Vida de abnegação

Monge de 83 anos que fez voto de pobreza não recebe benefício assistencial

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17 de julho de 2016, 7h25

O benefício assistencial que garante um salário mínimo mensal ao deficientes ou idosos com mais de 65 anos deve ser concedido a pessoas que vivem em situação de extrema vulnerabilidade social. E não como um meio para obtenção de remédios, em substituição às políticas públicas de saúde. O fundamento levou a 1ª Vara Federal de Santa Maria (RS) a julgar improcedente o pedido de um monge, doente, para receber o Benefício da Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC-Loas).

O autor ingressou com ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social, alegando que teve a solicitação de benefício de amparo assistencial ao idoso negada por ser cidadão alemão. Relatou que tem 83 anos e que veio para o Brasil em 1986. Pontuou ainda que é monge da Ordem dos Cartuxos, vivendo mosteiro localizado no interior gaúcho.

O INSS contestou, defendendo que não é possível conceder o BCP-Loas a quem possui nacionalidade estrangeira. Argumentou ainda que ele não comprovou a efetiva existência do estado de miserabilidade.

Vulnerabilidade social
Ao analisar o conjunto probatório anexado aos autos, o juiz federal Ézio Teixeira destacou que a Turma Regional de Uniformização da 4ª Região já firmou o entendimento de que o estrangeiro, residente legalmente no país, possui direito ao benefício assistencial se dele necessitar. Segundo ele, de acordo com a legislação regente da matéria, para receber o Loas, é preciso comprovar ser pessoa idosa e não possuir meios de garantir a própria manutenção ou de tê-la provida pela família.

Para o magistrado, o requisito etário foi comprovado pelo autor, restando verificar a questão da miserabilidade. Ao longo da tramitação processual, foram realizadas avaliação socioeconômica e inspeção judicial, além de pesquisas junto à Arquidiocese de Santa Maria e ao posto de saúde do município onde mora o idoso.

A perícia apontou que o homem vive no mosteiro em regime de clausura e sob voto de pobreza. O local, apesar de construído há muitos anos, está em bom estado de conservação. Ao fazer a inspeção judicial, o juiz também concluiu “que o autor, ao optar por fazer parte da Ordem dos Cartuxos, como monge, escolheu uma vida de abnegação material e contemplação espiritual, na qual os bens materiais são simples e limitam-se aos estritamente necessários a uma vida digna, sem confortos supérfluos, em obediência ao voto de pobreza”.

Segundo Teixeira, todos aqueles que vivem no mosteiro, além das atividades de oração, realizam os serviços necessários para a manutenção do local, fazendo trabalhos agrícolas, de carpintaria, lavanderia, entre outros. A Ordem dos Cartuxos não recebe ajuda da Igreja Católica, mas obtém recursos do arrendamento uma área de terra e da venda dos produtos cultivados.

A partir dos elementos agrupados no processo, o juiz entendeu que o valor do benefício assistencial pleiteado seria utilizado para a compra de medicamentos, porque os bens materiais essenciais à manutenção do monge já são supridos pelo Mosteiro.

O juiz destacou que não ignorava o fato do homem ser uma pessoa idosa e doente, além de um trabalhador dedicado às questões espirituais e à preservação do meio ambiente. Contudo, entendeu que a situação do autor não se amolda à hipótese prevista para a concessão do benefício, pois suas condições pessoais, materiais e sociais não caracterizam miserabilidade ou vulnerabilidade social.

‘‘No entanto, ressalto que o benefício assistencial não pode ser utilizado como substitutivo às políticas públicas de saúde, que devem ser ofertadas pelo Poder Público, seja através de suas esferas administrativas, seja por meio das demandas judiciais próprias, destinadas especificamente à obtenção de medicamentos e tratamentos de saúde ainda não disponibilizados na rede pública’’, escreveu na sentença, lavrada no dia 30 de junho. Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Com informações da Assessoria de Imprensa da Justiça Federal do RS.

Clique aqui para ler a sentença modificada.

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