Fosfoetanolamina sintética

Justiça manda USP fornecer "cápsula contra o câncer" a mulher de 41 anos

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30 de janeiro de 2016, 13h16

A falta de registro de uma droga perante a Agência Nacional de Vigilância Sanitária não impede o seu fornecimento. Com esse entendimento, o Juizado Especial Federal de São Paulo concedeu liminar a uma mulher de 41 anos para que a Universidade de São Paulo lhe forneça o medicamento fosfoetanolamina sintética, como forma de tratamento alternativo para a cura de seu câncer. Diagnosticada com a doença há dois anos, a autora da ação foi submetida a cirurgia de retirada do tumor e tratamento quimioterápico convencional, mas ainda assim a doença progrediu.

Na decisão, o juiz federal Ricardo William Carvalho dos Santos explica que a substância foi produzida pela primeira vez no Instituto de Química da USP de São Carlos (SP) e tem a função de auxiliar no tratamento contra o câncer. Ele destacou que, durante anos, mesmo sem o registro na Anvisa, o medicamento foi produzido e distribuído gratuitamente. Porém, a produção e a distribuição da fosfoetanolamina sintética estão suspensas desde junho de 2014, enquanto não houver liberação dos órgãos competentes.

O juiz observou que o pesquisador da USP Renato Meneguelo elaborou tese de mestrado registrando que, nos estudos feitos em camundongos, ocorreu significativa redução da carga tumoral, mostrando inibição da capacidade de crescimento e metástases.

Segundo Gilberto Orivaldo Chierice, químico da USP que desenvolveu a fosfoetanolamina sintética, trata-se de “uma substância idêntica à produzida pelo nosso organismo, só que em um alto nível de pureza e em grandes concentrações”. O magistrado também registra que a droga é de baixíssimo custo de produção (R$ 0,10 por cápsula).

Para o juiz do JEF, a falta de registro da droga perante a Anvisa não impede o seu fornecimento. Na decisão que concedeu a liminar, ele diz que “já se admite o uso de medicamentos a partir de relatos de melhora produzidos em outros pacientes, como tem acontecido, por exemplo, com o uso de substâncias derivadas da cannabis sativa, popularmente conhecida como maconha, para tratamento de epiléticos”.

O juiz federal também ressalta que a própria Lei 6.360/76, que dispõe sobre a vigilância sanitária, dispensa a necessidade de registro em situações excepcionais. Para ele, ainda que em princípio não seja indicado o fornecimento de medicamentos que não possuam registro, no caso da autora, em que houve progressão da doença apesar do tratamento, isso permite a relativização da regra.

A decisão também destaca que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu decisão da Presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo que determinou o sobrestamento das liminares concedidas a respeito do fornecimento da fosfoetanomina sintética.

“A simples leitura da Constituição Federal com base na ‘dignidade da pessoa humana’ e no ‘direito à vida’ nos permite garantir o fornecimento da droga à autora, vez que tais garantias não são meros exercícios de retórica, podendo-se impor ao Estado o dever de garanti-las de diversas formas”, escreveu o juiz federal.

Ele também mencionou a teoria chamada de "Right to Try" (Direito de Tentar), que consiste em um novo movimento para fazer com que drogas experimentais sejam disponibilizadas para os doentes sem resposta ao tratamento convencional.

Além disso, o magistrado observou que começa a crescer na doutrina e na jurisprudência a aplicação do direito fundamental de disposição do próprio corpo e do respeito à autonomia de vontade, “teses que são favoráveis à parte autora e que devem ser levadas em consideração quando do exame da tutela antecipada”.

O juiz federal salientou que o exame da questão do uso da droga não está sendo feito de forma genérica, mas levando em consideração um caso concreto que chegou ao Poder Judiciário, em que há grave estado de saúde da parte autora e progressão da doença mesmo com a utilização do tratamento convencional.

“O Estado tem o dever (levando em conta a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais e de acordo com o status positivus de Jellinek) de realizar a prestação positiva que possibilite a satisfação da necessidade de saúde (direito de todos e dever do Estado, com caráter universal) da parte autora, nem que a necessidade seja suprida apenas no plano psíquico, por gerar na parte autora e em sua família a conformação diante da morte, tendo em vista que foram utilizados todos os meios disponíveis e razoáveis para a manutenção da vida”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-3.

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