Segunda Leitura

Razão e emoção envolvem associações
de ex-alunos de faculdades de Direito

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

7 de fevereiro de 2016, 7h00

Spacca
Os cursos de Direito sempre foram, e ainda são, motivo de orgulho para os que o concluem. Apesar da multiplicação das faculdades, ou escolas de Direito, como por vezes são chamadas, receber o diploma ainda é uma conquista significativa.

As características  das faculdades variam. Há as caras e exigentes, cujo ingresso depende até  do domínio do inglês. Existem as das universidades públicas, via de regra bem conceituadas e com vestibular muito disputado. Há faculdades sem grande reconhecimento, mas que oferecem cursos sérios e produtivos. E também aquelas mais fracas, seja porque situam-se em locais muito distantes ou porque a preocupação maior não é exatamente a de formar bons profissionais, mas, sim, obter lucro.

Seja qual for a espécie de faculdade, da capital ou do interior, isolada ou pertencente a uma universidade,  o fato é que os alunos, na sua absoluta maioria, lembram saudosos  os tempos passados na Academia. Nada mais natural, pois naquele período muito se aprendeu, amizades foram feitas, destinos foram traçados. Recordar os professores mais excêntricos, o bedel, as dificuldades com esta ou aquela matéria, tudo passa a fazer parte da história de vida de cada um.

Este sentimento de amor acaba, muitas vezes, sendo traduzido na criação de associações de ex-alunos da Faculdade de Direito. E o fenômeno não é privilégio do Brasil. Nos Estados Unidos encontra-se a mais antiga associação deste tipo, que é a Harvard Law School Association, com 38 mil filiados em todo o mundo.[1] Em Portugal, na tradicional Universidade de Coimbra, criada entre 1288 e 1290, atua a Alumni (Associação dos Antigos Estudantes da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra).[2] No Peru é comum as universidades possuírem suas Asociaciones de Egresados, como se vê em site criado especialmente para tal fim.[3]

No Brasil, algumas faculdades de Direito possuem suas associações de ex-alunos. A Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da USP mantém no seu site a relação de todos os alunos que por lá passaram, desde 1892.[4] A Associação dos ex-alunos da Universidade Nacional de Brasília (UnB) mantém mais de 5 mil profissionais nela formados.[5] Mais rara é a existência de tal tipo de associação no interior dos estados, mas a  Associação dos ex-alunos da Faculdade de Direito de Joinville (SC) está em atividade desde  14 de fevereiro de 2007.[6]

Muito embora seja pequeno o número de tais associações existentes no Brasil, o fato é que uma coisa as une: a existência de um curso consolidado e reconhecido pela sociedade. Nada impede, mas será muito difícil que uma faculdade com baixo nível nas avaliações do MEC ou com pouca aprovação de seus alunos nos exames da OAB, venha a ter uma associação de ex-alunos. O que move a criação de tais associações é, acima de tudo, o orgulho de ter pertencido a instituições idôneas e competentes.

Para a criação destas associações é imprescindível a iniciativa de egressos e o apoio institucional. Sem este, ela não passará de uma instituição promotora de encontros sociais que irão se reduzindo ao longo do tempo. Portanto, é preciso que haja apoio da faculdade ou, se for o caso, da própria universidade.

Mas qual a finalidade e as vantagens da existência de uma associação de tal tipo? Vejamos:

— Para a faculdade de Direito ou, se for o caso, para a universidade, a associação dará mostras de um curso reconhecido, com tradição e  respeitabilidade.

— Para o ex-aluno, será bom sentir-se fazendo parte integrante da Academia, sair do isolacionismo para interagir com seus iguais, reciclar seus conhecimentos gerais e jurídicos. O ser humano precisa ter raízes, referências, sensação de pertencimento, fatores essenciais para a sua felicidade.

— Para os estudantes será uma ótima oportunidade de interagir com os mais experientes,  seja em atividades jurídicas ou até de mero aconselhamento, recebendo a experiência daqueles que trilharam as diversas profissões jurídicas.

— Para todos será um momento de reflexão sobre o sentimento da gratidão. Todos são devedores das Faculdades de Direito, pois o curso feito possibilita abertura a novos horizontes. É bom que isto seja  lembrado.

No entanto, criar tal tipo de associação e manter acesa a chama do entusiasmo, certamente não é tarefa simples. Vejamos as etapas a serem percorridas.

O primeiro passo é reunir um pequeno grupo de entusiastas da ideia, nada mais do que dez pessoas. Firmado o compromisso, procurar a instituição de ensino e expor a ideia, pedindo apoio. Dificilmente ele será negado, já que interessa à Academia ter uma associação desse tipo.

Vencida esta etapa inicial vem a assembleia, com a chamada de todos ex-alunos. Atualmente, as redes sociais facilitam o acesso às pessoas. O local deve ser amplo o suficiente para reunir um considerável número de participantes, principalmente se já houver vinte ou mais turmas formadas.

Nesta assembleia será discutido e aprovado o Estatuto e eleita uma comissão provisória para tratar de levá-lo a registro.  O Estatuto deve deixar claros os direitos e deveres dos associados.[7] Além daqueles usuais, como o direito de votar e ser votado, outros devem ser inseridos. Por exemplo:

— Desde que haja apoio da faculdade, deve constar que os ex-alunos  têm o direito de frequentar as dependências da instituição, como  centro esportivo, biblioteca, ter descontos em cursos de extensão e outras comodidades;

— É  importante deixar claro desde logo, em cláusula estatutária, que os que ocuparem cargos na diretoria se comprometem a não disputar cargo eletivo no prazo de cinco anos após findo o mandato.  A associação não deve ser trampolim político, nem deve ter qualquer tipo de partidarização, porque isso dividiria os filiados;

— O Estatuto deve prever a possibilidade da associação receber doações. É possível que ex-alunos que tiveram sucesso financeiro em suas vidas profissionais, se habilitem a auxiliar a entidade que congrega ex-alunos.

— Os associados podem atuar como voluntários dedicando um número de horas mensal, ainda que seja mínimo, para atender alunos da graduação, auxiliando-os nas suas dúvidas, orientando-os sobre as profissões que exercem. Imagine-se a satisfação de um ou mais alunos que pretendem ser policiais, de poder conversar informalmente com um advogado de sucesso ou com alguém que ocupa ou ocupou cargo de autoridade.

— Os associados podem criar grupos de interesses, revista eletrônica, solicitar assento nos órgãos colegiados

Estas e muitas outras previsões pode conter o Estatuto, variando conforme hábitos e cultura da região em que será criada a associação. Isto feito, ele deverá ser levado ao Cartório de Títulos e Documentos para  registro (Lei dos Registros Públicos, artigo 127, I). Esta é uma fase cansativa, porque há publicação em jornal local, despesas, formalidades.  Em seguida deverá ser aberta conta corrente em estabelecimento bancário, o que demanda também tempo e paciência.

Bem, aí está a ideia. Se bem conduzida, pode ser uma boa via de colaborar com o ensino jurídico do estabelecimento em que cada um se formou, auxiliar os estudantes, estimulá-los e orientá-los, ter um convívio agradável com companheiros de classe,  agir positivamente, enfim. Mãos à obra, a iniciativa dá trabalho, mas, certamente, compensa.


[1] http://hls.harvard.edu/dept/alumni/harvard-law-school-association/
[2] http://www.fd.uc.pt/alumni/
[3] http://egresados.universia.edu.pe/representatividad/asociaciones-graduados/
[4] http://www.arcadas.org.br/antigos_alunos.php?grad=1&pagina=1&ano=&nome=#result_busca
[5] http://unb.br/exaluno/associacao_ex_alunos
[6] http://www.ace.br/documentos/estatuto_exalunos_fdj.pdf
[7] O Estatuto da  Associação dos ex-alunos da Faculdade de Direito de Joinville, SC está exposto na internet e pode servir de modelo: http://www.ace.br/documentos/estatuto_exalunos_fdj.pdf .

Autores

  • Brave

    é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente eleito da "International Association for Courts Administration - IACA", com sede em Louisville (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.

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