Justiça Tributária

Impostos cobrados de forma indevida são suicídios políticos

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

2 de maio de 2016, 11h49

“Quem não conhece a verdade não
passa de um tolo; mas quem a conhece
e a chama de mentira é um criminoso.”

B. Brecht (1898-1956)

Spacca
Nos municípios, impostos são mal administrados. Isso já foi examinado aqui. Cumprimos o Código de Ética da Fenaj e da OAB, por exercer as duas profissões. Não me omito na política. Isento pela idade, penso que votar deveria ser facultativo e proibido para analfabetos.

Fernando Haddad recebeu meu voto nos dois turnos. Na coluna Carta aberta ao prefeito de São Paulo, de 12 de agosto de 2013 deixei claras minhas razões: “Não acredito em ideologias ou partidos. Prefiro acreditar em pessoas. Foram sua excelente formação acadêmica e a crença nos valores morais que seus familiares lhe transmitiram que me fizeram entregar-lhe, na forma de dois votos singelos, os meus sonhos de termos uma cidade melhor para mim, minhas filhas e meus netos, todos nós paulistanos”.

Flávio D’Urso mereceu meu voto para vereador e deputado pelas mesmas razões. Na primeira, tinha 21 anos. Se for candidato neste ano, agirei da mesma forma. Jamais fiz ou farei voto de legenda. Não há partidos no Brasil e nenhum deles detém o monopólio da seriedade. Recentes acontecimentos atestam o fato.

José Serra prestigia Mauro Ricardo Costa, administrador de empresas pela FGV. Esse administrador é inteligente: foi aprovado como auditor da Receita Federal. A amizade com Serra existe. Explica os cargos que ocupou sem relação com sua formação ou conhecimentos de fiscal federal: Sudam, Copasa, Funasa etc. Presidiu ou foi membro de conselhos de administração e fiscal de empresas públicas federais, estaduais e municipais. Atividades bem remuneradas. Cargo na Petrobras não foi aceito por outra pessoa. O pagamento era só R$ 100 mil por mês.

Consultei o Padre Vieira (1608-1697): “Vota o conselheiro no parente, porque é parente; vota no amigo, porque é amigo; vota no recomendado, porque é recomendado; e os mais dignos e os mais beneméritos, porque não tem amizade, nem parentesco, nem valia, ficam de fora”.  

Encontrei na área tributária e no jornalismo o desprezo pela coisa pública nos pequenos municípios e capitais, nos estados e no governo federal. Cito cidades e pessoas para dar nome aos bois. Aponto o que políticos dizem não saber ou fingem não conhecer e aos eleitores o que alegam ignorar. Vi alguns resultados. Da notícia Deputado retira PL da delação premiada fiscal, de 20 de novembro de 2011, destaco:

“Após receber inúmeras críticas, o deputado Cauê Macris (PSDB-SP) resolveu retirar o Projeto de Lei 870/2010 da Assembleia Legislativa de São Paulo. O PL pretendia criar uma premiação para denúncias de sonegação fiscal, inclusive as anônimas. O presidente da OAB paulista, Luiz Flávio Borges D’urso, havia classificado o projeto como “absurdo” e “inútil”. A proposta também não ficou de fora dos debates entre participantes do XI Encontro dos Procuradores da Fazenda Nacional”.

Alguns políticos reconhecem seus equívocos. O que insiste no erro suicida-se politicamente. É possível que a assessoria deles não leia a coluna. Ou os assessores estejam ocupados com outras funções em outros lugares e não no lugar de seu trabalho. Trabalho cansa e faz envelhecer.

Governar é administrar prioridades. Assim, não pode ocorrer desprezo pela coisa pública ou ações não “republicanas”. Mas isso existe em todos os níveis de governo.

Municípios
O maior do país aplica impostos em coisas ou obras que não são prioritárias ou urgentes. Quer terminar tudo no último ano do mandato. Nada melhor que uma festa de inauguração para iludir o povo e gastar verbas de publicidade. Vamos só a três exemplos:

1) ciclovias onde não se vê bicicleta alguma na maior parte do tempo;
2) faixas de ônibus que nos condenam ao transporte público precário;
3) obras que nunca terminam (túnel sob a Rua 12 de outubro etc.).

Nesta capital, há tantas empresas públicas que é difícil enumerá-las ou saber para que servem. Supostamente para cuidar de placas de trânsito, ruas e calçadas, urbanismo, processamento de dados etc.

Alega-se que os empregados dessas empresas obedecem a CLT e podem ser contratados ou despedidos sem concurso. Assim loteiam-se cargos conforme o desejo de alguém, através de nepotismo ou indicação de político.

Mas se forem concursados, tais empregados só podem ser despedidos mediante processo administrativo. Isso está decidido em todas as instâncias da Justiça, mas os pagamentos das indenizações dependem da chamada modulação de efeito, que suspende o processo por tempo indefinido. Pode ser ruim para quem depende de receber, mas ótimo para quem pode esperar. Para o poder público é péssimo. O novo CPC pode acabar com isso e o STF deixará de decidir coisas insignificantes.

Ruy Barbosa na Oração aos Moços disse que maus governantes demitem os indemissíveis porque não são eles que pagam os prejuízos pela ilegal demissão. Isso vai mudar.

Pequenos municípios não fogem à regra. Nossa coluna do último dia 4 de abril mostra o que acontece em Itaporanga. A cidade não tem quase nada e o prefeito quer usar dinheiro para uma Festa de Peão! Tenta plagiar Paulínia, que trocou indústria cinematográfica por festa de peão. Parece que resolveram voltar atrás. Se for assim, o novo prefeito não é suicida.

Estados
Todos fazem com os impostos a mesma coisa: arrecadam, fiscalizam e jogam no lixo. Vamos agora a cinco exemplos:

1) empresas que não cumprem suas funções ou são cabides de emprego;
2) publicidade desnecessária, apenas demagógica ou eleitoreira;
3) obras mal planejadas, que precisam ser refeitas e nunca terminam;
4) transporte público péssimo, com trens novos sem uso e custo elevado;
5) desprezo ao ensino público e à segurança, com má remuneração.

Sabesp, Metrô e CPTM não cumprem suas funções ou são cabides de emprego. Quando a tubulação de água estoura, culpada é a prefeitura que não consertou a rua corretamente. Tubulação ninguém vê, não recebe placas ou proporciona festa de inauguração etc.

Se o Metrô não anda, culpados são os vândalos ou a queda de energia. Linhas não se concluem e os culpados são as empreiteiras, mesmo que se lhes concedam reajustes ou aumento de valores em seus contratos.

A CPTM virou caso de polícia: trens não servem para estudantes, homenageados com o nome de uma estação, bandidos assaltam passageiros, passarelas não concluídas fazem vítimas de atropelamento etc. Culpados são muitos, inclusive o governo federal que cobrou juros absurdos na dívida do Estado. Isso pode explicar parte do problema, mas não justifica a falta de planejamento, os valores atribuídos a desapropriações e outros fatos nebulosos.

Governo federal
É o que mais arrecada impostos numa carga tributária que dizem ser de 38%. Daí cabe à União 59%, aos estados 25% e aos municípios 16%.  Trata-se da estrutura ditatorial do poder, a obrigar que governadores perante o presidente e prefeitos perante governadores vivam de pires na mão. Eis o paraíso dos intermediários: senadores e deputados. Não por acaso beneficiários de concessões de rádio e TV, monopólio da União. Como é a União o maior poder, escolhemos sete exemplos:

1) empresas que não cumprem suas funções ou são cabides de emprego;
2) publicidade desnecessária, apenas demagógica ou eleitoreira;
3) obras mal planejadas, que precisam ser refeitas e nunca terminam;
4) transporte público péssimo, com trens novos sem uso e custo elevado;
5) desprezo ao ensino público e à segurança, com má remuneração;
6) abandono dos necessitados em relação ao seu direito à saúde;
7) pouco investimento em turismo, e que custa muito pouco.

Um amigo disse-me que fiquei com sete por ser um número cabalístico ou mágico. Se relacionasse mais alguns esgotaria meu espaço na coluna. As empresas do item 1 são conhecidas: Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Federal, Correios, Nuclebrás etc.

A publicidade parece que é para corromper a imprensa ou promover o crescimento de agências de propaganda. Anunciam-se coisas obrigatórias: o voto e o serviço militar. Ninguém deixa de votar. Se o fizer torna-se um pária: nem emprego consegue. Ninguém ingressa na escola se não comprova regularidade com o serviço militar.

Há muitas obras mal planejadas e abandonadas pelo governo federal. Isso vem desde o século passado, do tempo da ditadura militar e permanece ainda hoje. A Transamazônica é o maior exemplo. Outro é o desprezo ao projeto Mapitoba, citado em coluna da semana passada. Estradas de ferro abandonadas já se deterioram e a estrada federal que liga o sul da Bahia com o Tocantins não foi concluída. Mas em breve o problema acaba, com investimentos estrangeiros, inclusive no turismo, que o prefeito de Côcos (BA), promete incentivar.

Penso que a grande solução é privatizar tudo. Só Justiça e segurança devem pertencer ao Estado. Transporte público não existe. Acabaram-se as ferrovias e as poucas que sobrevivem são precárias ou limitadas como atração turística. O transporte de carga não cumpre sua função. Mais um problema do século passado. A solução é a mesma: privatização já! O Brasil não pode parar.

O ensino público precisa retornar ao passado: escolas decentes, professores bem remunerados, alunos educados. O quadro que vivemos hoje é triste e vergonhoso perante todo o mundo. As exceções deveriam ser a regra. Alunos vão à escola por causa da merenda e aí fica aquele jogo de empurra já conhecido. Quem tem dinheiro coloca seu filho na particular. Se a renda cai, vai para a pública. A solução não é privatizar, mas aplicar recursos desviados de sua finalidade para resolver.

Governar é escolher prioridades. A educação particular pertence a igrejas ou multinacionais. Na faculdade, pobre ingressa se tiver cadastro ou fiador. Quando sai começa a pagar. Poderá ser vítima dos capitalistas, mas isso é outro assunto. Sobre a saúde não preciso falar. Até analfabeto sabe disso.

Mas sobre o turismo o governo ajuda muito se não atrapalhar. O ministério que diz cuidar do assunto deve ser eliminado. O presidente tem palavra. Acabará com ministérios inúteis. Até empresários pequenos do setor sabem vencer nessas selvas, praias, montanhas, rios e cascatas. Tudo a preço justo com paisagens perfeitas.

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    é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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