Façam suas apostas

O jogo político da escolha do novo ministro da Suprema Corte dos EUA

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18 de fevereiro de 2016, 14h34

A essa altura, já são poucas as notícias sobre a morte do ministro Antonin Scalia, que aconteceu no último sábado (13/2). Uma pequena notícia sobre o funeral no próximo sábado ou uma notinha sobre “teorias da conspiração” que desconfiam da morte do ministro por causas naturais. A grande preocupação da imprensa parece ser o processo de escolha do jurista que irá ocupar a cadeira de Scalia na Suprema Corte dos EUA.

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Morte de Scalia, no fim de semana, desencadeou corrida pelo seu posto.
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Na terça-feira (16/2), o presidente Obama deu o tom de como será o escolhido: “Uma mente jurídica excepcional, que valorize a democracia e o estado de Direito, que servirá a corte com honra e integridade, mesmo que não concorde com a minha política”. Mas a substituição de Scalia está definitivamente à mercê da política.

Obama já disse duas vezes que cumprirá sua obrigação constitucional de submeter o nome do ministro escolhido ao Senado em breve. Mas os políticos republicanos querem que o novo ministro só seja nomeado pelo presidente que será eleito no final deste ano e que tomará posse em janeiro de 2017, o que significa que o cargo permaneceria vago por mais de um ano.

Os republicanos têm o poder de matar a indicação em seu nascedouro, porque dominam o Comitê Judiciário do Senado. Mas, se o fizerem, podem ser acusados de obstrucionistas — o obstrucionismo dá uma ideia de que se está trabalhando contra o país. Isso irá descontentar os eleitores não filiados a qualquer partido. A eleição entre um candidato republicano e um democrata é equilibrada dentro do universo dos dois partidos. Assim, quem a decide, no final das contas, são os eleitores não filiados ou indecisos.

Por isso, os republicanos estão elaborando uma espécie de “operação tartaruga” para disfarçar o obstrucionismo: irão trabalhar na nomeação, mas irão se mover bem devagar no comitê, pedindo mais e mais informações, por exemplo. Finalmente irão levar a votação ao plenário, mas, então, deverão votar em bloco contra a nomeação. Se conseguirem fazer isso duas ou três vezes, chegarão perto do fim do mandato do presidente Obama e a escolha ficará, finalmente, para o próximo presidente eleito.

Apostas
A par das estratégias para acelerar ou retardar a nomeação do novo ministro, a comunidade jurídica americana, os políticos e principalmente a imprensa fazem suas apostas em possíveis nomes com capacidade de vencer os entraves políticos — os que já estão na mesa e os que ainda irão aparecer. A discussão se tornou tão empolgante que o site Above The Law criou um “guia para os jogadores”, em que atribui, com base em probabilidades, a cotação de cada “concorrente”.

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Srinivasan é o mais cotado para nova vaga na Suprema Corte dos EUA.
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O nome com maior cotação é do juiz do Tribunal de Recursos do Distrito de Colúmbia (D.C.) Sri Srinivasan, cotado com 5-2 (ou seja, está “pagando” 5 por 2). Esse tribunal é uma fonte de ministros. Dele vieram Antonin Scalia e os ministros John Roberts, atual presidente da corte, Ruth Ginsburg e Clarence Thomas.

Srinivasan, um indiano-americano de 48 anos, foi confirmado pelo Senado para o tribunal de recursos, em 2013, por 97 votos a 0. Isso significa que qualquer votação contra ele agora seria um ato puramente obstrucionista. Apostam em seu nome, além do Above The Law, a CNN, o The New York Times, o USA Today, o Wall Street Journal e o The National Law Journal. Ele é experiente: defendeu 25 casos na Suprema Corte, antes de se tornar juiz.

Porém, contra essas poderosas publicações, há a aposta do poderoso blogueiro Tom Goldstein, que mantém o SCOTUS blog (ou Supreme Court Of The United States blog). Goldstein tem a seu favor um histórico de previsões acertadas, de acordo com o Jornal da ABA (American Bar Association). Por exemplo, ele previu corretamente as duas últimas nomeações das ministras Sonia Soutomyor e Elena Kagan.

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Blogueiro que acompanha Suprema Corte aposta no nome de Loretta Lynch.
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Goldstein aposta no nome da atual procuradora-geral dos EUA Loretta Lynch, que foi confirmada pelo Senado e assumiu o cargo em abril de 2015. Ela foi, em sua carreira profissional, promotora e procuradora, o que indica, na visão americana, que ela pode ser uma jurista competente, sem ser tão liberal, como poderiam temer os conservadores republicanos.

Além disso, sua nomeação oferece duas grandes vantagens, neste ano eleitoral: ela é mulher e é negra. Se os republicanos fizerem manobras obstrucionistas contra ela e, no final das contas, a reprovarem, irão “ofender” todas as mulheres e todas as pessoas negras com direito a voto — um prato cheio para os eleitores que não são republicanos convictos.

Na bolsa de apostas do Above The Law, no entanto, a cotação dela é de 50-1. Pesa contra ela o fato de já ter 56 anos. O governo Obama deseja apontar um nome de cerca de 50 anos ou menos, para que viva liberalmente na Suprema Corte por muitos anos.

Até agora só há especulações, porque não há qualquer indicação mais concreta. Mas na bolsa de apostas do Above The Law e de outras publicações há muitos outros nomes, entre ele o do ex-presidente Bill Clinton (7.500-1) e do próprio presidente Obama (5.000-1), que poderia entregar o cargo ao vice e se autonomear.

Existem outros nomes que poderiam abrilhantar a Suprema Corte com seu trabalho, mas há um problema político em seus caminhos. Por exemplo, a advogada Danielle Gray é “uma mulher negra excepcionalmente qualificada”, segundo o blogueiro Goldstein, mas ela foi uma das arquitetas do Obamacare, o programa de seguro-saúde para os pobres, que os republicanos odeiam. Rejeição anunciada no Senado de maioria republicana.

A atual vice-conselheira de Segurança Nacional Avril Haines, uma advogada nacionalmente respeitada, era vice-diretora da CIA, quando a instituição foi acusada de invadir os computadores do Senado. Também uma rejeição certa no Senado.

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Possível ocupante do cargo, Kamala Harris tem ambições políticas.
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A atual procuradora-geral da Califórnia Kamala Harris seria uma candidata palatável até para alguns republicanos. Além disso, ela é a procuradora-geral mais bonita da nação, segundo o presidente Obama. Mas ela já decidiu que vai concorrer ao Senado Federal e tem ambições de se candidatar, um dia, à Presidência da República.

O segundo nome mais bem cotado na bolsa de apostas do Above The Law é o do juiz Paul Watford (8-1), do tribunal de recursos de São Francisco, Califórnia. O blogueiro Goldstein apostou nele, antes de mudar de ideia e cravar o nome de Loretta Lynch como favorita.

Watford é um jurista respeitado, bem conhecido nos círculos jurídicos/democratas e uma esperança do presidente Obama de colocar um afro-americano com tendências liberais na Suprema Corte, que já tem um afro-americano extremamente conservador, o ministro Clarence Thomas.

Nesta quinta-feira (18/2), começou a guerra de anúncios publicitários sobre a sucessão de Scalia, segundo o USA Today. A organização conservadora Judicial Crisis Network anunciou que vai gastar pelo menos US$ 1 milhão em anúncios na TV, rádio e meios digitais para conclamar o Senado a bloquear qualquer nomeação que o presidente Obama fizer para substituir Antonin Scalia na Suprema Corte. A campanha "Let the people decide" (deixe o povo decidir) diz aos eleitores: "Você escolhe o próximo presidente. O próximo presidente escolhe o próximo ministro".

*Texto modificado às 16h13 do dia 18/2/2016 para acréscimo de informações.

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