Opinião

A crise no agronegócio brasileiro e a possibilidade de recuperação judicial

Autor

  • Bruno Oliveira Castro

    é advogado professor universitário especialista em Direito Empresarial pela UFMT e doutorando em Ciência Jurídica e Social pela Universidad Del Museo Social Argentino.

17 de janeiro de 2016, 5h58

Diante da crise que começa a atingir a economia brasileira, é necessário voltarmos os olhos e a nossa atenção ao agronegócio.

A dolarização desse mercado, a variação de preços, os fatores climáticos e o fluxo da produção são preocupações constantes. É imprescindível garantir a comercialização da safra como forma de superação dos novos e maiores prejuízos para o setor e para a economia.

Constata-se que o agronegócio no Brasil, além de fomentar a economia, gera milhares de empregos diretos e indiretos, sendo naufragado pela crise que nos acomete. É necessário rever as políticas de garantia, de preços e do seguro rural.

A dívida rural de muitos produtores se acumula há mais de dez anos com incontáveis renegociações. Esse cenário fica pior ao considerarmos que o produtor, independentemente de seu porte, ao buscar recurso para o plantio, pactuou o pagamento na moeda americana que representava em real entre R$ 1,80 a 2,70. Em decorrência da falta de credibilidade que perdemos no mercado externo e interno em razão da má gestão financeira nacional, especialmente a corrupção, fez com que o dólar disparasse a patamares superiores a R$ 4. Com isso, é perceptível que a dívida no agronegócio dobrou. Não há margem de lucro que supere essa realidade.

A Lei 11.101/2005 cuida da falência e recuperação de empresas, de maneira que contempla em seu artigo 1° a sua aplicabilidade exclusivamente aos empresários e sociedade empresarial, conforme o conceito estabelecido nos artigos 966 e 982 do CC.

Deve-se considerar o artigo 967 do CC, sobre a obrigatoriedade da inscrição do empresário no órgão competente.

Todavia, para fins de requerimento de recuperação judicial, impõe o artigo 48 da Lei 11.101/2005 que o devedor deve exercer regularmente a atividade empresarial pelo período de dois anos. Em outras palavras, para requerer recuperação judicial, o devedor, obrigatoriamente, deve demonstrar que possui atividade há, no mínimo, dois anos.

No tocante a atividade rural, de acordo com o tratamento previsto no Código Civil de 2002, quem se dedica à atividade rural poderá ingressar no regime empresarial por opção, mediante o arquivamento no Registro Público de Empresas, a cargo das juntas comerciais. Nesse sentido, o artigo 971 do Código Civil dispõe que ao produtor rural que faça da atividade rural a sua principal atividade pode se registrar na Junta Comercial, oportunidade em que fica equiparado ao empresário, estando sujeito a todas as obrigações previstas aos empresários.

Importante lembrar que o produtor rural tem a faculdade de registrar-se na Junta Comercial e, tendo em vista que exerce atividade empresarial rural, constata-se que o registro é uma mera formalidade, não podendo ser excluído da recuperação judicial, vez que não é o registro na Junta Comercial em si que torna um sujeito empresário, e sim o fato de exercer profissionalmente uma atividade econômica organizada para produzir ou circular bens ou serviços. O registro na Junta Comercial é somente uma obrigação declaratória do empresário nessa hipótese específica do produtor rural.

Cumpre a atividade rural um relevante papel socioeconômico, uma vez que produz bens e serviços importantes para o desenvolvimento humano, gerando, com isso, arrecadação tributária para os estados e, principalmente, empregos diretos e indiretos, além de equilibrar as contas públicas e a balança comercial.

É da atividade rural e da empresarial que depende, diretamente, a maior subsistência da população ativa do país, por meio principalmente do trabalho assalariado.

Ao Direito cabe cumprir o papel de regular a crise empresarial e precaver mecanismos que possam ajudá-la, enquanto possui viabilidade econômica.

Dessa forma, em atenção à relevância socioeconômica da empresa para a sociedade brasileira, a Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, beneficiou o denominado princípio da preservação da empresa, o qual é um postulado do princípio da função social da empresa.

Conclui-se, diferentemente dos outros segmentos, que o produtor rural possui a faculdade de registrar-se na Junta Comercial (artigo 971 CC), devendo a este ser dado um tratamento diferenciado, por toda função social e econômica que representa para a nossa economia.

Importante considerar que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 6.279/2013 que facilita a recuperação judicial de produtores rurais. Atualmente, apenas o agricultor que optou por fazer parte do regime empresarial (registrado na Junta Comercial há dois anos) pode pedir recuperação judicial, pois estará equiparado a todas as obrigações e outros benefícios previstos para os empresários.

Numa análise sobre o tema, conclui-se que é possível ao produtor rural requerer a recuperação judicial ainda que não tenha os dois anos de registro na Junta Comercial. Para que essa situação se concretize, o produtor rural deve efetivar seu registro na Junta Comercial para que fique comparado ao empresário para todos os efeitos, todavia, deve demonstrar por meio de cadastros federais e estaduais o efetivo exercício da atividade rural, além de inúmeros outros documentos que podem ser exigidos como forma de provar que exerce a atividade rural há mais de dois anos e, assim, suprir o prazo descrito no artigo 48 da Lei de Recuperação de Empresas, haja vista que, como já dito alhures, o registro do produtor rural revela-se mera formalidade, que pode ser suprida pela comprovação do pleno exercício da atividade rural.

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    é advogado, professor universitário, especialista em Direito Empresarial pela UFMT e doutorando em Ciência Jurídica e Social pela Universidad Del Museo Social Argentino.

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