Direito Civil Atual

Vinda de Paulo Mota Pinto ao Brasil reforça debate sobre Direito Privado

Autor

  • Otavio Luiz Rodrigues Junior

    é professor doutor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Direito Civil (USP) com estágios pós-doutorais na Universidade de Lisboa e no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo). Acompanhe-o em sua página.

14 de março de 2016, 13h40

Spacca
Em agosto de 2006, no Mosteiro de Frauenwört, em Frauenchiemsee, na Baviera, reuniram-se pesquisadores alemães, portugueses e brasileiros para discutir o problema da eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares em um simpósio organizado pelos professores António Pinto Monteiro (Coimbra), Jörge Neuner (Augsburg) e Ingo Sarlet (PUC-RS). Desse interessante colóquio resultou uma obra coletiva intitulada Direitos fundamentais e direito privado, organizada pelos mencionados docentes, com estampa da Almedina, de Coimbra, publicada em 2007. Trata-se de um livro fundamental para a compreensão do problema da Drittwirkung sob uma óptica comparatística, especialmente porque o livro englobou, além de Alemanha, Portugal e Brasil, dos direitos espanhol e argentino, com trabalhos enviados por autores que não se puderam fazer presentes ao isolado mosteiro bávaro.

Um dos colaboradores dessa obra, que é fundamental para a compreensão do tema, foi Paulo Mota Pinto, que, à época, era juiz conselheiro do Tribunal Constitucional da República Portuguesa, cargo que passou a ocupar a partir de 1998 e nele permaneceria até 2007. Indicado pela Assembleia da República, Mota Pinto constituiu-se no mais jovem magistrado constitucional do país, ao ingressar no tribunal com 32 anos. Essa aparente precocidade é apenas um indicativo de seu invulgar brilhantismo: docente na Universidade de Coimbra desde 1990, foi nessa instituição que obteve os títulos de licenciado, mestre e doutor em Direito Privado. Nessa trajetória, tornou-se conhecido por obras de impacto na literatura jurídica civilística. A dissertação de mestrado, publicada em Coimbra, na Almedina, no ano de 1995, intitula-se Declaração tácita e comportamento concludente no negócio jurídico, com 950 páginas. A tese de doutorado, também editada pela Almedina, no ano de 2009, é um “pequeno” tratado sobre o Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, em dois volumes, com “apenas” 1901 páginas. Em ambos os estudos, destaca-se a forte influência da literatura jurídica alemã, tanto quanto ao método de exposição, quanto à riqueza de fontes bibliográficas.

Paulo Mota Pinto, como é comum na academia portuguesa, também concilia a vida universitária com uma carreira política. Em seu caso, tem-se a particularidade de sua ascendência paterna, o professor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Carlos Alberto da Mota Pinto, precocemente falecido em 1985. Companheiro de Francisco Sá Carneiro na fundação do que é hoje conhecido como Partido Social Democrático, Carlos Alberto foi um dos líderes da reação ao regime salazarista-marcelista na década de 1970 e foi escolhido o 152º  primeiro-ministro de Portugal, no IV Governo Constitucional (1978-1979), ao tempo da presidência do general Ramalho Eanes.

Nessa condição, Paulo Mota Pinto foi deputado à Assembleia da República entre 2011-2015, cargo que já ocupou em 2009-2011.

Suas ligações com o Brasil são estreitas, de modo particular com o Rio Grande do Sul, graças a seu colega de pesquisas na Alemanha, o constitucionalista Ingo Wolfgang Sarlet, que coordena o respeitado programa de pós-graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica. Para além desses vínculos acadêmicos e pessoais, Mota Pinto é um interessado pesquisador sobre a relações entre o Direito Civil e o Direito Constitucional. Sua condição de magistrado do Tribunal Constitucional só acentuou essa perspectiva, embora o professor de Coimbra jamais haja renunciado ao rigor metodológico, à compreensão do Direito Privado em sua autonomia e à necessidade de se evitar os riscos – quase permanentes – do hibridismo teórico, tão em moda em certos setores da comunidade acadêmica nacional (e não apenas nacional).

Atualmente, Paulo Mota Pinto desenvolve importantes pesquisas sobre os direitos da personalidade no âmbito da revolução tecnológica de nosso tempo, no qual privacidade e intimidade são conceitos permanentemente postos à prova diante da fragilidade do controle de dados pessoais e da imagem na internet e na mídia. Outro tema de interesse está nas questões relacionadas à crise econômica e seu impacto nas tipologias contratuais, com alguma ênfase ainda em temas de Direito do Consumidor, no que encontra em seu colega – e mentor – Antonio Pinto Monteiro, catedrático de Coimbra e líder da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo naquela universidade, um parceiro de projetos acadêmicos.

Como resultado dessas últimas pesquisas, Paulo Mota Pinto publicou no volume 6 (outubro-dezembro de 2015) da Revista de Direito Civil Contemporâneo um artigo sobre contrato de swap, taxas de juro, jogo e aposta e alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar.  A revista, que é o órgão oficial da Rede de Pesquisa, é editada pela Thomson Reuters-Revista dos Tribunais.

Mota Pinto estará no Brasil nesta semana para a inauguração do curso de mestrado em Direito, na área de Direito Privado, da Faculdade 7 de Setembro, em Fortaleza, Ceará, no dia 16 de março de 2016. Esse novo mestrado, que é coordenado pelos professores João Luís Nogueira Matias e Maria Vital da Rocha, ambos membros da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo, nasce com o propósito de levar adiante um projeto inovador de pesquisa e de metodologia jusprivatista no Nordeste do Brasil.

No dia 18 de março de 2016, às 9h30, na Sala da Congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, Paulo Mota Pinto participará do III Ciclo de Estudos de Direito Privado Contemporâneo, um evento que se vem tornando tradicional nas Arcadas e que já trouxe ao Brasil os nomes de Reinhard Zimmermann e Stefan Grundmann. A conferência de Mota Pinto terá por título A eficácia dos direitos fundamentais em relação aos particulares, um tema que é muito caro ao professor e que desperta grande interesse no Brasil. A promoção do ciclo de estudos é da Faculdade de Direito da USP, de seu Departamento de Direito Civil e da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo, cujos membros também se reunirão no período da tarde no mesmo dia 18 de março.

O evento é aberto ao público, sem necessidade de inscrições prévias, embora haja vagas limitadas. O tema escolhido, para além das fronteiras do Direito Civil, interessa também a pesquisadores de Direito Constitucional.

O ciclo de estudos com o professor Paulo Mota Pinto é fruto de uma parceria com a Faculdade 7 de Setembro e do apoio institucional da Universidade de São Paulo, na pessoa do diretor da Faculdade de Direito, professor José Rogério Cruz e Tucci, e dos docentes do Departamento de Direito Civil, chefiado pela professora Silmara Chinellato. A coordenação dos trabalhos coube aos professores Ignacio Poveda e Eduardo Marchi, além deste colunista. São esperados pesquisadores de diversas universidades integrantes da Rede de Pesquisa.

Após a conferência, o professor Paulo Mota Pinto deverá conceder entrevista, que será publicada no volume 9 da Revista de Direito Civil Contemporâneo, em versão integral, e também na revista eletrônica Consultor Jurídico, de modo resumido.

* Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Girona, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC e UFMT).

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    é professor doutor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutor em Direito Civil (USP), com estágios pós-doutorais na Universidade de Lisboa e no Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht (Hamburgo). Acompanhe-o em sua página.

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