Opinião

Plano de Recuperação Judicial do Grupo OAS é homologado

Autores

7 de fevereiro de 2016, 9h00

A inclusão da OAS, uma das maiores construtoras do Brasil, na investigação da "lava jato", operação anticorrupção conduzida pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, restringiu a oferta de crédito à empresa e trouxe incerteza quanto à sua capacidade de conseguir novos contratos com o Governo. Nesse contexto, a nota de crédito da construtora foi rebaixada pela agência de rating Standard & Poors, em janeiro de 2015, o que resultou no vencimento antecipado de suas dívidas. 

Foi nesse cenário que, de forma abrupta, a situação de caixa de curto prazo das empresas do grupo sofreu uma deterioração, circunstância que provocou um inevitável calote em investidores nacionais e estrangeiros. Para evitar a falência, dez sociedades do Grupo OAS, sediadas no Brasil e no exterior, apresentaram, em março de 2015, requerimento único de recuperação judicial, instituto previsto na Lei 11.101/2005. A justificativa para a apresentação do requerimento em conjunto foi de que as sociedades são devedoras solidárias e há obrigações recíprocas entre as sociedades do grupo.  

O processamento da recuperação judicial foi deferido em 01/4/2015 pelo Juízo da 1ª. Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central da Cidade de São Paulo para todas as sociedades requerentes, inclusive para aquelas sediadas no exterior. O juiz observou que, muito embora o Brasil não tenha adotado a Lei Modelo da UNCITRAL para falências transnacionais é possível que empresas constituídas no exterior, mas que tenham as suas atividades concentradas no Brasil e sejam controladas e integrantes de grupo econômico brasileiro, pleiteiem o benefício da recuperação judicial no Brasil. A presença de todas as empresas no polo ativo do procedimento também foi aceita pelo juiz, sob o argumento de que as sociedades requerentes atuam de forma sistêmica e fazem parte do mesmo grupo.

O plano de recuperação judicial e a intenção das sociedades em recuperação de obterem um DIP Financing foram objeto de muitas discussões. O DIP Financing, vale esclarecer, é uma modalidade de financiamento obtida no curso da recuperação judicial e que se classifica na falência como crédito extraconcursal. Todas essas discussões acabaram por forçar a prorrogação da assembleia geral de credores. Em vista disso, o juiz entendeu que seria o caso de estender o stay period para além dos 180 dias previstos na Lei 11.101/2005, mantendo suspensas as execuções propostas contra as sociedades em recuperação. Esta decisão nada mais foi do que o reflexo da aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual o prazo legal do stay period pode ser prorrogado quando o atraso na votação do plano não for atribuído à inércia ou desídia dos devedores.

No final de 2015, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento de agravo de instrumento pela 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, autorizou a celebração do DIP Financing pelas sociedades recuperadas, mediante a constituição de garantia sobre as ações detidas pela OAS na Invepar, concessionária do Aeroporto de Guarulhos. Porém, a autorização judicial, inicialmente, se limita a apenas parte do valor mutuado, equivalente a R$ 200 milhões. O valor global do financiamento é de R$ 800 milhões, e ficou registrado na decisão que novas parcelas desse financiamento poderão ser liberadas pelo juiz da recuperação, mediante prévia justificação. 

Outra grande controvérsia no curso do procedimento em questão veio com a votação do plano de recuperação judicial. Depois de seguidas suspensões, a assembleia geral de credores foi promovida, em segunda convocação, em 17 de dezembro de 2015. As divergências começaram quando o advogado das sociedades em recuperação apresentou o plano à assembleia com as alterações resultantes das negociações travadas com os bondholders. Os demais credores alegaram que os bondholders tiveram acesso prévio ao plano e sugeriram a suspensão da assembleia, para que tivessem tempo hábil de analisar o que estava sendo proposto pelos devedores.

Depois de intensa discussão, os credores aprovaram a suspensão da assembleia por apenas quatro horas e, ao final, aprovaram o plano de recuperação apresentado. Irresignado com o desfecho do certame, um credor quirografário peticionou ao Juízo da recuperação requerendo a anulação das deliberações tomadas na assembleia que aprovou o plano, com fundamento na tese de que o acesso privilegiado dos bondholders ao plano de recuperação e de que a suspensão de apenas quatro horas para a sua análise durante a assembleia configuraram abuso de direito.

Não há na Lei 11.101/2005 uma regra específica a respeito do prazo que teria o devedor para submeter aos credores a versão final do plano de recuperação. De forma geral, a análise acerca da adequação do prazo concedido aos credores para avaliação da versão final do plano é feita na própria assembleia geral de credores, quando da apresentação do plano final. Cabe aos credores, se for o caso, deliberarem se precisam de mais prazo para analisar e votar o plano apresentado.

Na hipótese, o Administrador Judicial colocou em votação três propostas apresentadas pelos credores:

i. suspensão por quatro horas;

ii. suspensão até o dia 21 de janeiro de 2016; e

iii. votação imediata.

Os votos foram computados com base na regra geral, segundo a qual considerar-se-á aprovada a proposta que obtiver votos favoráveis de credores que representem mais da metade do valor dos créditos presentes na assembleia geral (Artigo 42, Lei 11.101). A proposta de suspensão da assembleia pelo prazo de quatro horas foi vitoriosa com os votos válidos e favoráveis de credores representando 67,26%.

É certo que a lei inclui, dentre as competências da assembleia dos credores, deliberar não só sobre a aprovação ou rejeição do plano, mas também sobre a sua revisão (Artigo 35, I, alínea “a”, Lei 11.101). Isso significa dizer que a anulação da deliberação que aprovou o plano de recuperação só poderia ter vez num contexto de prática de abuso de direito.

É reconhecida a soberania da assembleia sobre as matérias que são de sua competência, muito embora esse caráter soberano sofra algumas limitações. O Tribunal de Justiça do estado de São Paulo já decidiu que não é absoluta a soberania da assembleia de credores, de modo que compete ao juiz observar não apenas a sua legalidade, mas também a ética, a boa-fé, o respeito aos credores e a manifesta intenção de cumprir a meta de recuperação. Se ausente algum desses elementos, as deliberações assembleares poderão ser anuladas. 

No caso, o juiz enfatizou que cabe ao Poder Judiciário analisar os contornos legais do plano de recuperação judicial aprovado pelos credores, de forma a evitar que suas cláusulas violem direito de ordem pública. No plano aprovado pela assembleia de credores do Grupo OAS, o juiz deixou claro que não observou a existência de cláusulas ilegais que mereçam o controle judicial.

Assim, o plano de recuperação judicial foi homologado, com a concessão da recuperação judicial às sociedades componentes do chamado Grupo OAS.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!