Luta contra arbítrios

Juiz pode reexaminar provas em HC para confirmar indícios de autoria

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26 de fevereiro de 2016, 17h48

Embora o Habeas Corpus não admita o reexame de provas, o juiz pode verificar se há indícios de autoria suficientes para justificar a prisão preventiva do acusado. Com esse entendimento, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais concedeu parcialmente a ordem em HC e substituiu a detenção provisória de um suspeito de furto qualificado e formação de quadrilha por medidas cautelares.

No caso, um homem foi acusado de ter furtado joias de um apartamento em Itaúna. Como prova da autoria, a vítima apresentou imagens da câmera de segurança do condomínio que mostram, segundo a acusação, o investigado, sua mãe e o companheiro dela no local. Nesse vídeo, eles vão embora do local em um carro registrado em nome dessa mulher.

Para fortalecer seu argumento, o Ministério Público alegou que os três já haviam sido reconhecidos como autores de outro furto a apartamento com o mesmo modus operandi. Por tal razão, os promotores pediram — e obtiveram — a prisão preventiva deles. Contra o encarceramento do filho da mulher, os advogados dele, Douglas Lima Goulart e Thiago Edson, do Lima Goulart Advocacia Criminal, impetraram HC.

Ao analisar o remédio constitucional, o relator do caso, desembargador Marcílio Eustáquio Santos, apontou que, normalmente, esse instrumento não deve ser usado para reexaminar prova de autoria de crime. Contudo, se documentos juntados pela defesa gerarem significativa dúvida sobre se o acusado foi o autor da conduta imputada a ele, o juiz poderá considerá-las para relaxar prisão, afirmou.

“Entretanto, conquanto a prova robusta da autoria não comporte análise no presente writ, a verificação da existência dos indícios de autoria delitiva encontra espaço profícuo em tal ação constitucional, mesmo porque tais elementos constituem, ao lado da materialidade do crime, o primeiro pressuposto para a decretação da prisão preventiva, ante o estatuído pelo artigo 312 do Código de Processo Penal”, sustentou o magistrado.

E Santos considerou fortes as provas juntadas pela defesa, como o depoimento registrado em cartório de testemunhas garantindo que, no dia e hora do delito, ele estava em São Paulo — distante 540 quilômetros de Itaúna — por causa de um evento esportivo. Além disso, o desembargador avaliou que a qualidade do vídeo da câmera de segurança não permite concluir que é o acusado nas imagens, apenas sua mãe e o companheiro dela.

Em caso de dúvida sobre a autoria de um crime não violento, ela deve ser dirimida em favor do acusado, destacou o relator. “Não se pode perder de vista que, no Estado Democrático de Direito, a liberdade é a regra, e que a Constituição da República de 1988 preconiza a presunção de não culpabilidade como garantia fundamental do indivíduo. Sendo assim, a liberdade do paciente somente pode ser restringida antes do trânsito em julgado de sentença condenatória, quando estreme de dúvidas a presença dos requisitos fáticos e instrumentais (artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal) exigidos pela nova sistemática processual penal.”

Como não enxergou mais essas exigências legais no caso, Santos votou pelo relaxamento da prisão preventiva. Contudo, concluiu ser necessária a imposição de outras medidas cautelares e determinou que o acusado compareça periodicamente à Justiça para esclarecimentos. Os demais desembargadores da 7ª Câmara Criminal seguiram o relator.

Na opinião do advogado Douglas Lima Goulart, a decisão pode significar uma mudança de paradigma no processo penal brasileiro. Mesmo com esse ineditismo, o criminalista não acredita na reversão do acórdão no Superior Tribunal de Justiça ou no Supremo Tribunal Federal. Isso porque, de acordo com ele, os desembargadores deixaram claro que só é possível a análise das provas para verificar a possibilidade de manutenção da prisão preventiva.

Clique aqui para ler a íntegra da decisão.
HC 1.0000.15.104126-6/000

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