Opinião

Ministério Público pode muito, mas não tem poder absoluto

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17 de maio de 2016, 16h01

A afirmação do novo ministro da Justiça Alexandre de Moraes causou grande desconforto ao novo poder central e revoltou os poderosos denunciados — os vários ministérios públicos do país. A própria mídia paulista (Folha de S.Paulo) pode ter se equivocado em sua manchete, atribuindo ao atual ministro a afirmação de que “nenhum direito é absoluto…”, quando, na verdade, o ministro, referindo-se à respeitável e poderosa instituição do Ministério Público afirmou que “O poder de um Ministério Público é muito grande, mas nenhum poder pode ser absoluto”.

Nesse sentido, o ministro Alexandre de Moraes, a rigor, não disse nada de novo, apenas repetiu algo que o próprio Supremo Tribunal Federal tem reiterado nos últimos tempos, qual seja, que sob a égide da Constituição Federal de 1988 não existe direitos e nem Poderes absolutos! Não fosse a hipertrofia que o Ministério Público vem, na prática, ostentando nos últimos tempos, não passaria de um “lugar comum” expressado pela referida autoridade, gerando, inclusive, manifestações acaloradas nos mais diversos segmentos, especialmente nas redes sociais.

Ninguém desconhece o perfil institucional do Ministério Público desenhado no texto constitucional, e, embora não o tenha classificado como um dos Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário), atribuiu-lhe a elevada função de “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (artigo 127), na Seção I do Capítulo IV, que trata “Das funções essenciais à Justiça”. Na realidade, o constituinte de 1988 não criou um quarto poder e tampouco atribuiu ao Ministério Público o status de tal Poder, embora muitos se achem e portem-se como tal. Atribuiu-lhe tão somente a condição de uma das Instituições exercentes de “Função essencial à Justiça” (vide Seção I, do capítulo IV do Título IV da CF). Nas seções seguintes desse mesmo capítulo, no mesmo nível, a atual Constituição elenca, ainda, como funções essenciais à Justiça, a Advocacia Pública (Seção II) e, finalmente, a Advocacia e a Defensoria Pública (Seção III), reconhecendo, igualmente, que “O advogado é imprescindível à administração da justiça” (artigo 133).

Com efeito, o legislador constituinte de 1988 não atribuiu à instituição do Ministério Público o status ou condição de um dos poderes da República, não lhe reservando um capítulo específico, como o fez em relação aos Três Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), dentro do Título IV da CF, em que cuida, repetindo, “da organização dos poderes”, alinhavando apenas aqueles três já conhecidos desde Montesquieu, a exemplo das maiores e melhores democracias ocidentais.

Não se desconhece, por outro lado, a hipertrofia que ganhou o parquet no cenário nacional, conquistando paulatinamente status semelhante, ao que gostam de afirmar, de uma espécie de quarto poder, arranhando com isso os limites constitucionais de sua atuação, indo além, portanto, das atribuições que lhe são asseguradas no Capítulo IV, Seção I, da CF, que trata “Das funções essenciais à justiça”.

Por tudo isso, não vemos nenhum exagero na lúcida manifestação do atual ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, ao destacar, na Folha de S.Paulo, que o Ministério Público pode muito, mas não tem poder absoluto. Essa insatisfação com uma simples manifestação do referido ministro extrapola o significado de suas declarações em entrevista a um periódico de tanto relevo.

Não se ignora a importância que o parquet desfruta no âmbito constitucional brasileiro, aliás, invejado por seus pares da comunidade europeia, por exemplo, que sonham em também conquistar as prerrogativas e atribuições institucionais desfrutadas pelo Ministério Público e, terrae brasilis, a partir da vigência da Constituição Federal de 1988. Mas toda essa gama de privilégios, poderes institucionais e prerrogativas equiparadas à magistratura nacional não o autorizam a invocar o status de um quarto poder, e, muito menos, imaginar-se dotado de poder absoluto, que nenhum poder da República tem.

A rigor a prática operacional do Ministério Público brasileiro, inclusive perante os tribunais, tem revelado um excessivo “poder” institucional, que a Constituição não lhe atribuiu, a ponto de empalidecer o exercício do Poder Jurisdicional, com graves prejuízos ao seu livre exercício, exclusivo do Poder Judiciário, repercutindo diretamente na sã, legítima e imparcial distribuição de Justiça. Com efeito, o próprio Poder Judiciário, com o passar dos anos, foi se encolhendo, diminuindo o seu espaço institucional, abdicando, silenciosamente, de parte de sua independência e neutralidade, submetendo-se à “decisão” do Parquet, intimidando-se de tal forma a ponto de ser incapaz de decidir em sentido contrário ao postulado pelo Ministério Público. De há muito não há paridade de armas, assegurada no texto constitucional. Isso significa, em última instância, que, na prática, quem anda decidindo, isto é, exercendo jurisdição, em muitos casos, tem sido o próprio Ministério Público, com raras e honrosas exceções. E essas exceções raras, quando ocorrem, são pressionadas, amedrontadas, e investigadas numa espécie de chantagem institucional com a abertura de “investigações sigilosas”, constrangendo aqueles julgadores que ainda têm coragem de decidir contrariando as pretensões ministeriais.

Para simplificar, e não nos aprofundarmos mais nessa linha, destacamos que, concordamos com a manifestação do ministro Alexandre de Moraes de que o Ministério Público pode muito, mas não apenas não tem poder absoluto, como também — e vamos além —, reafirmamos, não é o quarto poder da República, pois esse poder não consta da Carta Magna.

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