"Juiz maconheiro"

"Advocacia criminal foi criminalizada", afirma profissional acusado de apologia

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23 de maio de 2016, 18h56

"A advocacia criminal vem sendo equivocadamente criminalizada não apenas pela sociedade, como o foi pelas mãos de experientes desembargadores", afirma o criminalista Marcelo Feller, acusado de fazer apologia ao crime por citar que até mesmo pessoas bem-sucedidas usam drogas. Ele apresentou, nesta segunda-feira (23/5), uma representação no Tribunal de Justiça de São Paulo para explicar o episódio envolvendo o desembargador José Orestes de Souza Nery.

Feller defendia dois jovens acusados de tráfico que, alegando serem apenas usuários de drogas, buscavam um Habeas Corpus na 9ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo. Para ilustrar sua fala, o criminalista usou nomes fictícios para descrever situações reais que, se mal-interpretadas, poderiam ser vistas como indício de traficância. Por causa dos exemplos usados pelo advogado, o desembargador Souza Nery pediu uma investigação à Procuradoria-Geral de Justiça de SP.

Na representação, o advogado destaca que as histórias contadas na corte não passavam de simples retórica. “Os nomes de todas essas pessoas, Denis, Roberto e T(h)iago eram obviamente fantasiosos. Puro recurso de retórica. O objetivo em citá-los era singelo: ao apontar que usuários de maconha podem ser confundidos com mercadores, se levado em consideração um único critério para referida verificação — variedade da droga (Denis), quantidade (Roberto) e o ato de entregar (Thiago ou Tiago) —, cometem-se injustiças de toda sorte.”

O advogado destacou que a situação já foi entendida pelo Ministério Público paulista, que pediu a mudança no enquadramento do crime cometido pelos clientes de Feller, por entender que os dois réus são usuários, e não traficantes de drogas. “As determinações postas no v. acórdão causaram-me espécie. A uma porque tentaram amordaçar minha liberdade argumentativa na discussão de uma causa, quando eu falava da tribuna, na condição de advogado”, complementou o criminalista.

Segundo o presidente da Comissão de Prerrogativas da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Cid Vieira, um procedimento de assistência ao criminalista foi aberto de ofício. Vieira ainda classificou a atitude do desembargador como excessivamente rigorosa. “A manifestação dele [Feller] é legítima. O advogado tem que ter a liberdade de tratar sobre o assunto.”

Ricardo Toledo, que foi presidente dessa comissão, concorda que houve rigor excessivo do magistrado no caso e ressalta que o caso de Feller é mais uma tentativa de se enfraquecer o direito de defesa. “A determinação dele [desembargador] é paradoxal.” Ele também destacou que todas as palavras de Feller foram proferidas na tribuna, que é um espaço onde é preciso fazer apontamentos técnicos, e que fatos como esse afetam a liberdade de atuação, pois colocam “uma espada na cabeça do advogado”. “A argumentação do advogado é inerente à causa.”

Clique aqui para ler a manifestação de Marcelo Feller.

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