Opinião

Previdência de novos servidores da União diversifica riscos públicos e privados

Autor

  • Adacir Reis

    é presidente do Instituto San Tiago Dantas de Direito e Economia sócio do escritório Adacir Reis Advocacia ex-membro da Comissão de Juristas do Senado Federal para a Reforma da Lei de Arbitragem e Mediação e autor do livro "Curso Básico de Previdência Complementar" (editora Revista dos Tribunais).

7 de maio de 2016, 7h30

No último 29 de abril foi realizado, em Brasília, o Encontro Nacional da Previdência Complementar do Poder Judiciário, Ministério Público da União e Conselho Nacional do Ministério Público, promovido pela Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Judiciário (Funpresp-Jud).

Em tal evento, que contou com a presença dos ilustres Ministros Ricardo Lewandowski (Supremo Tribunal Federal), Ives Gandra Martins Filho (Tribunal Superior do Trabalho) e Maria Isabel Gallotti (Superior Tribunal de Justiça), além do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, tive a honra de falar sobre a evolução da legislação da previdência complementar brasileira.

A primeira lei federal (Lei 6.435/1977) sobre a previdência complementar remonta à década de setenta do século passado, depois sucedida pelas Leis Complementares 108 e 109, de 2001, que completam 15 anos de vigência neste mês de maio.

Nesses quase quarenta anos de disciplinamento legal da previdência complementar houve muitos avanços, embora ainda sejam necessários muitos aprimoramentos.

Em 1994 houve a abolição dos limites mínimos de aplicação das reservas dos fundos de pensão. Em 1996 disciplinou-se pela primeira vez o regime repressivo para a punição de condutas ilícitas no âmbito da previdência complementar, mais tarde aprimorado por um arcabouço administrativo mais completo. Em 2003 promoveu-se o disciplinamento da portabilidade, que permite a transferência de reservas de um plano previdenciário para outro. Em 2004, após décadas de debate, inclusive com a judicialização do tema, conquistou-se a isenção de imposto de renda sobre os rendimentos das aplicações dos recursos previdenciários das entidades de previdência privada (Lei 11.053). No final de 2009, no âmbito do Ministério da Previdência Social, foi criada a Superintendência Nacional da Previdência Complementar (Previc), com o fortalecimento do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), órgão regulador das atividades das entidades fechadas de previdência complementar.

Em 2012, com a Lei 12.618, foi aprovada a criação da previdência complementar dos servidores públicos federais, com a instituição, em 2013, da Funpresp-Executivo  e da Funpresp-Jud.

É preciso realçar que, não obstante a “natureza pública” da Funpresp-Exe e da Funpresp-Jud, os recursos previdenciários por elas geridos são privados, pois pertencem a titulares determinados, quais sejam, os servidores e membros de Poder que se associam a tais planos de previdência complementar, tornando-se participantes e assistidos, pouco importando o perfil privado, estatal ou público de seus patrocinadores.

Com o crescente aumento da longevidade e a concomitante queda da natalidade, um dos maiores desafios do mundo contemporâneo é garantir uma rede de proteção previdenciária que seja sustentável no longo prazo e assegure a indispensável dignidade das pessoas na fase mais avançada do ciclo da vida. Nos últimos 30 anos, e expectativa média dos brasileiros cresceu cerca de 11 anos. Como lembrado por Marcelo Abi-Hamia Caetano, economista do Ipea, a taxa de natalidade para manter a população brasileira estável deveria ser de 2,1 filhos por mulher, embora hoje seja de 1,7 e, em 2030, tal proporção cairá para 1,5 filho por mulher. Tais números revelam que o Brasil, em poucas décadas, pertencerá aos idosos, e não mais aos jovens, o que impõe grandes desafios para o sistema previdenciário nacional.

No serviço público, os regimes públicos de proteção previdenciária, geralmente baseados no pacto entre gerações (trabalhadores ativos ajuda a financiar os aposentados) e no regime orçamentário de caixa (repartição simples) tem se mostrado, em face de recorrentes crises fiscais, incapazes de oferecer a segurança jurídica almejada.

No Brasil, basta ver o que está acontecendo com os aposentados e pensionistas no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. Hoje há cerca de doze estados brasileiros caminhando celeremente para a insolvência, daí a necessidade da instituição da previdência complementar para os servidores públicos estaduais. Não vamos nem mencionar os regimes próprios de previdência dos servidores públicos municipais, um capítulo à parte que revela os inquietantes problemas do regime federativo brasileiro. As contas públicas federais também se deterioraram dramaticamente, a ponto de a relação dívida/PIB ensejar sérias preocupações. A crise fiscal brasileira não é apenas conjuntural, mas perigosamente estrutural.

Em países como Portugal, Espanha e Grécia, os aposentados já foram severamente prejudicados, em uma dura advertência de que o esgarçamento das finanças públicas acaba por sacrificar o próprio direito.

Por outro lado, é fato que os regimes de previdência privada, com a capitalização das reservas, submetem-se a riscos de mercado e às oscilações de bolsa de valores e de taxas de juros, além de dependerem de uma boa governança corporativa para a gestão eficiente dos investimentos e dos benefícios previdenciários.  

Diante dos prós e contras de cada modelo previdenciário, a experiência mundial revela que a estruturação de uma rede de proteção securitária ancorada em um modelo híbrido de regimes previdenciários tem se revelado bem sucedida: um regime público e outro privado, um com base em orçamento fiscal e o outro baseado na capitalização de reservas. A combinação de um regime previdenciário operado pelo Estado, tendo como premissa o pacto entre trabalhadores ativos e aposentados (pacto entre gerações), com um regime complementar, estruturado em governança própria e na capitalização das reservas, parece ser a tendência inevitável dos países desenvolvidos.

Portanto, o modelo previdenciário adotado para os novos servidores públicos da União, que promove a conjugação da previdência pública (regime de repartição simples) e da previdência complementar (Funpresp-Exe e Funpresp-Jud), parece constituir uma engenharia mais moderna de diversificação dos riscos estruturais que decorrem, respectivamente, dos orçamentos públicos e dos investimentos no mercado de capitais.

Para o regime de previdência complementar, em que os recursos previdenciários são investidos em diversos segmentos da economia e do mercado, as regras de governança das entidades de previdência complementar devem se pautar por um processo contínuo de aprimoramento, com o objetivo de blindá-las de qualquer ingerência política ou de interesses estranhos ao conjunto dos participantes e assistidos dos planos previdenciários. Portanto, é louvável o esforço que tem sido feito pelos dirigentes da Funpresp-Jud, por meio de sua diretoria-executiva, conselho deliberativo e conselho fiscal, no sentido de dar vida  a essa nova modalidade de previdência dos servidores públicos e membros do Poder Judiciário e do Ministério Público, com profissionalismo e transparência. 

Se previdência é “pré-vidência”, a busca de segurança jurídica também é fundamental. Nesse contexto, vale registrar que o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, em sua elevada missão jurisdicional, têm dado enorme contribuição para a segurança e para a estabilidade regulatória no âmbito das entidades fechadas de previdência complementar, pois sua jurisprudência tem reconhecido, com a devida ênfase, a autoridade da legislação federal (Leis Complementares 108/2001 e 109/2001) e da Constituição Federal (artigo 202).

Autores

  • é advogado, sócio do Reis, Tôrres, Florêncio, Corrêa e Oliveira Advocacia. Autor do livro Curso Básico de Previdência Complementar, Editora Revista dos Tribunais.

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