Cobrança nas alturas

Teori derruba normas que fixaram custas processuais de até R$ 87 mil no Ceará

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2 de julho de 2016, 6h42

Embora taxas judiciárias possam ter o valor da causa como base percentual, isso não autoriza que a cobrança seja totalmente desvinculada do custo do serviço, já que têm natureza tributária. Assim entendeu o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, ao conceder liminar para suspender a validade de algumas custas processuais estipuladas em 2015 para quem precisa do Poder Judiciário do Ceará. 

A nova tabela determinava que, para a parte ajuizar ação em causas acima de R$ 84.000,01, as custas seriam calculadas com base em 2,54% do valor total, com limite de R$ 87.181,97 (na regra anterior, o teto era R$ 1.235,90). Situação semelhante ocorreu com agravos de instrumento e recursos de apelação, que antes tinham valor fixo (R$ 57,63 e R$ 31,02, respectivamente). A partir da Lei Estadual 15.834/2015, estipulou-se 4% sobre o valor da condenação ou da causa, também até R$ 87.181.97.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados moveu ação no STF questionando as mudanças e apontando variações que chegavam a 280.000%, no caso dos recursos. A entidade calculou que, enquanto na regra anterior uma causa de R$ 5 milhões exigiria desembolso de R$ 4.395 (entre custas iniciais, agravo e apelação), a partir de 2016 o valor saltou para R$ 224.363.

A mudança, segundo a OAB, também prejudicava casos mais simples, porque a lei extinguiu duas faixas de cobrança no ajuizamento da ação: antes, havia previsão de valores para causas de até R$ 50 e entre R$ 50,01 e R$ 100. A partir da nova tabela, qualquer causa de até R$ 400 pagaria o mesmo valor.

Tabela para ajuizamento de novas ações:

Valor da causa

Custas em 2015

Custas em 2016

Até R$ 50,00

R$ 34,19

R$ 105,53

Até R$ 100,00

R$ 68,33

R$ 105,53

Até R$ 400,00

R$ 88

R$ 105,53

[…]

[…]

[…]

Acima de R$ 84.000,01

R$ 1.235,9

De R$ 2.133,60 a R$ 87.181,97

A Ordem apontou ainda outros dois problemas: a expedição de alvará de levantamento de valores passou a custar 2% do valor liberado, além da cobrança sobre o processamento de recursos destinados a tribunais superiores. Todas essas alterações, de acordo com ação, violam a proporcionalidade entre o serviço público prestado e o valor cobrado, com efeito de confisco ou com meros fins arrecadatórios, violando a Constituição Federal.

Já o Estado respondeu que a tabela foi refeita depois de 15 anos do regime anterior, levando em conta o crescimento dos gastos do Poder Judiciário no período. Assim, alegou que não faria sentido comparar os novos valores com os anteriores, pois foram adequados ao cenário atual, e não apenas passaram por mera atualização monetária.

Barreiras no acesso à Justiça
Teori suspendeu os dispositivos questionados até o julgamento do mérito. A princípio, identificou “exorbitância do valor exigido a título de custas jurisdicionais, o que, nos termos da Súmula 667 do STF, […] afronta igualmente o direito ao livre acesso ao Poder Judiciário”. O ministro afirmou que, como qualquer tributo, custas judiciais devem sempre ter correlação com o custo real do serviço sobre as quais incidem.  

Carlos Humberto/SCO/STF
Valores fixados no Ceará  violavam livre acesso ao Poder Judiciário, disse Teori.

“É sob essa ótica que, em relação às causas de valor acima de R$ 84.000,01, o percentual cobrado, aliado ao patamar estipulado como limite máximo das custas, confere plausibilidade jurídica da tese sustentada na inicial, razão pela qual se reputa cabível a suspensão cautelar”, concluiu.

Ele mandou ainda restaurar as faixas para valores mais baixos. “A nova tabela já causa perplexidade por prever o pagamento de custas superiores ao valor da causa, quando esse for inferior a R$ 105,00, com aumento percentual de 208,66% ao se comparar com as custas cobradas sobre a extinta faixa de ações de até R$ 50,00. Assim, em relação às ações de valor igual ou inferior a R$ 105,00, há nítido efeito confiscatório, razão pela qual devem ser revigorados os patamares anteriores.”

Medida simples
O ministro ainda proibiu a cobrança por expedição de alvará de levantamento de valores, por se tratar de “simples documento, não dotado de qualquer complexidade, que, amparado em decisão judicial, indica o quantum a ser levantado e seu beneficiário”.

Sobre as custas judiciais para o processamento de recursos destinados a tribunais superiores, afirmou que já é pacífica na corte a tese de que só a União tem essa competência, mesmo que tribunais tenham gastos materiais na fase de juízo prévio de admissibilidade recursal e na hora de encaminhar os autos ao STF e ao Superior Tribunal de Justiça.

O presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia, disse que a decisão é importante pois a norma cearense comprometia “o sagrado direito ao acesso à Justiça”, com valores “destoantes e incompatíveis com a isonomia que deve ser assegurada ao jurisdicionado”. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB.

Clique aqui para ler a decisão.
ADI 5.470

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