessam e denunciam uns aos outros, mesmo sem alicerce para tal. Posto que, o mais importante é conseguir a liberdade.

Tem se observado que sua excelência, juiz Moro, tem dado demonstrações de autoritarismo ao prender suspeitos ainda não condenados, atropelando regras processuais. E agora, mais uma vez, afronta a Constituição Federal divulgando, indevidamente, gravação realizada na qual a interlocutora era a Presidente da República. A impunidade tem que ser combatida. Não desejamos que corruptos continuem associados, em uma verdadeira quadrilha, mandando em nosso país.

Mas precisamos ter cautela e não afrontarmos a Carta Magna, sob o argumento que eventuais erros não “são importantes”. Tudo que ferir o Estado Democrático de Direito, por mais simples que seja, é importante, sim, não se pode permitir e tampouco aceitar.

A delação premiada, até onde se sabe, nunca alcançou um numero tão grande de pessoas, tais como: doleiros, funcionários públicos, executivos e políticos, que já aceitaram colaborar em troca da liberdade. A nosso ver essa colaboração não é espontânea, ao contrário, é extraída mediante, data vênia, tortura psicológica.

A Justiça Federal tem mantido em sigilo as investigações enquanto interessam, e sem qualquer justificativa plausível, suspendem o sigilo e divulgam de forma seletiva, sendo essa conduta inaceitável. E, recentemente, divulgaram diálogo da presidente da República com o ex presidente, seu padrinho político. Tais situações de absoluto desrespeito à Constituição Cidadã devem ser investigados e responsabilizados “o” ou “os” responsáveis.

Talvez mais grave do que a escuta da Presidente, é o grampo no escritório de advocacia onde todos da banca, segundo consta, mediante um engodo foram grampeados. Ainda bem, que nossa gloriosa Ordem dos Advogados do Brasil, através de seus dirigentes, se manifestou repudiando tal ação.

Mas isso não basta, é imperioso buscar a defesa intransigente do Estado Democrático de Direito, antes de ficar advogando o afastamento da senhora presidente da República. Nós queremos o afastamento de todos os corruptos que têm deixado os brasileiros nessa situação de penúria.

Contudo, a tarefa de afastamento da senhora Presidente, com todas as vênias, cabe ao Congresso Nacional através de suas duas casas legislativas. Evidentemente que o povo deve estar atento e fiscalizar, diuturnamente, a atuação dos parlamentares, tanto da Câmara quanto do Senado, mas que tudo seja feito em obediência aos termos da Constituição e da legislação infraconstitucional. A fim de que possamos consolidar nossa democracia.

Por sua vez, a senhora Presidente da República, enfrentando uma situação gravíssima, ao invés de adotar um discurso conciliatório buscando acalmar os ânimos de todos os contendores, pouco importando se são a favor ou contra o seu afastamento. Ao contrário, vem pregando em todas suas manifestações e de seus assessores mais diretos a cantilena do “golpe”, como se tal situação não estivesse prevista na Constituição Federal.

Ora, se inexiste o enquadramento dos fatos como crime de responsabilidade, o processo não irá prosperar e, certamente, será arquivado. Entretanto, com essa lamúria do “golpe” a senhora presidente fica cada vez mais vulnerável. Nessa mesma linha, seu partido político por diversas vezes requereu o impedimento de outros presidentes e, simplesmente, os processos foram arquivados, pois, lhes faltava alicerce jurídico.

O que poderá, também, ocorrer no caso em tablado. Mas, repito, se faz necessário que o governo e, máxime, a presidente, parem com esse chororô de “golpe”. Até porque alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal, já, se manifestaram contrário à tese do “golpe”.

Pois bem, os fatos divulgados são gravíssimos e ensejam investigação profunda em cada um deles, mas há de se respeitar às disposições de nossa carta magna, sob pena de se estar ferindo de morte o Estado Democrático de Direito conquistado a tão duras penas. Nessa toada foi singularmente importante a decisão do culto e douto ministro Teori Zavascki quando avocou para si a responsabilidade de decidir, acalmando um pouco o estado de beligerância da população, sem que isso signifique que  esteja de um lado ou de outro, o que se pode extrair de sua decisão é que está ao lado do equilíbrio da justiça e da democracia com responsabilidade.

Agora como se não bastassem os fatos já divulgados a empresa Odebrecht, segundo notícias, concordou em fazer colaboração com as autoridades encarregadas da famosa e longa operação “lava jato”. Tendo em conta que a Polícia Federal apreendeu uma lista com mais de 200 nomes de políticos influentes que receberam doações da empreiteira, mas, ainda, não existe certeza se estas doações foram legais ou não.

Assim, deve ter-se o cuidado de não prejudicar pessoas de bem, simplesmente, porque seu nome apareceu no seio de uma lista de pessoas com desvios de conduta.

É bem verdade que, em algum momento teríamos que passar nosso país a limpo, combatendo essa corrupção sistêmica e desenfreada, desafiadora de todos os limites imagináveis. Esperamos que o momento seja agora. Entretanto, vamos fazê-lo com toda a lisura e respeito às conquistas do nosso povo, máxime o respeito às Leis e a Constituição Federal que no dizer do saudoso Ulisses Guimarães é a “Constituição Cidadã”.

Vamos passar limpo, vamos afastar os corruptos, mas não avancemos o sinal, aonde começam a arrogância e o autoritarismo, pois se avançarmos esse sinal estaremos retrocedendo, sem duvidas, ao período das trevas não muito distante vivido em nosso Brasil.

A verdade é que, caso comprovado o envolvimento de deputados e senadores do alto escalão da política nacional, a operação “lava jato” trará consequências nunca antes vistas na história do nosso país, superando o escândalo do mensalão (Ação Penal 470) e denegrindo, ainda, mais a imagem do Brasil mundo afora.

Cabe ao eminente juiz Sérgio Moro, respeitando o devido processo legal e a ampla defesa, a responsabilidade de conduzir o caso no Poder Judiciário e a todos nós, brasileiros, fiscalizarmos seu andamento, bem como exigir que a justiça seja feita, condenando exemplarmente os corruptos de todos os naipes sem exceção e que tais penas sejam integralmente cumpridas.

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