Passado a Limpo

O caso de pedido de indenização na pacificação do Rio Grande do Sul, em 1931

Autor

  • Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

    é livre-docente pela USP doutor e mestre pela PUC- SP e advogado consultor e parecerista em Brasília ex-consultor-geral da União e ex-procurador-geral adjunto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

7 de janeiro de 2016, 7h00

Spacca
Em 1931, logo após o movimento revolucionário que derrubou Washington Luís e instaurou o governo Getúlio Vargas, a Consultoria-Geral da República enfrentou uma série de dúvidas jurídicas que surgiram da movimentação revolucionária da década de 1920. A pacificação no Rio Grande do Sul, o que ensejou uma união de forças que levou Getúlio ao poder, fora cimentada pelo Pacto de Pedras Altas. Naquela ocasião, o governo federal assumia dever de indenizar danos causados à propriedade particular, por ambas as facções em luta.

O autor do parecer é Levi Carneiro (1882-1971), que como consultor-geral da República exerceu importantíssimo papel na criação da Ordem dos Advogados do Brasil, da qual foi seu primeiro presidente, a par de ter presidido também o Instituto dos Advogados do Brasil. O parecerista reconheceu o acerto do pedido, negando-o, no entanto, por causa da prescrição, o que, do ponto de vista da teoria geral do Direito, nos força a refletir que matéria prescricional seja, substancialmente, questão de mérito, obstaculizando que o julgamento desse seja conhecido. Segue o parecer:

“Exmo. Sr. Ministro da Justiça e Negócios Interiores.

Com Aviso n. 1.312, de 5 de outubro último, transmitiu-me V.Excia. o processo incluso, referente ao requerimento do Banco Internacional de Finanças, como procurador de Juan M. Antunez & Filhos, para pagamento de indenização, a que se julga com direito pelos prejuízos causados na Estância Figueira, no Estado do Rio Grande do Sul, pelas forças que tomaram parte na revolução de 1923.

A indenização pedida monta a 1.822:617$200, conforme o laudo da vistoria processada perante o Juiz Federal da Seção, e funda-se na cláusula 8ª do chamado Acordo de Pedras Altas, pela qual o Governo Federal se responsabilizou pelo pagamento dos danos causados aos particulares de qualquer facção.

Por força dessa mesma cláusula, o Governo Federal nomearia uma comissão de árbitros para o fim de examinar a procedência legitimidade das reclamações e avaliação do quantum devido a cada reclamante.

Ao que se lê na informação do Sr. Dr. Diretor da 2ª Seção do Interior dessa Secretaria de Estado, essa reclamação figura entre as que foram julgadas líquidas pela Comissão de Reparações.

Parece que, diante dessa decisão, e nos termos da cláusula citada, não há, talvez, que esmiuçar a plena validade da prova produzida. Essa prova é, aliás, em parte considerável, especialmente quanto à matança, extravio e roubos de gado, apenas circunstancial, e, em processo judicial regular, não teria, só por si, valor decisivo.

O pacto acima referido parece, aliás, ter reconhecido precisamente a dificuldade ou a impossibilidade da prova judicial, instituindo a Comissão aludida. E se esta reconheceu o direito dos suplicantes, parece que nada se opõe ao pagamento devido.

Quanto à prescrição, se o direito dos reclamantes foi reconhecido há mais de 5 anos, e a demora havida lhes for imputável, nada tendo requerido nesse longo decurso de tempo, parece-me que o seu direito está realmente extinto.

Reitero a V.Excia. a segurança de minha alta estima e distinta consideração.

Rio de janeiro, 20 de novembro de 1931.

(a.) Levi Carneiro”.

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