Distinção prejudicial

Com delações, MPF privilegia empresas e réus mais poderosos, diz advogado

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18 de junho de 2016, 17h51

A escolha de quais delações premiadas são aceitas pelo Ministério Público Federal na operação "lava jato" e a falta de dosimetria em relação aos benefícios concedidos aos delatores têm privilegiado as empresas maiores e os réus mais poderosos, prejudicando os menores. A afirmação é do advogado Figueiredo Basto, conhecido por atuar em delações, em entrevista à Folha de S.Paulo.

"Temos que aprender a graduar as contribuições de acordo com seu valor, e não negá-las. Hoje o que acontece é que quando o MPF escolhe determinadas empresas ou pessoas para fazer a delação, privilegia os maiores e prejudica menores."

Considerado um especialista em colaboração premiada por ter 20 clientes na "lava jato", entre eles o ex-senador Delcídio do Amaral (MS) e o doleiro Alberto Youssef, Basto diz que é preciso estar atento às práticas da operação, pois nem todas são adequados, e que as críticas às investigações não podem ser levadas de maneira inquisitória. "Criticar uma operação é bem diferente de obstruí-la."

Políticos encolhidos
Em relação aos efeitos políticos das investigações, Basto deixa claro que o governo deve ser mais contundente em seus atos, não podendo ficar refém da possibilidade de a operação atingir um dos seus ou ser mal visto pela opinião pública por tomar medidas que possam ser vistas como impopulares. "Hoje o Brasil está imobilizado por falta de coragem de enfrentamento."

Uma atitude ausente no governo interino, e também nas casas legislativas, segundo Basto, é a falta de imposição de hierarquia, para delinear perfeitamente os limites entre os poderes e evitar uma invasão indevida entre instituições. "É preciso mais do que nunca atitude forte e corajosa por parte do Executivo e do Legislativo para dizer não, colocar a hierarquia de uma forma correta, quem manda e quem obedece. Tem muita gente dando palpite em assunto que não podia dar."

Entre esses "palpites" estariam 10 medidas de combate a corrupção promovidas por alguns integrantes da operação "lava jato" e tantos outros membros da magistratura e do Ministério Público. O advogado afirma que é preciso delimitar quem pode ou não fazer exigências ao legislativo para pautar determinadas matérias.

"Não podemos querer influenciar esses poderes, sob pena deles terem suas raízes constitucionais ameaçadas. A operação é fundamental para o país, mas é preciso que se dê ao Estado capacidade de mobilização. Nem todas as pessoas de um governo são corruptas", argumenta Basto.

Striptease moral
Para o profissional, o Judiciário apenas assumiu a relevância atual e a representatividade frente à população por pura falta de opção da sociedade. "A 'lava jato' fez o strip-tease moral do Executivo e do Legislativo, e eles continuam com dificuldade de se movimentar para sustentar seus anseios. Ainda mantêm figuras como o [presidente do Senado] Renan Calheiros (PMDB/AL) cargos importantes."

Questionado sobre a possibilidade de um partido firmar acordo de leniência, ele diz que a ideia não é das melhores. "Sou contra. Quando um partido trai seus ideais e eleitores, não é o caso de negociar anistia. Isso não falo sobre o PT, mas sobre todos as siglas."

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